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ATHAYDE, Amanda; CHACCUR, Cristianne; FERREIRA; Jackson. Medidas preventivas no antitruste
no Brasil: critérios-chave de aplicação, princípios gerais e aspectos de política pública à luz da
experiência recente do Cade. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 9-24, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1019
Dinamarco chama atenção para o chamado “juízo do mal maior” na análise do periculum
in mora, no âmbito do Direito Processual Civil, “indagando, em cada caso, se o autor sofreria mais
se nada fosse feito para conter os males do tempo, ou se sofreria mais o réu em virtude da medida
que o autor postula” (DINAMARCO, 2014, p. 381). Da mesma forma o Cade deve avaliar a posição do
requerente em face do requerido e conceder a medida preventiva sempre que o primeiro sofrer mais
com os “males do tempo” na pendência da decisão definitiva.
2.3. Considerações associadas aos requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora no
direito concorrencial
Outra discussão importante é a questão de se o dano causado por ato sujeito à medida
preventiva seria um dano contra a ordem concorrencial, ou se bastaria o dano contra um ou
mais concorrentes. É verdade que o objetivo do antitruste, como direito público, seja a defesa da
concorrência, e não, diretamente, dos concorrentes. Por outro lado, como indicado pela OCDE, é
possível que o dano a um ou mais concorrentes afetados pela provável conduta anticompetitiva seja
um indicativo de um problema maior no mercado – ou seja, à concorrência – e considerando que o
ônus da prova deste último cenário poderia ser muito gravoso (OECD, 2022, p. 13).Ou seja, para fins
de uma medida preventiva, o dano a um concorrente e não necessariamente à toda a concorrência,
pode ser suficiente.
Esses requisitos são exigidos, em geral, pelas diversas jurisdições, como requisitos
cumulativos, e com um “trade o”: ainda que tanto o fumus boni iuris e o periculum in mora devam
estar concomitantemente presentes, a força de um dos requisitos pode eventualmente compensar a
fraqueza do outro – por exemplo, quanto mais forte o caso seja, prima facie, menos exigente poderá
ser o critério para se demonstrar urgência para evitar o dano, e vice-versa (OECD, 2022, p. 11). Em
outras palavras, se o fumus boni iuris for muito forte e evidente, talvez o periculum in mora seja um
pouco mais fraco, para compensar a dualidade.
A legislação antitruste brasileira (art. 84 da Lei no. 12.529/2011) prevê que o Cade, seja por
meio da Superintendência Geral - SG, seja por seu Tribunal, pode aplicar medida preventiva sempre
que os requisitos de fumus boni iuris e periculum in mora estiverem concomitantemente presentes.
Além disso, há menção expressa ao objetivo de se voltar ao status quo sempre que possível, por meio
da aplicação da medida.
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Em mercados dinâmicos, especialmente os digitais, discute-se em que medida o periculum
in mora poderia ser abordado pelas autoridades antitruste sob uma perspectiva menos rigorosa
para permitir que intervenham mais cedo e bloqueiem condutas potencialmente anticompetitivas
antes que os mercados passem pelo chamado “tipping”, pelo qual as empesas inovadoras podem
acabar dominando o mercado e gerando barreiras à entrada, ou os concorrentes sejam forçados a
deixar o mercado. Ou seja, as autoridades empregariam procedimento e padrões de prova atenuados
para estabelecer a existência de periculum in mora e, assim, evitar o “underenforcement” contra
9 Art. 84. Em qualquer fase do inquérito administrativo para apuração de infrações ou do processo administrativo
para imposição de sanções por infrações à ordem econômica, poderá o Conselheiro-Relator ou o Superintendente-Geral, por
iniciativa própria ou mediante provocação do Procurador-Chefe do Cade, adotar medida preventiva, quando houver indício
ou fundado receio de que o representado, direta ou indiretamente, cause ou possa causar ao mercado lesão irreparável ou
de difícil reparação, ou torne ineficaz o resultado final do processo. § 1º Na medida preventiva, determinar-se-á a imediata
cessação da prática e será ordenada, quando materialmente possível, a reversão à situação anterior, fixando multa diária nos
termos do art. 39 desta Lei. § 2º Da decisão que adotar medida preventiva caberá recurso voluntário ao Plenário do Tribunal,
em 5 (cinco) dias, sem efeito suspensivo (BRASIL, 2011).