187186
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
UMA ANÁLISE DA (IN)
COMPATIBILIDADE ENTRE O
EXERCÍCIO DO LEVERAGE
REGULATÓRIO E A ATUAÇÃO
DO CADE NA DEFESA DA
CONCORRÊNCIA NO BRASIL
1
An analysis of the (in)compatibility between the exercise
of regulatory leverage and CADE’s role in the defense of
competition in Brazil
Carolina Pagotto Trevizo
2
Universidade de São Paulo (USP) – São Paulo/SP, Brasil
RESUMO ESTRUTURADO
Contextualização: Agências reguladoras e autoridades concorrenciais possuem uma posição de
poder com relação aos regulados e agentes econômicos, vez que têm o poder de controlar o acesso
a um mercado especíco, alterar comportamentos, proporcionar concessões, etc. Observa-se, pois,
a exploração desse leverage para atingir outros objetivos/obter vantagens, dentro ou fora da sua
competência de atuação, que talvez fosse inviável ou requeresse recorrer a outras ferramentas mais
caras ou arriscadas, não fosse a utilização dessa inuência.
Objetivo: Analisar em que medida o instituto do leverage regulatório do Cade é compatível com a
sua atuação na promoção da defesa da concorrência no Brasil.
Método: A pesquisa analisou o uso (ou tentativa) do leveraging do Cade mediante aos poderes de
gatekeeper atrelados as suas atribuições, à luz da teoria dos atos administrativos, especicamente
mediante o cumprimento dos requisitos de competência e nalidade do ato administrativo.
Resultados: Identicou-se 3 (três) casos em que o Cade utilizou (ou tentou utilizar) seus poderes
de gatekeeper, inerentes às suas funções preventivas e repressivas, para obtenção de objetivos
adicionais ou mais amplos. Em 1 (um) dos casos, a autarquia atingiu a competência de outra
autoridade ao tentar utilizar o poder de gatekeeper de imposição unilateral de restrições, visando
tão-somente operacionalizar um ato de concentração inviável – mesmo agindo para maximizar um
objetivo inerente à defesa da livre concorrência. nos outros 2 (dois) casos, o leverage regulatório
do Cade parece ter sido utilizado de forma correta, pois a autarquia celebrou os acordos no exercício
Editor responsável: Prof. Dr. Luis Henrique Bertolino Braido, Fundação Getúlio Vargas (FGV/RJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Lattes: http://lattes.cnpq.br/4648392251476133. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6085-1446.
1 Recebido em: 04/01/2023 Aceito em: 15/06/2023 Publicado em: 31/07/2023
2 Pós-graduada em Direito Econômico e Concorrencial pela Fundação Getúlio Vargas – SP (FGV). Obtenção de diploma
de licence em Droit pela Université Jean Moulin Lyon III. Graduada em Direito pela Universidade de São Paulo (USP). Membra do
Comitê de Contencioso e Arbitragem do IBRAC. Advogada em São Paulo/SP. E-mail: caroltrevizo@hotmail.com Lattes: http://
lattes.cnpq.br/1392160673096184. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8133-8342.
10
187186
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
legítimo da sua competência, e impôs obrigação mais ampla que àquele atribuído à celebrão de
TCC pela lei concorrencial de forma coerente com as nalidades do antitruste brasileiro.
Conclusões: Como o leverage regulatório não é regulamentado, seu uso desgovernado pode
transformar o Cade em um executor secundário de um conjunto potencialmente grande de outras
leis. Portanto, por ora, seu exercício deve estar aos objetivos do direito antitruste brasileiro
(mesmo que os objetivo sejam difusos) e ao escopo de atuação da autarquia de acordo com as
suas atribuições, sob pena de incorrer em algum tipo de abuso de poder. Caso haja interesse em
expandir seu uso para além da zona de atuação da autarquia, ou visando atingir objetivos alheios
àqueles consagrados na legislação concorrencial, é fundamental que sua legitimação se de
forma expressa.
Palavras-chave: leverage regulatório; gatekeeper; Cade; Lei nº 12.529/11; vício.
An analysis of the (in)compatibility between the exercise of regulatory leverage and CADE’s role in the
defense of competition in Brazil
STRUCTURED ABSTRACT
Background: Regulatory agencies and competition authorities have a position of power in relation
to the regulated and economic agents, since they have the power to control access to a specic
market, change behaviors, grant concessions, etc. It is observed the exploitation of this leverage
to achieve other objectives/obtain advantages, within or outside its competence of action, which
perhaps would be unfeasible or would require resorting to other more expensive or risky tools, if
it were not for the use of this inuence.
Objective: To analyze to what extent the exercise of regulatory leverage by CADE is compatible with
its role of promoting the antitrust enforcement in Brazil.
Method: The research analyzed the use (or attempt) of CADE’s leveraging through its gatekeeper
powers associated to its attribution, specically through the fulllment of the requirements of
competence and purpose of the administrative act.
Results: Three (3) cases were identied in which CADE used (or tried to use) its gatekeeper powers,
inherent to its preventive and repressive functions, to obtain additional or broader objectives.
In 1 (one) of the cases, the autarchy overstepped the competence of another authority when
trying to use the gatekeeper power by imposing unilateral restrictions, with the sole objective of
operationalizing an unfeasible merger – despite having acted to maximize an objective inherent in
the defense of the free competition. In the other 2 (two) cases, the use of regulatory leverage by
CADE seems to have been used correctly, as the autarchy entered into agreements in the legitimate
exercise of its competence, and imposed a broader obligation than the one attributed to the
execution of a cease-and-desist by the competition law in a manner consistent with the purposes
of the Brazilian antitrust.
Conclusions: As the institute of regulatory leverage is unregulated, its ungoverned use can turn
CADE into a secondary enforcer of a potentially large set of other laws. Therefore, for the time
being, its exercise must stick to the objectives of Brazilian antitrust law (even if the objectives are
diffuse) and the scope of action of the autarchy in accordance with its attributions, under penalty
189188
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
of incurring in some type of abuse of power. If there is an interest in expanding its use beyond
the authority’s area of operation, or in order to achieve objectives that are unrelated to those
enshrined in the antitrust legislation, it is fundamental that its legitimation be given expressly.
Keywords: regulatory leverage; gatekeeper; CADE; Law No. 12.529/11; defect.
Classicação JEL: B15, B25, H70, K21, K23, K33, K42, P50
Sumário: 1. Introdução; 2. Atuação do Cade na Defesa da
Concorrência no Brasil; 2.1. Legislação e jurisprudência
brasileira apontam para uma nalidade plural do direito
concorrencial brasileiro; 2.2. Vedação à atuação abusiva
do Cade; 3. O instituto do leverage regulatório e sua
aplicabilidade no Direito da Concorrência; 3.1. Leveraging
entre áreas distintas de um mesmo domínio; 3.2.
Leveraging entre dois domínios por uma autoridade com
múltiplos propósitos; 3.3. Leveraging entre dois domínios
exercidos por autoridades diferentes; 3.4. Leveraging sob
o pretexto de “interesse público”; 4. A (in)compatibilidade
entre o leverage regulatório e a atuação do Cade na
defesa da concorrência no Brasil; 4.1. Jurisprudência
ainda muito incipiente; 5. Necessidade de delimitar o
exercício do instituto do leverage regulatório no âmbito
do Cade; 6. Considerações nais.
1. INTRODUÇÃO
O instituto do leverage regulatório tem o potencial de se estabelecer como um instrumento
importantíssimo na missão de zelar pela livre concorrência e pelo bem-estar dos mercados.
Muito se fala dos poderes de gatekeeper inerentes a algumas entidades reguladoras. Esses
poderes podem servir para impor encargos diferentes aos regulados, atingir outros objetivos
ou obter vantagens, seja dentro da sua competência de atuação, ou até mesmo em relação a
outro domínio normativo, os quais não seriam possíveis de serem impostos ou obtidos mediante
regulação direta, ou seriam impostos mediante recursos mais onerosos, não fosse o referido
leverage da autoridade.
O Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (“Cade”) não é uma agência
reguladora da concorrência, mas sim uma autoridade de defesa da concorrência. Todavia, o
leverage regulatório se aplica ao Cade, vez que também é uma autarquia que possui poderes
de gatekeeper no desempenho das suas funções preventiva e repressiva às infrações à ordem
econômica.
Todavia, o leveraging da agência concorrencial brasileira deve ser pensado com cautela,
justamente devido à maneira que esse instrumento está delineado hoje em dia, sem regulamentação
alguma.
O presente artigo busca, portanto, analisar a compatibilidade ou não do instituto do
leverage regulatório com a atuação do Cade na promoção da defesa da concorrência no Brasil.
189188
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
2. ATUAÇÃO DO CADE NA DEFESA DA CONCORRÊNCIA NO BRASIL
2.1 Legislação e jurisprudência brasileira apontam para uma nalidade
plural do direito concorrencial brasileiro
Agências de defesa da concorrência ao redor do mundo atuam como instrumento de
enforcement das nalidades atribuídas ao direito antitruste de cada país, i.e., implementando a
sua “agenda antitruste.
O tema, todavia, é tudo menos simples, na medida em que a nalidade do direito antitruste
não é um consenso na literatura especializada sobre teoria econômica, podendo o direito antitruste
se prestar a inúmeras nalidades.
A lei estadunidense de defesa da concorrência é um exemplo prático disso. Veja-se que
o Sherman Act (1890) foi editado em uma época em que a economia americana sofria grandes
transformações, e o cenário econômico, por consequência, era pautado pela competitividade
agressiva, altos custos e concentração, o que estimulou a prática de atos questionáveis entre os
players e abusos ao consumidor. A lei, portanto, foi editada justamente em resposta à formação
dos monopólios e os efeitos negativos dessa modalidade de mercado sobre o consumidor (SOUZA,
2006, p. 60).
Ao longo do tempo, contudo, a Suprema Corte norte-americana declarou, em vários
precedentes, que o início da defesa da concorrência nos EUA era “multidimensional”, indo além
da (i) prevenção da concentração de mercado e proteção da liberdade das empresas de vender
bens. Se prestaria também a (ii) proteger o público das falhas de mercado, (iii) proibir práticas que
impeçam o acesso de empresas ao mercado, (iv) assegurar igualdade de oportunidades e proteger
o público de monopólio e cartéis, etc. (JASPER, 2019, p. 173).
Após esse período inicial de objetivos mais pulverizados, o debate sobre os objetivos do
antitruste nos EUA passou a ser mais acalorado e, de certa forma, polarizado. De um lado, alguns
economistas e juristas, em grande parte, mas não exclusivamente ligados à Universidade Chicago,
defendiam que o direito antitruste deveria pautar-se no bem-estar econômico, entendendo que as
normas dirigidas a disciplinar a tutela da concorrência são instrumentos destinados a melhorar a
eciência dos mercados.
3
De outro lado, outros vinculam o fundamento do direito antitruste com
a Constituição e, portanto, não aceitam sua defesa somente com base na promoção do bem-estar
econômico (CORDEIRO; SIGNORELLI, 2020).
4
Mais recentemente, observou-se um movimento novo, chamado “hipster antitrust”, pautado
na ideia de que o qual o moderno antitruste, baseado no critério do bem-estar do consumidor,
foi um fracasso em proteger o mercado contra comportamentos anticompetitivos (JASPER, 2019, p.
177). Os seus apoiadores defendem uma política concorrencial mais severa e intervencionista.
No que diz o direito comunitário europeu, é possível depreender do Tratado de
Funcionamento da União Europeia (TFUE) e de outros que integral o ordenamento jurídico europeu,
que a nalidade do seu direito concorrencial também é difusa. Em que pese os principais termos
3 É o caso de Bork (1993), que argumentou que o único propósito da legislação antitruste era maximizar o bem-estar
do consumidor (lembrando do equívoco terminológico feito por Bork que, por bem-estar do consumidor, quis dizer bem-estar
total, o que é mesmo que dizer eciência econômica).
4 É o caso dos estudiosos H. Blake e W. Jones (1965, p. 381, tradução nossa), que descreveram o antitruste como “parte
integrante da constituição econômica dos Estados Unidos”.
191190
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
utilizados para descrever o objetivo do direito antitruste serem (i) o “bem-estar do consumidor”
(signicando, contudo, excedente do consumidor”) e (ii) a “alocação eciente de recursos”, similar
à “eciência econômica” do direito americano, a Europa também arrola como alvos secundários do
seu direito antitruste (iii) a “concorrência no mercadoe (iv) a “integração do mercado(JASPER,
2019, p. 177).
Analisando o ordenamento jurídico brasileiro como um todo, observa-se que o padrão da
multidimensionalidade do direito antitruste no ordem jurídico-econômica nacional não destoa
das jurisdições americana e europeia. Conforme apontam Castro (2018) e Souza (2006, p. 13), os
objetivos do direito antitruste vêm inscritos na ordem econômica nacional.
A defesa da concorrência brasileira é tutelada, no ordenamento jurídico, por mais de uma
norma, sendo a de mais relevância, por óbvio, a Constituição Federal. A CF/88 inaugurou uma nova
ordem econômica, orientada pelos princípios constitucionais de soberania nacional, propriedade
privada, função social da propriedade, livre concorrência, defesa do consumidor, defesa do meio
ambiente, redução das desigualdades regionais e sociais, busca do pleno emprego e tratamento
favorecido para as empresas de pequeno porte (art. 170, da CF/88). Igualmente, a Carta Magna
impôs o combate ao abuso do poder econômico pelo legislador infraconstitucional (art. 173, §4ª,
CF/88). O diploma infraconstitucional que mais extensivamente aborda a temática concorrencial é
a Lei de Defesa da Concorrência (LDF) – Lei Federal nº 12.529/2011 (versão atualizada da Lei Federal
nº 8.844/1994). Esta norma estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência – SBDC e
dispõe sobre o escopo de atuação do Cade (BRASIL, 2011).
Na procura de algum norte sobre a(s) nalidade(s) do direito antitruste brasileiro na LDC,
depara-se, desde logo, com o art. 1 no capítulo denominado “Da Finalidade”, que arrola quatro
daqueles princípios constitucionais como orientadores do direito concorrencial brasileiro, (i) livre
iniciativa, (ii) livre concorrência, (iii) função social da propriedade e (iv) defesa dos consumidores,
bem como replica a determinação de (v) repressão ao abuso de poder econômico.
5
Ademais, analisando os §§5º e 6º do art. 88 do mesmo diploma, extrai-se como outros
objetivos da concorrência no Brasil (vi) o bem-estar do consumidor (entendido como excedente
do consumidor) e (vii) a eciência econômica.
6
Isso porque o Cade é autorizado a aprovar Atos
de Concentração (“AC”), que deveriam ser proibidos por violar a livre concorrência, se presentes
duas condições cumulativas: (1) alguma das eciências das alíneas ‘a’ a ‘c’ do inciso I do §6º e, (2)
necessariamente, excedente do consumidor.
É por isso que Jasper (2019, p. 181) conclui que a legislação parece indicar “objetivos
difusos” do antitruste nacional, i.e., liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da
propriedade, defesa dos consumidores/bem-estar do consumidor, repressão ao abuso do poder
econômico e eciência.
Interessante que, a partir de uma apuração dos precedentes do Cade, realizada em 2019,
o autor vai adiante e arma que a jurisprudência do Cade não foi capaz de articular, de forma
5 Note-se que, alguns estudiosos fazem críticas à redação desse artigo, vez que, mesmo que esses princípios sejam
compreendidos como os objetivos a serem atingidos por meio da implementação da lei (e não apenas como fundamentos),
trata-se de conjunto bastante diversos, composto de conceitos uídos e até, por vezes, conitantes (JASPER, 2019, p. 180).
6 Art. 88, § 6º Os atos a que se refere o § 5º deste artigo poderão ser autorizados, desde que sejam observados os limites
estritamente necessários para atingir os seguintes objetivos: I - cumulada ou alternativamente: a) aumentar a produtividade ou
a competitividade; b) melhorar a qualidade de bens ou serviços; ou c) propiciar a eciência e o desenvolvimento tecnológico
ou econômico (BRASIL, 2011, grifo nosso).
191190
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
expressa, um objetivo ou conjunto de nalidades para a defesa da concorrência no Brasil. Dos 13
precedentes localizados que apresentaram aderência ao tema, observou-se uma lista de objetivos
difusa: 6 menções ao bem-estar do consumidor, 3 menções para a proteção da concorrência, 3
menções para a proteção dos mercados, 2 menções para eciência, 2 menções para o bem-estar
econômico, e 2 menções para efeitos sociais (JASPER, 2019, p. 188).
Diante desse cenário, concorda-se com o autor que uma maior clareza sobre a(s)
nalidade(s) do antitruste brasileiro seria um passo na direção de maior segurança jurídica e
estabilidade (JASPER, 2022, p. 112). Todavia, esse artigo não tem o objetivo de perseguir qual é ou
quais são os objetivos do direito concorrencial brasileiro. O que se procura, na verdade, é denir
minimamente a que se destina a lei antitruste, a m de analisar se o uso do leverage regulatório
pelo Cade é, ou à que medida seria, compatível com a sua atuação. Para esse m, portanto, adotar-
se-á o entendimento articulado pelo autor, sobre a nalidade da lei antitruste brasileira se prestar
àqueles objetivos difusos acima apontados.
7
Enm, cabe mencionar que a nalidade do direito antitruste no Brasil não se confunde
com o objetivo do Cade e o seu escopo de atuação. Parte-se do pressuposto que a autarquia
concorrencial brasileira atua de forma a concretizar os objetivos estabelecidos na lei, ou seja,
garantindo um mercado em que a concorrência não está restringida por agentes econômicos com
poder de mercado, com mercadorias e pros acessíveis ao consumidor, reprimindo condutas
abusivas (e.g., aumento arbitrário de lucros), etc.
Para tanto, o Cade tem as suas atribuições, meios pelos quais busca alcançar os propósitos
pré-estabelecidos pela LDC. Atribuiu-se ao Cade três funções: (i) preventiva, por meio da análise
e aprovação ex ante de atos de concentração que possam colocar em risco a livre concorrência;
(ii) repressiva, pelo investigação e sanção de ilícitos concorrenciais com efeitos nocivos à livre
concorrência; e (iii) educativa, mediante a disseminação da cultura da livre concorrência (BRASIL,
2021).
A partir da análise das nalidades da lei de defesa da concorrência no Brasil, do objetivo
da atuação do Cade e do seu escopo de atuação, passa-se a analisar quando que a atuação da
autarquia concorrencial brasileira pode ser considerada abusiva.
2.2. Vedação à atuação abusiva pelo Cade
Quando o Cade desempenha as suas funções no âmbito da sua competência e dos objetivos
da lei antitruste, ele nada mais está do que praticando atos administrativos. Isso é verdade, pois,
de acordo com a doutrina, “o ato administrativo é uma manifestação de vontade funcional apta
a gerar efeitos jurídicos, produzida no exercício de função administrativa(JUSTEN FILHO, 2023,
p. 479). Portanto, a atividade do Cade também deve respeitar os elementos constitutivos do ato
administrativo. Para ns desse artigo, analisar-se-á apenas os elementos sujeito e nalidade,
porquanto são os mais relevantes para ns do leverage regulatório.
7 Especicamente quanto à livre concorrência, adotar-se-á o entendimento exarado pelo Cade, de que se trata da
capacidade de agentes econômicos competirem entre si com certa igualdade e, para tanto, a concorrência não pode ser
restringida ou subvertida por agências econômicos com poder de mercado. O Cade vai além e diz qual o resultado esperado
em um mercado em que há concorrência entre os produtores de um bem ou serviço: (i) menores preços para os consumidores
e (ii) o estímulo à criatividade e à inovação das empresas, que buscam formas ecientes para aumentar os seus lucros (BRASIL,
2016a).
193192
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
O sujeito do ato administrativo deve ser capaz e ter competência para a prática do ato
administrativo, isto é, deve agir mediante atribuição normativa da legitimação para a prática
de um determinado ato. A regularidade quanto à competência do agente, portanto, é requisito
essencial para a existência e a validade do ato administrativo (JUSTEN FILHO, 2023, p. 535).
Nesse sentido, o Cade pode atuar mediante as liberdades impostas à autarquia pela
LDC (i.e., suas atividades preventiva, repressiva e educativa), por intermédio dos instrumentos
dispostos pela letra de lei. Caso pratique atos especícos que vão além da sua competência,
extrapola-se sua função. Congura-se, portanto, um vício de competência, modalidade de abuso
de poder.
Da mesma forma, o ato administrativo deve cumprir com o requisito da sua nalidade,
que é a própria consequência por ele visada. Haja ou não a explicitação da nalidade do ato
administrativo, deve haver sempre controle quanto a ela. Quando uma entidade pública se vale de
competência de que é titular para realizar função diversa daquela a que se destina tal competência,
incorre em desvio de poder/nalidade (JUSTEN FILHO, 2023, p. 550).
Conforme explicado no subcapítulo supra, o Cade opera visando uma multiplicidade de
objetivos, quais seja, liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade,
defesa dos consumidores/bem-estar do consumidor, repressão ao abuso do poder econômico e
eciência.
Tendo em vista esse grande leque de nalidades atrelados à lei antitruste, ca difícil
pensar na possibilidade de o Cade atuar visando qualquer outro objetivo especíco. Nesse
sentido, Carvalho (2021, p. 868) aponta que “não se vai encontrar, até o momento, uma decisão
do Cade em que não tenha sido feito um esforço interpretativo, pelo menos quando não era óbvio
o enquadramento, para demonstrar que o arcabouço interpretativo mobilizado não estourada a
bolha da PDC [Política de Defesa da Concorrência]”.
Todavia, no caso de isso acontecer, a autarquia poderá incorrer no vício de abuso de direito
por desvio de poder/nalidade.
Como o abuso de poder não é compatível com as regras da legalidade, uma vez constatado
o abuso, é necessário repará-lo, mediante revisão administrativa ou penal (CARVALHO FILHO, 2015).
3. O INSTITUTO DO LEVERAGE REGULATÓRIO E SUA APLICABILIDADE
NO DIREITO DA CONCORRÊNCIA
De acordo com o dicionário Houaiss (2002, p. 452), leverage diz respeito a “ão, efeito
ou força de uma alavanca; sistema de alavancas; inuência, poder. Similarmente, o Black’s Law
Dictionary (GARNER, 2014) dene o termo como uma vantagem posicional que pode ajudar alguém
a obter o que quer de outrem”.
8
Com efeito, o termo leverage se refere ao ato de uma parte explorar
uma posição de poder que detém para obter uma vantagem sobre uma contraparte.
9
A exploração de vantagem decorrente de posição de poder, por óbvio, é observada em
diversos tipos de áreas, inclusive no ramo do Direito. Nesse ramo, por sua vez, o leverage pode ser
8 Tradução livre de “[p]ositional advantage that may well help a person get what he or she wants from others [...]..
9 Tradução livre de “Leveraging” refers to one party exploiting a position of power to gain an advantage over a
counterparty” (KOVACIC; HYMAN, 2016, p. 1165).
193192
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
exercido tanto pelo setor privado, quando pelo público.
No âmbito do direito concorrencial, o leverage em sua forma privada recebe o nome de
Private Sector Leveraging” e ocorre quando um monopolista usa o poder que possui em um mercado
para monopolizar outro mercado, através da indução ou encerramento de vendas neste mercado
(FELDMAN, 1999, p. 2081). É frequentemente discutido em casos de venda casada (“tying”), em que uma
empresa passa a vender o Produto A apenas com a condição de que o comprador adquira também o
Produto B, ou concorde em não adquirir o Produto C de outro fornecedor (KOVACIC; HYMAN, 2016, p.
1165).
Um outro exemplo, bastante em voga atualmente, é o leverage dos proprietários de
plataformas digitais para se alavancarem em vários mercados online. É o caso da Google que opera o
Online Search, um mecanismo de pesquisa geral na internet utilizado por uma proporção signicativa
das pesquisas dos usuários online do mundo inteiro. Ocorre que ao executar esse mecanismo, a
Google também opera em várias linhas de negócios complementares, como serviços de mapeamento
(Google Maps), serviços de comparão de compras (Google Shopping), lista de empregos online e
serviços de comparação de voos (Google Flights). Seus rivais nesses negócios auxiliares se queixam
que a Google aproveita da popularidade do Online Search para obter vantagens competitivas para
os seus outros serviços, como, por exemplo, a concessão de exibição em destaque a seus serviços
adjacentes em suas páginas de resultados de pesquisa, o que torna os links para os sites rivais
menos visíveis para os usuários.
10
O segundo tipo de leverage é exercido pelo poder público (“Public Sector Leveraging” ou
Regulatory Leveraging, ou leverage regulatório), através dos seus poderes de “gatekeeper
11
, e pode
tomar diversas formas.
Os poderes de gatekeeper que tornam o leverage no setor público possível, a priori, são
dois: (1) entidade pública que possui autoridade de aprovação ex ante sobre algo que a entidade
regulada dependa (e.g., uma licença para operar em determinado mercado ou lançar determinado
produto); e (2) empresas que são obrigadas legalmente a noticar o regulador antes de uma medida
contemplada (e.g., uma fusão) (KOVACIC; HYMAN, 2016, p. 1166).
Ademais, a literatura especializada não menciona, porém, é possível entender como um
outro poder de gatekeeper a (3) faculdade da entidade reguladora de celebrar acordos premiados,
com empresa investigada por condutas ilícitas, tendo como consequência a suspensão do processo
e seu eventual arquivamento, uma vez que as obrigações forem cumpridas.
No que concerne às formas que o leveraging no setor público pode tomar, Kovacic e Hyman
(2016) entendem que se trata de 4 (quatro).
3.1. Leveraging entre áreas distintas de um mesmo domínio
Em primeiro lugar, a autoridade pública pode usar sua posição de poder/inuência em
10 Veja-se que o uso do leverage por proprietários de plataformas digitais para a obtenção de vantagens competitivas
é vista de formas diferentes entre a Comissão Europeia e o Department of Justice (DoJ). Em 2017, a CE considerou que este
comportamento violava o art. 102, do TFUE (v. Council Regulation 1/2003, 2017 (AT.39740)). Em contrapartida, o FTC encerrou
uma investigação semelhante em 2013, entendendo que os designs de produtos da Google foram adotados para melhorar a
qualidade dos resultados de pesquisa e que qualquer impacto negativo sobre os concorrenciais foi incidental ao propósito de
fornecer aos usuários um conteúdo mais rico mais rapidamente (v. FTC File Number 111-0163 (Jan. 3, 2013)) (TODD, 2019).
11 Equivalente ao termo “guardiões” em português.
195194
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
áreas distintas dentro de um único domínio normativo/político (e.g., o antitruste), para alterar
comportamento dos agentes econômicos ou obter concessões.
Como exemplo prático, os autores mencionam o acordo rmado entre o Federal Trade
Commission – FTC (“FTC”)
12
e a Robert Bosch GmbH (“Bosch”), que concordou em abandonar um
antigo pedido cautelar contra a SPX Service Solutions U.S. LLC, para que a empresa licenciasse suas
patentes observando o modelo FRAND,
13
a m de obter, em contrapartida, aprovação mais rápida da
sua fusão com a SPX Service Solutions U.S. LLC (“SPX”) (KOVACIC; HYMAN, 2016, p. 1169). O b s e r v e -
se que FTC tinha competência para revisar, separadamente, tanto a alegação da suposta conduta
anticompetitiva da SPX, sob a Seção 5 do FTC Act, quanto para analisar a fusão submetida para
aprovação, sob a Seção 7 do Clayton Act. Todavia, tudo leva a crer que essas duas questões distintas
– a antiga, sobre licenciamento, e a mais recente, a fusão – foram resolvidas simultaneamente, como
um pacote, vez que foram divulgadas no mesmo press release (FTC ORDER..., 2012).
Nesse sentido, é crível que o FTC utilizou da sua inuência sob a fusão pretendida pela
Bosch, que tinha grande interesse em uma aprovação mais rápida, para resolver também a questão
da conduta anticoncorrencial SPX pela recusa de licenciamento de suas patentes sob termos FRAND.
A questão que permanece é: a alegação da Bosch contra da SPX teria sido apurada e resolvida
nos mesmos termos e dentro do mesmo prazo se o FTC tivesse lidado com essa questão de forma
independente, i.e., se a Bosch não tivesse uma fusão pendente perante o FTC?
3.2. Leveraging entre dois domínios por uma autoridade com múltiplos
propósitos
Ademais, uma autoridade multifuncional pode exercer seu leverage em domínios normativos/
políticos distintos dentro de seu portfólio de funções.
É o caso do FTC, que ponderou se poderia utilizar os processos de análise das fusões Google-
SoubleClick ou Google-AdMob para incluir uma avaliação da proteção de dados e das políticas de
privacidade da Google (KOVACIC; HYMAN, 2016, p. 1170).
14
Igual ao caso anterior, o FTC também tinha autoridade legal para ambas as atividades,
ou seja, analisar as propostas de fusão da DoubleClick e da AdmMob pelo Google, pelo Bureau of
Competition, e investigar a proteção de dados e as políticas de privacidade da Google, pelo Bureau
of Consumer Protection.
O assunto era controverso, principalmente dentro do FTC: enquanto alguns funcionários
entendiam que os processos de análise das fusões consistiam na oportunidade perfeita para
extrair concessões apropriadas do Google para garantir que os interesses dos consumidores fossem
protegidos, outros funcionários levantaram diversas preocupações com o uso desse leverage, tal qual
o fato de que o real propósito da revisão de fusões e aquisições é identicar e remediar transações
que prejudiquem a concorrência, e não servir como um meio de atingir outros objetivos da agência.
12 O FTC é a autoridade encarregada de regulamentar a livre concorrência nos Estados Unidos.
13 FRAND: fair, reasonable and non-discriminatory licensing.
14 Apesar do FTC ser responsável pela análise de atos de concentração, pelo Bureau of Competition, e proteção de
dados e privacidade, pelo Bureau of Consumer Protection, entendeu que não tinha autoridade legal para bloquear as fusões
ou condicionar a aprovação por motivos não concorrenciais.
195194
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
Diante desse cenário, o FTC acabou pendendo para o segundo grupo de funcionários e concluiu
que a análise das fusões requeridas não poderia ser usada como pretexto para investigar a proteção
de dados e as políticas de privacidade da Google, i.e., as fusões não deveriam ser condicionadas a
aprovação por motivos não concorrenciais.
15
3.3 Leveraging entre dois domínios exercidos por autoridades diferentes
Uma terceira forma que o leverage regulatório poderia tomar consiste em uma agência usar o
poder de gatekeeper de outra agência para obter alguma concessão de um agente econômico sujeito
à supervisão de ambas as agências.
Esse tipo de inuência foi usado pelo Consumer Financial Protection Bureau (“CFPB”), uma
agência localizada dentro do Federal Reserve,
16
que aproveitou que a Ally Financial estava buscando
aprovação regulatória do próprio Federal Reserve para se converter de uma holding bancária para
uma holding nanceira, para forçar um acordo em que a Ally concordou em pagar US$ 100 milhões e
oferecer taxas abaixo do mercado para minoritários (KOVACIC; HYMAN, 2016, p. 1172).
Embora o CFPB não tivesse autoridade regulatória sobre instituições nanceiras, decidiu
investigar se as carteiras de empréstimos de nanciadores indiretos, como a Ally Financial, indicavam
que as instituições nanceiras estavam oferecendo condições menos favoráveis aos tomadores de
empréstimos minoritários. Diante desse cenário, o ex-CEO do banco arma que o CFPB ameaçou
atrapalhar os esforços do banco para obter as principais aprovações regulatórias de que precisava se
não concordasse em resolver as acusações fora do tribunal (SPERRY, 2016).
O CFPB, portanto, utilizou da necessidade da Ally Financial de obtenção de aprovação
regulatória do Federal Reserve como um incentivo para resolver a disputa que tinha com o banco.
Não fosse a necessidade da licença da Ally, parece muito improvável que o CFPB teria conseguido, ao
mesmo tempo, extrair US$ 100 milhões e uma mudança comportamental do banco.
3.4. Leveraging sob o pretexto de “interesse público”
E, por m, uma autoridade pode usar de seu encargo de promotor do “interesse público”
para alcançar compromissos que não são autorizados por comandos legais mais especícos.
Sob esse contexto, por exemplo, o Federal Communications Commission – FCC
17
já utilizou,
por diversas vezes, processos de revisão de fusões para fazer com que agentes econômicos cumpram
com requisitos que não conseguiria impor por meio de regulamentação direta. O FCC utilizou
essa estratégia para forçar a Charter Communications a incluir padrões de neutralidade da rede,
18
imposição que não conseguiu sucesso por meio de regulamentação direta (KOVACIC; HYMAN, 2016, p.
1176).
15The Commissioners further wrote that “as the sole purpose of federal antitrust review of mergers and acquisitions
is to identify and remedy transactions that harm competition,” the FTC lacks the legal authority to block the transaction on
grounds, or require conditions to this transaction, that do not relate to antitrust.” (FEDERAL TRADE COMMISSION…, 2007).
16 Responsável por controlar a política monetária norte-americana.
17 O FCC é a autoridade responsável por regular as comunicações interestaduais e internacionais por meio de cabo,
rádio, televisão, satélite e o.
18 Mediante acordo com o DoJ e FCC, a Charter concordou em (i) abandonar por um tempo várias práticas comuns da
indústria que o governo temia que pudessem ameaçar o crescimento de provedores de vídeo online rivais, como a Netix; (ii)
não impor limites de dados ou cobrar dos clientes de internet de banda larga com base no uso de dados; (iii) expandir seu
acesso de banda larga a dois milhões de residência (RAMACHANDRAN; MCKINNON, 2016).
197196
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
Diante do exposto, a presença dessa inuência no âmbito do Direito Antitruste permite que
a autoridade concorrencial assegure resultados que talvez não conseguiria de outra forma, dentro
de um menor período de tempo, ou que alcance esses resultados sem que precise recorrer a outras
ferramentas mais caras ou arriscadas.
4. A (IN)COMPATIBILIDADE ENTRE O LEVERAGE REGULATÓRIO E A
ATUAÇÃO DO CADE NA DEFESA DA CONCORRÊNCIA NO BRASIL
Igualmente à diversas agências reguladoras, o Cade também detém poderes de gatekeeper
por meio das funções que exerce no escopo da sua atuação de garantir as nalidades da lei antitruste
nacional (v. capítulo 2.1).
Especicamente, possui a competência de aprovar ex ante atos de concentrão que cumprem
com os requisitos da lei, às vezes mediante celebrão de Acordo em Controle de Concentrações
ACC
19
(o que aumenta ainda mais seu leverage), e a faculdade de celebrar acordos com empresas
investigadas por práticas de ilícito concorrencial, tendo como consequência o arquivamento do
processo.
Por óbvio, consegue-se pensar na possibilidade desses poderes serem utilizados pela
autarquia para inltrar obrigações concorrenciais mais amplas, ou de impor obrigações adicionais
aos agentes econômicos, visando objetivos inerentes ou alheios àqueles consagrados na legislação
concorrencial, nos contextos de obtenção de aprovação ou de uma aprovação mais rápida de um AC,
ou ainda, de arquivamento de alguma investigação para imposição de sanção administrativa.
4.1 Jurisprudência ainda muito incipiente
Conforme ver-se-á abaixo, até o momento, foram poucas as vezes em que o Cade já utilizou,
ou tentou utilizar, do seu leverage de autarquia concorrencial brasileira por meio de seus poderes
de gatekeeper, através das suas funções preventivas e repressivas, para atingir outros objetivos
além daqueles dispostos na lei antitruste nacional ou obter vantagens.
Cabe, adiante, analisar se o exercício dessa inuência foi executado de forma adequada.
4.1.1. ACC negociado na compra da Estácio pela Kroton Educacional
Em 31/08/2016, a noticação de operão de aquisição do controle da Estácio Participações
S.A. (“Estácio”) pela Kroton Educacional S.A. (“Kroton”), por meio de uma incorporação de ões,
foi submetida para a análise e aprovação do Cade. A possibilidade de fusão das duas maiores
empresas de ensino privado, formando uma enorme empresa no setor de educação, com alta
concentração do mercado, suscitou preocupações concorrenciais,
20
de maneira que foi reprovada
pela maioria do Plenário do Tribunal do Cade, na 107ª Sessão Ordinária de Julgamento (“SOJ”).
Note-se, contudo, que as empresas tentaram até o último minuto negociar um ACC com
19 De acordo com o Guia H do Cade, Acordo em Controle de Concentrações – ACC é um instrumento utilizado em atos
de concentração sempre que, mesmo resultando na eliminação da concorrência, restar demonstrado que a imposição de
restrições restabelecerá o bem-estar dos consumidores e a eciência econômica (BRASIL, 2016b).
20
Segundo dados apresentados pelo Cade, a operação resultaria em sobreposições na oferta de cursos superiores
de graduação e pós-graduação, na ordem de grandeza de 17% do mercado de educação presencial, e 46% do mercado de
educação superior à distância (BRASIL, 2017).
197196
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
o gabinete da relatora que permitisse a aprovação da operação. O ACC, previsto no art. 125 do
Regimento Interno do Cade (“RICADE”),
21
é um instrumento utilizado para a imposição de remédios
que constituem condição necessária para a operação do ato de concentrão, os quais podem
ser negociados pelas próprias partes interessadas ou designados unilateralmente pelo próprio
Tribunal (BRASIL, 2018a).
A proposta de ACC originalmente contemplava remédios estruturais, como desinvestimento
de ativos e alienação de marca. Em que pese a relatora estar de acordo com a proposta apresentada,
os demais do Conselho entenderam como sendo insuciente. Isso porque os remédios propostos
não endereçavam em magnitude e nem em qualidade o nível de competição suprimido nos
mercados relevantes (BRASIL, 2017).
22
Os outros conselheiros também refutaram o ACC sob o
argumento de que não há eciências que justiquem essa operação (BRASIL, 2017).
23
A partir daí as discussões com o gabinete foram interrompidas e a parte relativa à
implementação do ACC foi suspensa.
Quando do julgamento do AC, a Relatora Conselheira do caso, Cristiane Alkmin, rejeitou o
ACC tal como foi apresentado e argumentou em seu voto pela aprovação da fusão das empresas, com
a imposição de (além daqueles remédios estruturais negociados com as requerentes) restrições
unilaterais, em sua maioria comportamentais, dentre eles, a criação de metas de resultado para a
qualidade do ensino da Kroton por 5 anos.
24
Segundo a relatora, os remédios por ela propostos eram não só robustos, na medida em
que endereçavam os problemas concorrenciais originados pela fusão entre a Kroton e a Estácio,
como também eram ecazes, vez que seriam capazes de diminuir as barreiras à entrada e repassar
as eciências para a sociedade (BRASIL, 2017).
25
Esse entendimento, contudo, não foi albergado
pelos demais conselheiros, que rejeitaram a sugestão da relatora por maioria.
O intuito desse artigo não é analisar se os remédios propostos de fato conseguiriam
solucionar de forma suciente os problemas concorrenciais apresentados pela fusão. O que se
pretende demonstrar aqui é que houve, quando da sugestão da proposta dos referidos remédios
unilaterais pela Conselheira, especicamente aquele supramencionado, a pretensão de utilização
do poder de gatekeeper do Cade da análise ex ante de ACs, para atingir um objetivo que, caso
não fosse a submissão à análise pelo Cade do AC da fusão Kroton/Estácio e a faculdade do
Cade de impor remédios de forma unilateral, dicilmente a autarquia concorrencial teria outra
oportunidade de se envolver na qualidade de ensino das empresas.
Em outras palavras, a conselheira visava utilizar o leverage do Cade, de imposição de
restrições unilaterais, como uma ocasião (e oportunidade) para viabilizar um AC que, mesmo
21 Art. 125. O Cade poderá receber propostas de Acordo em Controle de Concentrações - ACC desde o momento da
noticação até 30 (trinta) dias após a distribuição do Ato de Concentração ao Conselheiro-Relator (BRASIL, 2020a).
22 Voto-vogal do Conselheiro Alexandre Cordeiro Macedo, par. 32.
23 Voto-vogal do Conselheiro João Paulo de Resende, par. 124.
24 Os outros remédios são: (i) medidas necessárias para garantir que alunos atuais concluam seus estudos com
a marca Anhanguera; (ii) proibição de expansão da Kroton no EAD nos mercados relevantes; (iii) proibição de comprar
concorrentes por 5 anos; (iv) publicidade vedada por um ano; (v) vedação de venda para empresa sem experiência no
setor de educação; (vi) obrigação de venda de mantença, e não da mantida; (vii) contratação de um trustee; (viii) manter
os níveis de investimentos nos ativos; (ix) consumação da operação apenas após os desinvestimentos. Voto da relatora
Conselheira Cristiane Alkmin Junqueira Schmidt, par. 19, par. 541 (BRASIL, 2017).
25 Ibidem, par. 542.
199198
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
apresentando inúmeros riscos concorrenciais e cujas eventuais eciências pareciam não compensar
todos os problemas, incrementaria a qualidade do ensino do grupo educacional.
26
A sua motivação
advinha do fato de que a Kroton e a Estácio não estavam bem posicionadas nos indicadores de
qualidade ICG e IDD, quando comparadas com outras instituições de ensino superior (BRASIL,
2017).
27
O uso dessa inuência do Cade ca ainda mais evidente quando a Conselheira declara que,
não fosse a submissão (e eventual aprovação) desse AC via imposição de remédios unilaterais, “de
outra forma não haveria” a adoção de metas de qualidade pelo grupo educacional. A Conselheira,
inclusive, confessa que a sua intenção ao propor tais restrições não era de salvar a operão”,
mas a “certeza de que as restrições seriam muito benécas para os brasileiros, em especial para os
alunos” (BRASIL, 2017).
28
Ao seu ver, o Cade “perdeu uma excelente oportunidade para [...] melhorar
a vida dos alunos (que teriam a qualidade do ensino garantida, além de outros benefícios) e a
dos alunos do ensino fundamental e médio pobres do Estado do Rio de Janeiro” (BRASIL, 2017).
29
Ou seja, a conselheira não queria endereçar, por meio dos remédios unilaterais, os problemas
identicados decorrentes do AC, mas sim intervir na qualidade de ensino da Kroton.
Dito tudo isso, mesmo que a fusão não tenha sido aprovada pelo Cade, trata-se sim da
genesis do exercício de leverage regulatório pela agência da concorrência brasileira.
O que se propõe adiante é analisar se a pretensão da utilização do leverage regulatório
do Cade no caso em tela ocorreu de forma correta, ou seja, respeitando a teoria dos atos
administrativos, especicamente os requisitos de competência e nalidade. Para tanto, deve-
se responder às seguintes perguntas: (1) O Cade tinha competência legal para instituir metas de
qualidade às requerentes, mediante imposição unilateral de remédios, mesmo às custas de um AC
eivado de vários riscos concorrenciais e, portanto, inviável?; (2) O Cade, quando da pretensão de
impor tais metas de qualidade, atuou visando algum do(s) objetivo(s) estipulado(s) na legislação
concorrencial?
Veja-se que é possível questionar se o remédio comportamental referente ao compromisso
de atendimento de metas de qualidade do curso ou da instituição – mesmo que muito bem-vindo
e, com certeza, atrelado à nalidade da LDC de maximizar o bem-estar do consumidor (aluno) e da
sociedade de forma geral – está associado ao campo de competência do Cade.
Fica nítido para o leitor a opinião da ex-Conselheira Cristiane Alkmin sobre o assunto:
o órgão antitruste não pode abrir mão de impor metas nos resultados de qualidade destas
instituições, se houver a aprovação, pois a operão não pode derivar em perda de qualidade para
o aluno (medida por IGC, CI e CC).” (BRASIL, 2017).
30
Apesar disso, a instituição isolada (i.e., não inerente à perseguição de eciências no
âmbito de um AC pelo Cade) de metas de qualidade no mercado de educação no Brasil parece ser,
na verdade, de competência exclusiva do MEC, extrapolando as competências conferidas ao Cade.
26 “[...] trazer melhorias tangíveis para os alunos, para os professores e para as instalações das suas instituições das
suas IES.Voto da relatora Conselheira Cristiane Alkmin Junqueira Schmidt, par. 513 (BRASIL, 2017).
27 Ibidem, par. 169.
28 Ibidem, par. 509.
29 Ibidem, par. 515.
30 Ibidem, p. 173.
199198
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
Ou seja, não caberia ao Cade, no processo de análise de um AC cuja aprovação é desaconselhável,
impor às requerentes melhorias no seu sistema de educação. É, na verdade, competência do MEC,
mediante suas atribuições, estabelecer essas diretrizes.
Essa preocupação foi, inclusive, trazida pelo Presidente Alexandre Barreto de Souza, em
seu voto-vogal, que ao listar suas razões pelas quais os remédios propostos não seriam aceitáveis,
aponta que os remédios comportamentais, tal qual a imposição de metas de qualidade de ensino,
podem adentrar na esfera da regulação estabelecida pelo Ministério da Educação, cuja efetividade
dependeria de uma cooperão interinstitucional (BRASIL, 2017).
31
Conforme dispõe o site do Ministério da Educação MEC, o órgão faz parte da Administração
Pública federal direta e tem como área de competência a educação em geral, compreendendo
todos os seus níveis, e a política nacional de educação (BRASIL, 2020b). De acordo com a Lei nº
13.005/14, que aprovou o Plano Nacional de Educação PNE, uma das diretrizes estabelecidas
é justamente a qualidade da melhoria da educação (inciso IV, art. 2) (BRASIL, 2014). No mesmo
diapasão, em conformidade com o Decreto nº 10.195/19, que criou a Estrutura Regimental do MEC,
são quatro os níveis hierárquicos, que atuam de forma articulada, na denição de políticas e ões
para a ampliação e melhoria da qualidade da educação brasileira.
Para piorar, a própria relatora do caso diz que a meta de qualidade pretendida por ela é
uma meta que nem o MEC impõe (BRASIL, 2017).
32
E, mesmo que o Cade tivesse competência para estipular metas de qualidade de ensino,
foi entendimento majoritário do Conselho que o AC não estaria apto a aprovação, pois a somatória
dos remédios apresentados pelas empresas e dos impostos unilateralmente pela relatora não
eram satisfatórios para solucionar as preocupações identicadas, tampouco havia eciências
especícas e vericáveis que poderiam ser repassadas ao consumidor.
Sendo assim, é entendimento da autora desse artigo que, o exercício do leverage do Cade
no caso analisado incorreu em um vício do ato administrativo de abuso de poder. Como exposto
no item 2.2 deste trabalho, o abuso de poder é gênero das espécies excesso de poder (vício de
competência) e desvio de nalidade (vício de nalidade). O excesso de poder diz respeito à atuação
do agente público sem competência para tanto, seja por sua total ausência, seja por extrapolar os
limites da competência que lhe foi legalmente atribuída. Ao passo que o desvio de nalidade trata
da autoridade que age dentre dos limites da sua competência, mas o ato não atende ao interesse
público, ferindo os objetivos pretendidos pela norma legal (SOUZA, 2005, p. 212).
O Cade, representado pela relatora Conselheira, invadiu a competência do MEC quando,
deixando complemente de lado o objetivo do ACC de viabilizar a aprovação do AC, agiu tão-somente
no intuito de fomentar a qualidade da educação no país ao estipular metas de qualidade às
requerentes do caso concreto – mesmo que a medida fosse aumentar o bem-estar do consumidor
e, pois, estava atrelada aos objetivos que se entendem perseguidos pela legislação concorrencial
nacional.
Sendo assim, apesar da relatora Conselheira ter agido corretamente ao utilizar o poder de
gatekeeper do Cade para impor remédios via imposição unilateral de restrições a m de atingir
uma das nalidades da lei antitruste brasileira maximização do bem-estar do consumidor ,
31 Voto do Presidente Alexandre Barreto de Souza, par. 13.
32 Voto da relatora Conselheira-relatora Cristiane Alkmin Junqueira Schmidt, par. 512.
201200
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
extrapolou os limites da sua competência, e esbarrou na competência do MEC e, pois, incorreu em
uma das formas de abuso de poder (excesso de poder).
4.1.2. CelebraçãodeTCCsentreCADEePetrobrasparavendaderenariade
petróleo e de ativos no mercado de gás natural
O uso do leveraging do Cade é ainda mais evidente no contexto dos inquéritos instaurados
em 2019, para apurar eventual abuso de posição dominante e discriminação de concorrentes por
parte da Petrobras nos mercados nacionais de reno de petróleo e de gás natural.
No primeiro caso, uma investigação foi instaurada a m de avaliar se a política de preços
para gasolina e óleo diesel adotada pela companhia, para alinhar os preços domésticos com as
movimentações no mercado internacional e atrair empresas parceiras a partir de 2016 (“Nova
Política de Preços”), de alguma forma feria a LDC. No segundo caso, a investigação foi necessária
para apurar descontos unilaterais sobre o pro do gás que estariam gerando supostas vantagens
competitivas a sua subsidiária Gás Brasiliano Distribuidora S.A, em detrimento da Comgás (BRASIL,
2019b).
No âmbito desses processos, a Petrobras propôs a celebração de Termos de Compromisso
de Cessação de Prática – TCC para encerrar essas investigação, mediante o comprometimento da
própria companhia de privatizar cerca de 50% de seu parque de reno, na forma da venda integral
de 8 unidades produtivas (execução de desinvestimento voluntário) (BRASIL, 2019a), com sua
concordância com a regra que vedou a compra desses ativos em conjunto por um mesmo comprador
ou por empresas do mesmo grupo econômico,
33
bem como vender diversas transportadoras de
s, bem como alienar sua participação acionária indireta em companhias distribuidoras.
34
O Plenário do Tribunal do Cade homologou ambos os acordos na 144ª SOJ (11/06/2019),
apesar dos votos pela não homologação do Requerimento de TCC referente à investigação no
mercado de reno de petróleo, proferidos pelos Conselheiros João Paulo de Resende e Paula Farani
de Azevedo Silveira.
Na celebração desses acordos, o Cade, ao contrário do caso anteriormente citado em que
houve uma tentativa, logrou êxito em fazer uso do seu leverage regulatório.
Como visto anteriormente, a LDC atribuiu à autoridade concorrencial brasileira uma
posição de gatekeeper. Dentre outros, estipulou no seu art. 85, a faculdade do Cade de, mediante
um critério de oportunidade e conveniência, caso entender que o compromisso atende aos
interesses protegidos na lei, celebrar TCC para cessar (i) prática sob investigação ou (ii) dos seus
efeitos lesivos.
35
Nesse sentido, rearma-se a força repressiva do Cade, fazendo cessar condutas
anticoncorrenciais, e, há o recolhimento de expressivos volumes monetários a partir desse tipo de
acordo, à título de reparação de danos. Ao mesmo tempo, para o infrator, suspende-se a tramitação
do procedimento instaurado contra ele, que poderia trazer a ele condenação nal muito maior que
33 TCC “Petrobras/reno de petróleo”, Cláusula 4.2.
34 TCC “Petrobras/s natural”, Cláusula 2.1.
35 Art. 85. Nos procedimentos administrativos mencionados nos incisos I, II e III do art. 48 desta Lei, o Cade poderá
tomar do representado compromisso de cessação da prática sob investigação ou dos seus efeitos lesivos, sempre que, em
juízo de conveniência e oportunidade, devidamente fundamentado, entender que atende aos interesses protegidos por lei
(BRASIL, 2011, grifo nosso).
201200
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
a contribuição pecuniária do TCC, sem contar o prejuízo a sua imagem.
Nos referidos casos, o que se viu na prática, portanto, foi a utilização pelo Cade dessa
sua aptidão de poder arquivar as investigações contra a Petrobras, empresa investigada por
suposta prática de infração à ordem econômica, mediante celebração de TCCs. Todavia, os acordos
não foram rmados com o objetivo delineado no art. 85 da LDC, ou seja, de cessar a prática sob
investigação ou dos seus efeitos lesivos. Na verdade, o intuito por traz da celebração do acordo
pelo órgão foi de viabilizar um objetivo concorrencial mais amplo, qual seja, uma agenda de
abertura concorrencial nos setores de reno de petróleo e de gás natural e impedir a ocorrência
futura dos mesmos fatos investigados.
36
-
37
O Cade viu, pois, uma oportunidade de endereçar, de forma célere, as principais questões
apontadas como problemáticas em várias investigações conduzidas pela autarquia, principalmente
em relação à baixa disputa e baixa atratividade nos mercados de reno e gás natural (decorrente do
monopólio desenvolvido naturalmente pela Petrobras), para melhorar as condições concorrenciais
na cadeia como um todo.
Veja-se que, esta medida tem respaldo técnico nos autos do Cade. A Nota Técnica
37/2018/DEE, elaborada pelo Departamento de Estudos Econômicos do Cade ao Grupo Técnico
CADE/ANP de trabalho para debater os setores de combustíveis, analisou a estrutura do mercado
de reno com foco nos desinvestimentos propostos e conclui que tamanha concentração de
mercado pela Petrobras facilita a manipulação de pros e, por consequência, são bem-vindas
as iniciativas de desinvestimentos da Petrobras, com a inclusão de sugestões pontuais (BRASIL,
2018b).
No que tange, todavia, à adequação ou inadequação do exercício do leverage pelo
Cade nesses casos, a discussão é mais complexa do que no caso anterior. Para abrir o debate,
imprescindível mencionar que a celebração desses TCCs entre o Cade e a Petrobras repercutiram
muito no mundo jurídico. O primeiro TCC, inclusive, foi alvo de ação popular (processo nº 1045614-
30.2020.4.01.3400), que tramita na 16ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal, cujo
objetivo é a declaração de nulidade do acordo, na medida em que diversos dos seus pontos teriam
exorbitado as competências e atribuições das partes (DISTRITO FEDERAL, 2022).
A começar pelas críticas dos próprios membros do Conselho, o Conselheiro João Paulo de
Resende questionou: (i) que o TCC foi o resultado de uma decisão do governo e da Petrobras de
privatizar cerca de 50% da sua capacidade de renamento, e não devido a uma acordo rmado
entre os mesmos resultante de uma investigação; (ii) que o processo investigativo ainda se
encontrava em estágio bastante inicial, tendo avançado pouco sobre se houve de fato uma conduta
e se essa seria considerada uma infração concorrencial; (iii) se poderia o Cade abrir um processo
investigativo contra empresa monopolista e, sem denir o mercado relevante, demandar a adoção
de uma série de desinvestimento para introduzir a concorrência no setor; e (iv) que o Cade não
examinou a questão de fundo sobre a prática de preço predatório, signicando que as partes que
se sentiram lesadas pela conduta não teriam respostas sobre a existência das mesmas e de seus
36[...] propiciar condições concorrenciais, incentivando a entrada de novos agentes econômicos no mercado de
reno [...].” (TCC “Petrobras/reno de petróleo”, Cláusula 1. Do objeto e da Abrangência).
37 [...] preservar e proteger as condições concorrenciais no mercado brasileiro de gás [...], visando à abertura do
mercado brasileiro de gás natural, incentivando a entrada de novos agentes econômicos no mercado de gás natural [...].
(TCC “Petrobras/gás natural, Cláusula 1. Do objeto e da Abrangência)
203202
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
efeitos. a Conselheira Paula Azevedo frisou que o TCC foi celebrado sem que fosse imputada
uma conduta ilícita por parte da Petrobras,
38
incidindo em dois vícios: (i) de competência e (ii) o de
nalidade.
No que concerne o vício de competência, argumenta-se que, de acordo com os contornos
da defesa da concorrência no Brasil dispostos pelos art. 1 e 36, da LDC, em consonância com os
art. 170 e 173, §4º, da CF/88, o Cade só poderia intervir quando houver indícios claros de abuso de
poder econômico. Nesse sentido, a legislação concorrencial brasileira não permitiria o exercício
do papel repressivo da autarquia sem um ato manifestado pela Petrobras que poderia vir a ser
tipicado como uma infração à ordem econômica. Portanto, ausente a conduta lesiva, a celebração
do TCC teria incorrido em um vício de competência.
com relação ao vício de nalidade, argumenta-se que os TCCs não tiveram como objetivo
a cessação de qualquer prática ou de seus efeitos lesivos, até porque não havia prática imputada,
mas apenas “poder econômico” ou “estrutura de mercado” sob investigação (BRASIL, 2019a).
Portanto, os acordos, que tiveram como objetivo “apenaspropiciar condições concorrenciais no
mercado de reno e de s natural, incentivando a entrada de novos agentes econômicos, teriam
distorcido a nalidade do art. 85 da LDC, incorrendo em vício de nalidade.
A decisão de homologação também foi alvo de impugnações de instituições do setor. É
o caso, por exemplo, da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis ABICOM que
embargou a decisão que deferiu o TCC referente ao setor de reno. Dentre as suas insatisfações,
estão: (i) a omissão do TCC de ter se referido à ampliação da concorrência apenas ao mercado de
reno, todavia sem mencionar nenhuma medida que efetivamente ampliasse a concorrência no
mercado de comercialização de combustíveis; (ii) a incerteza de qual medida seria pró-competição
no mercado que efetivamente se logrou êxito, pois devido à distribuição geográca das renarias
existentes, os desinvestimentos não solucionam plenamente a questão do monopólio do reno, já
que nos modais em que o atendimento é dutoviário, os desinvestimentos caracterizam-se apenas
pela troca de agente econômico; (iii) a não instituição de ações de efeito imediato que possam
garantir a concorrência do mercado de comercialização; e (iv) qual seria a forma de cumprimento
e de avaliação do cumprimento quanto à “transparência de preços da Petrobras”, para garantir a
sua efetiva scalização e avaliação quanto as práticas anticompetitivas.
39
E não se pode deixar de mencionar as críticas à homologação dos TCCs desferidas
pela doutrina. Além das considerões trazidas acima, a sua natureza atípica suscitou
preocupações do ponto de vista jurídico e reputacional da política nacional de concorrência: (i) a
“desconstitucionalização” do direito da concorrência:
40
o CADE teria ignorado os limites legais de
sua atuação, na medida em que instaurou investigação e celebrou TCC sem indícios de conduta
abusiva atribuída à Petrobras. O problema decorrente disso um maior afastamento do CADE da
Constituição, suscitando um maior o risco envolvimento judicial e revisão das decisões do CADE
(CABRAL, 2020, p. 722).
38O Inquérito Administrativo não imputou uma conduta ilícita por parte da PETROBRAS e que esta Companhia, com
a assinatura deste Termo de Compromisso, não está reconhecendo a prática de qualquer ato ilícito” (TCC “Petrobras/reno de
petróleo”); “Os procedimentos Administrativos não imputaram uma conduta especíca por parte da PETROBRAS e que esta
Companhia, com a assinatura deste TCC, não está reconhecendo a prática de qualquer ato ilícito.” (TCC “Petrobras/s natural”).
39 TCC “Petrobras/reno de petróleo”, Embargos de Declaração da ABICOM (Sei 0630475).
40 De acordo com Luis Fernando Schuartz, um dos precursores do assunto, a desconstitucionalização do direito da
defesa da concorrência decorre da existência de um direito e uma política concorrencial mais inuenciada por teorias
econômicas mainstream do que pela própria Constituição, estatutos jurídicos ou precedentes (CABRAL, 2020, p. 722).
203202
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
Um (ii) segundo ponto relevante é o da “instrumentalização” do CADE pelas agendas
econômicas dos governos. Em que pese tratar-se de entidade técnica e independente, foi
utilizada para dar “legitimidade técnica” à decisão política e ideológica do Governo Federal à
época de privatização das empresas estatais. Com isso, corre-se o risco de a agenda da autoridade
concorrencial brasileira ser instrumentalizada sempre por agenda ideológica especíca, atinente
ao governo vigente à época (CABRAL, 2020, p. 723). Essa preocupação é verdadeira, principalmente
levando em consideração que, o atual governo, anunciou sua intenção de rever os referidos acordos,
deixando claro sua estratégia para empresas envolve paralisar as vendas de ativos (ARBEX; SAMOR,
2023).
Em terceiro lugar, na mesma linha que uma das críticas do Conselheiro João Paulo de
Resende, (iii) esse caso revela-se um poderoso precedente que abre possibilidades de atuação
excessiva do Cade, gerando insegurança jurídica aos agentes econômicos que, embora não
necessariamente pratiquem conduta anticompetitiva, detenham posição dominante e, portanto,
sejam obrigadas a negociar desinvestimentos desproporcionais (CABRAL, 2020, p. 724).
Em que pese as críticas desferidas aos acordos, o Presidente do Cade à época, Alexandre
Barreto de Souza, justica a manutenção da sua celebração. De início ele argumenta que, (i) a
instauração das investigações se justicaria por uma situação atípica: se vislumbrou evidências
sucientes para a instauração de investigação administrativa, cuja decisão foi apoitada por estudo
do Departamento de Estudos Econômicos (“DEE”), que esclarece que as diversas infrações
sendo investigadas pelo CADE (recusa de venda, price squeeze, uso de cláusulas abusivas) podem
decorrer de uma conjuntura problemática nos setores, e que as investigações pontuais poderiam
deixar o órgão míope para a solução efetiva do problema. O CADE tem o poder-dever de instaurar
procedimentos para apurar indícios de infração. A certeza de uma infração ocorre apenas no nal
do processo, mas a possibilidade de celebrar TCC é disponibilizada em qualquer fase processual.
41
Ademais, o (ii) Cade não poderia negar um acordo que resolveria o problema concorrencial,
sob a justicativa de que precisa gerar jurisprudência ou fazer estudo de caso. A decisão célere com
solução com efeitos signicativos e muito positivos é mais adequada do se buscar uma decisão
perfeita, mas que demore. Não o suciente, para o Cade é irrelevante quais os outros motivos
que a Petrobras tinha para fazer o acordo. Bastaria ser eciente para endereçar os problemas
concorrenciais encontrados.
42
E, por m, (iii) o conselheiro entende que o acordo é sim era suciente para resolver os
supostos problemas concorrenciais no mercado de comercialização de combustíveis, na medida
em que o remédio adotado, no mercado de reno, reduz consideravelmente o poder de mercado
da Petrobras no mercado de comercialização de combustível, e isso foi suciente para o Tribunal.
43
Não bastasse, a Procuradoria Federal Especializada junto ao Cade (“PFE/Cade”) explica,
nos autos da Ação Popular nº 1045614-30.2020.4.01.3400, que não se pode perder de vista que o TCC
se assemelha a um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), pois não prescinde da presença de
uma violação às normas jurídicas para ensejar a celebração dos acordos. Na verdade, a celebrão
desses instrumentos se justica a partir de um juízo de discricionariedade da autarquia, desde
41 TCC “Petrobras/reno de petróleo”, Despacho Presidência nº 132/2019, p. 37/38.
42 Ibidem, par. 41
43 Ibidem, par. 52.
205204
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
que haja receio ou potencialidade de lesão a um bem jurídico relevante.
Nos casos ora analisados, a decisão de celebrar TCC teria partido de uma conjuntura
preocupante de monopólios detidos pela Petrobras em ambos os mercados de reno de petróleo
e de transporte e distribuição de gás natural, os quais ensejam situações mais propícias à prática
de infrações contra a ordem econômica.
Aliás, o juiz da referida ação popular aderiu às razões da PFE/Cade e julgou improcedente
a demanda, na medida em que entendeu que ao Judiciário não cabe controlar a discricionariedade
técnica de políticas públicas, e não haveria elementos que pudessem conduzir a nulidade dos atos
administrativos praticados pelo Cade (DISTRITO FEDERAL, 2022).
Diante de todo o exposto, a autora tomou a liberdade de esquematizar no quadro abaixo
os argumentos articulados a favor e contra a celebração do TCC entre o Cade e a Petrobras nos
setores de reno de petróleo e s natural:
Quadro 1: Argumentos contra e a favor da celebrão dos TCCs no âmbito do PA nº
08700.002600/2014-30, IA nº 08700.007130/2015-82 e IA nº 08700.006955/2018-22
Argumentos Contra a celebração dos TCC Argumentos a favor da celebração do TCC
• Os IAs estariam em estágio inicial, tendo
avançado pouco sobre se houve de fato uma
conduta e se essa seria considerada ilícita.
• A instauração das investigações se justica
por uma situação atípica: o Cade já investigava
diversas supostas infrões pela Petrobras
nos mercados envolvidos, o que suscitou a
possibilidade de o problema ser da própria
conjuntura dos mercados.
• O Cade tem o poder-dever de apurar indícios de
infração.
• A certeza de uma infração ocorre apenas no
nal do processo, podendo ser oferecida à parte
investigada a possibilidade de celebrar TCC a
qualquer momento.
• O TCC foi resultado de uma decigoverno e
da Petrobras de privatizar capacidade de
renamento.
• Haveria a “instrumentalização” do Cade pelas
agendas econômicas dos governos.
• É irrelevante para o CADE os outros motivos que
a Petrobras tinha para celebrar TCC.
• Bastou ao Tribunal que o remédio adotado no
mercado de reno induziria uma redução do
poder de mercado da Petrobras no mercado de
comercialização de combustíveis.
• Os TCCs ampliaram a concorrência apenas no
mercado de reno, e não mencionaram medida
efetiva no mercado de comercialização de
combustíveis.
• Repercussões para outras empresas que, apesar
de serem poder econômico, não abusam da sua
posição nos mercados que atuam.
• O Cade não poderia negar acordo sob a
justicativa de que precisa gerar jurisprudência
ou fazer estudo de caso.
• Vício de competência: de acordo com o §4º do
art. 173, da CF/88, o Cade só poderia intervir
quando houver indícios claros de abuso de
poder econômico, não permitindo o exercício do
papel repressivo da autoridade sem um ato que
poderia vir a ser considerado infração à ordem
econômica.
• Uma consequência disso é a
“desconstitucionalização” do direito da
concorrência.
• O TCC se assemelha a um TAC, pois não
prescinde de uma violação às normas jurídicas
para ensejar a celebração do acordo.
• Basta o receio ou potencialidade de lesão a um
bem jurídico relevante.
• Ao Judiciário, não caberia controlar a
discricionariedade técnica de políticas públicas.
Tampouco haveria elementos que pudessem
conduzir a nulidade dos atos administrativos do
Cade.
205204
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
• Vício de nalidade: violação do art. 85 da LDC,
vez que os TCCs não tiveram como objetivo a
cessação de qualquer prática ou de seus efeitos
lesivos. O objetivo foi propiciar condições
concorrenciais nos mercados analisados,
incentivando a entrada de novos players.
• Partiu-se da preocupação de uma conjuntura
preocupante de monopólios detidos pelas
Petrobras em ambos os mercados, os quais
ensejavam situações propícias à prática de
infrações.
A partir da metodologia utilizada no presente artigo, especicamente para ns de vericação
da adequação da utilização do leverage regulatório pelo Cade quando da celebração desses TCCs,
deve-se analisar o cumprimento aos requisitos de competência e nalidade do ato administrativo,
mediante a ponderação das seguintes perguntas: (1) O Cade tinha competência legal para celebrar
os referidos acordos com a Petrobras visando a imposição de uma obrigação concorrencial mais
ampla, no âmbito de sua atribuição repressiva, mesmo sem a imputação de uma conduta ilícita
exata por parte da Petrobras? (2) O Cade, quando da celebrão desses acordos, atuou visando
algum(ns) do(s) objetivo(s) estipulado(s) na legislação concorrencial?
Todas as outras questões, i.e., a repercussão desses casos como precedentes para outras
empresas monopolísticas, se os acordos rmados atingiram o resultado a que se prestaram, as
motivações da Petrobras para celebrar os acordos etc., não são relevantes para o objetivo do
trabalho.
Ora, observando o quadro acima exposto, é possível fazer um esforço argumentativo no
sentido de que a utilização do leverage nos casos em tela ocorreu tanto de forma correta, quanto
de forma abusiva. Todavia, a autora desse artigo pende para o lado da adequação do exercício da
inuência da autarquia, pelos motivos expostos a seguir.
Em atenção à primeira pergunta, a resposta é armativa, por 5 (cinco) motivos. Em (i)
primeiro lugar, apesar de não ter sido estipulada uma conduta lesiva exata à Petrobras, o Conselho
explica que havia evidência sucientes que insinuavam que, na estrutura dos mercados analisados,
a companhia estava praticando atos que poderia congurar infração contra a ordem econômica.
A conduta atípica de celebrar o TCC não tendo uma conduta ilícita em mente se justica em razão
de uma situação fática atípica, em razão da preocupação do CADE em fazer uma análise mais
abrangente do que o de costume. Nesse sentido, a teoria econômica concorrencial prevê sim a
análise de forma agregada da operação.
44
Forçosamente, poder-se-ia argumentar também que, (ii) em razão da tipicidade das
infrações na LDC ser extremamente aberta, haveria um risco de delimitar aprioristicamente quais
fatos poderiam ensejar ou não a realização do abuso de posição dominante pela Petrobras no caso
em tela.
45
Ademais, como a própria PFE/Cade pontua, (iii) o Cade tinha a faculdade de celebrar o TCC
na medida em que tinha receio de conduta anticoncorrencial da Petrobras nos setores analisados.
Esse receio estava consubstanciado nas várias investigações em curso no Cade de práticas isoladas
adotadas pela Petrobras, em estudo do DEE, que sugeria que as infrações poderiam decorrer de
um todo que é maior do que a soma das partes,
46
e na premissa doutrinária de que a situação de
haver um monopolista num dado segmento será sempre preocupante para a concorrência, vez
44 TCC “Petrobras/reno de petróleo, Despacho Presidência nº 132/2019, par. 40.
45 Argumento trazido pela PFE na ação popular nº 1045614-30.2020.4.01.3400, par. 22.
46 Ibidem, par. 38.
207206
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
que a presença de poder econômico enseja oportunidades mais propícias à prática de infrões à
ordem econômica.
Além disso, (iv) o Cade também tem discricionariedade técnica para escolher a melhor
forma de endereçar o problema concorrencial analisado. Com efeito, o órgão entendeu que seria
mais vantajoso cessar a(s) prática(s) imediatamente, ao invés de prosseguir com as investigações
que, potencialmente, desembocariam em uma condenação administrativa, que não seria tão
vantajosa para a concorrência do que a agenda de desinvestimentos de ativos da Petrobras.
Nesse tema, o próprio Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu que o Poder Judiciário deve
deferência às decisões técnicas adotadas por entidades reguladoras, o Cade incluso, devido à
expertise técnica e capacidade institucional em questões de regulação econômica da autarquia
(BRASIL, 2019c). Em forma de pergunta, qual seria o melhor órgão brasileiro, se não o CADE, para
estipular a mais adequada resposta concorrencial aos problemas inerentes aos setores de reno
e gás natural?
No que tange à competência do Cade, observa-se, por m, que (v) não parece haver
um conito entre as competências do Cade e da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e
Biocombustível ANP quando da celebrão dos TCCs para o desinvestimento de ativos nos
mercados de reno e de s natural.
De forma suscinta, a ANP, instituída pela Lei do Petróleo (Lei 9.478/97), é o órgão
público responsável pela (i) regulação das indústrias e do comércio do setor, por meio de normas
infralegais; (ii) contratação, mediante a outorga de autorizações para as atividades dos setores
regulados e promoção de licitações; e (iii) scalização da indústria petrolífera nacional, fazendo
cumprir as normas nas atividades dos setores regulados. Especicamente nos setores de reno
e processamento, a ANP atua autorizando empresas a construir, operar e ampliar renarias e
instalações de processamento e de armazenamento de gás natural e de produtos líquidos;
nos setores de transporte, movimentação e comercialização, tem a incumbência de regular essas
atividades (BRASIL, 2023b).
No que concerne a tutela da concorrência no setor por ela regulado, a ANP também possui
importante parcela de competência, não afastando, todavia, as competências do CADE e dos demais
órgãos do SBDC. Isso porque a Lei de Petróleo não derrogou a LDC, mas preservou as competências
preventiva e repressiva do Cade, e estabeleceu um papel subsidiário à ANP frente ao Cade.
Nos termos dos artigos 8 e 10 da Lei de Petróleo, estabelece-se a interação entre a ANP e
o CADE de duas formas: (i) preventiva: a participação da ANP passou a ser feita, após a instituição
do sistema de análise ex ante de Acs, de forma mais objetiva, por meio de respostas a quesitos
especícos formulados pelo Cade; e (ii) repressiva: quando a ANP identicar fatos que possam
congurar infrações contra a ordem econômica, deve comunicá-los ao Cade para a adoção das
medidas cabíveis no âmbito da LDC (BRASIL, 2023a).
A conclusão a que se chega é que a ANP possui um papel muito mais secundário, de
fornecimento de dados, realização de estudos, regulamentação e scalização de atividades. Além
disso, não parece haver impedimentos por parte do Cade de oportunizar eventual reestruturação
nos mercados de reno de petróleo e gás natural, no âmbito de controle de condutas, principalmente
visando a ampliação da livre concorrência e a atração de investimentos.
207206
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
Cabe mencionar, ademais, que esses acordos foram negociados mediante esforços
de cooperão entre a Petrobras, o Cade e ANP. Essa agência reguladora também deve atuar e
tem o interesse em trazer investimentos, aumentar a capacidade de reno no Brasil e reduzir a
dependência de importação pelo mercado nacional.
Diante de todo o exposto, é argumentável que o Cade não excedeu os limites a ele impostos
pela Constituição e pela legislação concorrencial.
No tocante à segunda pergunta, se a autarquia concorrencial brasileira teria atuado nos
limites dos objetivos estipulados pela legislação concorrencial ao celebrar os acordos com a
Petrobras visando um objetivo mais amplo que aquele estipulado no art. 85 da LDC, i.e., a cessação
de prática anticoncorrencial ou de seus efeitos lesivos, a resposta também é armativa.
Da análise dos processos do Cade, foi possível observar que a intenção do Cade ao usar
o seu leverage regulatório era de colocar em prática uma agenda de abertura concorrencial nos
mercados de reno de petróleo e gás natural, por meio do desinvestimento de parte das suas
renarias, transportadoras e distribuidoras de s.
Com a realização dos desinvestimentos, visava-se a introdução de concorrência no setor
nos mercados monopolizados e nos importadores, o que potencialmente levaria (i) à redução
de concentrão de mercado na oferta dos produtos, (ii) à redução dos preços praticados ao
consumidor (maximização do bem-estar do consumidor), em razão da competitividade almejada, e,
consequentemente, (iii) ao estímulo da demanda. Ademais, a privatização seria benéca à própria
Petrobras que, ao sentir uma força competitiva, teria (iv) incentivo para aumentar sua eciência e
melhor alocar os recursos por parte da estatal, em benefício da sociedade.
Com efeito, não se vislumbrou uma atuação viciada por parte do CADE no exercício do
exercício do seu leverage nos casos em tela. Primeiro, porque os TCCs foram celebrados no
exercício legítimo da sua competência, sob um juízo de conveniência e oportunidade. Segundo,
porque a autoridade impôs sua inuência sobre a Petrobras para estimular um ambiente mais
competitivo, acontecimento que provavelmente não atingiria de outra forma. Essa conduta, por
sua vez, é coerente com as missões institucionais do Cade de fomento à concorrência e à livre
iniciativa, bem como de maximização do bem-estar do consumidor.
5. NECESSIDADE DE DELIMITAR O EXERCÍCIO DO INSTITUTO DO
LEVERAGE REGULATÓRIO NO ÂMBITO DO CADE
Os casos do uso do leverage no âmbito do Cade ainda são pouquíssimos, não sendo
possível estabelecer ainda os contornos que o instituto tomará ao longo do tempo.
Certamente, no entanto, a tendência é que o Cade utilize cada vez mais os poderes de
gatekeeper que possui para conseguir obter vantagens/objetivos, justamente pela facilidade que
possui decorrente da competência de aprovar ex ante atos de concentração, às vezes mediante
ACC, ou ainda à luz da possibilidade de celebrar acordos com empresas investigadas por prática
de ilícito concorrencial, tendo como consequência o arquivamento do processo. É dizer, do ponto
de vista político, o leveraging que possuem as autoridades públicas é visto como um ativo.
Fica fácil de visualizar o benefício do uso de leverage regulatório pelos casos
209208
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
supramencionados. No primeiro, o Cade tentar usar do seu poder de analisar ex ante atos de
concentração para ter ingerência no controle de qualidade na educação de empresas com grande
inuência no mercado de ensino superior no país. no segundo e no terceiro, o Cade usa com
sucesso sua autoridade de celebrar acordos com empresas investigadas pelas práticas de ilícitos
concorrenciais para estimular a concorrência em determinado mercado.
De fato, o leveraging pelo Cade pode ser extremamente benéco. Todavia, do ponto de
vista jurisprudencial, ainda não há qualquer controle sobre esse tipo de medida, o que por óbvio
acarreta problemas de segurança jurídica. O uso desgovernado desse instituto tem o potencial
de transformar o Cade em executor de apoio/suporte de um conjunto potencialmente grande
de outras demandas de natureza das mais diversas (ESG, trabalhista, ambientais etc.). Ademais,
surge uma preocupação em torno da força que a utilização do leverage regulatório pelo Cade pode
adquirir como precedente (CARVALHO, 2021, p. 868).
Por esse motivo, faz-se necessário delimitar o uso desse instituto pelo Cade.
47
Em primeiro
lugar, para que a autoridade possa usar amplamente seus poderes de gatekeeper para ir além
das suas competências legais ou atingir outros objetivos além daqueles estipulados na legislação
concorrencial, o primeiro passo é providenciar uma norma robusta que permita tanto, e que
estabeleça em que circunstâncias seu uso faz sentido (e.g., se o leverage pode envolver funções
apenas do seu próprio portfólio, ou podem ir além da sua zona de autoridade, para atuar no
âmbito de outra entidade).
Isso porque, do jeito que esse instrumento se encontra hoje em dia – sem qualquer
regulamentação , a primeira conclusão à qual se chega é que a utilização dessa inuência pelo
Cade no âmbito da concorrência deve estar restrito aos objetivos do direito antitruste brasileiro
(mesmo que os objetivo sejam difusos) e ao escopo de atuação da autarquia de acordo com as suas
atribuições, sob pena de incorrer em algum tipo de abuso de poder (e.g., vício de competência ou
nalidade). Portanto, caso haja a vontade e/ou necessidade de legitimar o leveraging do Cade para
além da nalidade da LDC e do âmbito de atuação da própria autoridade brasileira, primordial a
edição de uma autorização expressa do legislativo.
Ademais, por ser uma ferramenta ainda muito moderna e pouco utilizada, as autoridades
que pretendem utilizá-la, como é o caso do Cade, devem ser bastante explícitas sobre o que
estão fazendo no âmbito do leverage regulatório. Isso não só irá garantir maior transparência aos
processos, como também forçará as autarquias a justicarem o seu uso.
Por m, recomenda-se, ainda, a prática de revisão ex post para analisar a prevalência e
os resultados do leverage regulatório no âmbito do Cade. Somente assim, saberemos com qual
frequência ocorre, as circunstâncias em que ela ocorre e quão ecaz (ou inecaz) ela realmente é
(KOVACIC; HYMAN, 2016, p. 1184).
À título de exemplo, seria extremamente importante e benéco para o CADE continuar
sondando a situação dos mercados de reno de petróleo e de gás natural para se atentar se
os TCCs celebrados com a Petrobras conquistaram o seu objetivo nal propiciar um mercado
pautado na livre concorrência.
48
47 Por óbvio, o enfoque desse trabalho é a atuação do Cade, todavia, a regulamentação do leverage regulatório é
importante no contexto de qualquer entidade pública que possui poderes de gatekeeper.
48 Vislumbrou-se um aumento na competição nos mercados de reno e de s natural após a Petrobras vender 2
renarias – a da Bahia e de Manaus –, reduzindo sua participação de mercado de mais de 85% para 60%, e 1 distribuidora – a
209208
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O exercício do leverage regulatório no âmbito do CADE, possível em decorrência dos seus
poderes de gatekeeper, é compatível com a defesa da concorrência nacional, desde que esteja
alinhado com a competência da autoridade concorrencial e objetivos associados à autarquia,
atribuídas na legislação.
Essa conclusão decorre do quadro normativo atinente a esse instrumento, que, atualmente,
é inexistente. Com efeito, a jurisprudência sobre o leveraging, ainda muito incipiente do âmbito do
Cade, deve ser analisada à luz da teoria dos atos administrativos, segundo a qual, caso a autarquia
da concorrência brasileira extrapole suas competências ou desvie do objetivo estabelecido pela
Lei de Defesa da Concorrência, quando do uso dessa ferramenta, então irá esbarrar em vício de
legalidade, seja por vício de competência seja por vício de nalidade.
Sendo assim, para que seja viável o seu uso para além da zona de atuação do Cade,
ou visando atingir objetivos alheios àqueles consagrados na legislação concorrencial, faz-se
fundamental a legitimação do leverage regulatório via criação de normas concretas, com conceitos,
hipóteses de incidência, transparência e acompanhamento ex post.
REFERÊNCIAS
ARBEX, Pedro; SAMOR, Geraldo. Petrobras negocia com o Cade para preservar monopólio. Brazil
Journal, Rio de Janeiro, 18 abr. 2023. Disponível em: https://bit.ly/3JeliXk. Acesso em: 17 maio 2023.
BLAKE, Harlan M.; JONES, William K. In defense of antitrust. Columbia Law Review, Nova Iorque, v. 65,
n. 3, p. 377-400, 1965.
BORK, Robert H. The antitrust paradox: a policy at war with itself. New York: The Free Press, 1993.
BRASIL. Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. Defesa da Concorrência.
Brasília, 17 fev. 2023a. Disponível em: https://bit.ly/3X4R8LH. Acesso em: 11 maio 2023.
BRASIL. Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. Institucional. Brasília, 13 jan.
2023b. Disponível em: https://bit.ly/3X4R8LH. Acesso em: 11 maio 2023.
BRASIL. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Ato de Concentração nº 08700.006185/2016-
56. Interessados: Kroton Educacional S.A., Estácio Participações S.A. [...]. Relatora: Conselheira
Cristiane Alkmin Junqueira Schmidt, 12/07/2017. não aprovação por maioria. Disponível em: https://
bit.ly/3JcGPQ1. Acesso em: 3 nov. 2023.
BRASIL. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Cartilha do Cade. Brasília: Conselho
Administrativo de Defesa Econômica, 2016a. Disponível em: https://bit.ly/3rg3phq. Acesso em: 21 ago.
2022.
BRASIL. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Guia de Remédios Antitruste. Brasília:
Conselho Administrativo de Defesa Econômica, 2018a. Disponível em: https://bit.ly/3gwRGXi. Acesso
em: 21 ago. 2022.
BRASIL. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Guia para análise de atos de contração
horizontal. Brasília: Conselho Administrativo de Defesa Econômica, 2016b. Disponível em: https://bit.
Gaspetro – e 2 transportadoras – TAG e NTS (ARBEX; SAMOR, 2023).
211210
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
ly/3odyZKo. Acesso em: 21 ago. 2022.
BRASIL. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Nota Técnica nº 37/2018/DEE/CADE, Acordo
de Cooperação CADE-ANP Processo 08700.002021/2013-15. Brasília, 5 dez. 2018b. Disponível em:
https://bit.ly/3Xbu9hZ. Acesso em: 19 ago. 2022.
BRASIL. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Regime Interno do Cade. Brasília: Conselho
Administrativo de Defesa Econômica, 2020a. Disponível em: https://bit.ly/3Cs4WGq. Acesso em: 21
ago. 2022.
BRASIL. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Requerimento de TCC nº 08700.002715/2019-
30. Interessada: Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobrás..A. - Petrobras). Data do julgamento: 10 de julho
de 2019a. Celebrado no âmbito do Inquérito Administrativo nº 08700.006955/2018-22. Disponível em:
https://bit.ly/3CwprCa. Acesso em: 21 ago. 2022.
BRASIL. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Requerimento de TCC nº 08700.003133/2019-7.
Interessada: Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobras. Data do julgamento: 10 de julho de 2019b. Celebrado
no âmbito do Processo Administrativo nº 08700.002600/2014-30 e do Inquérito Administrativo nº
08700.007130/2015-82. Disponível em: https://bit.ly/3Nspcya. Acesso em: 3 set. 2022.
BRASIL. Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011. Estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da
Concorrência; [...] e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 2011. Disponível em:
https://bit.ly/30m27Fi. Acesso em 29 ago. 2022.
BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação - PNE e outras
providências. Brasília: Presidência da República, 2014. Disponível em: https://bit.ly/3NERZjj. Acesso
em: 4 set. 2022.
BRASIL. Ministério da Educação. Competências. Brasília, 28 abr. 2020b. Disponível em: https://bit.
ly/42zwdl2. Acesso em: 22 ago. 2022.
BRASIL. Serviços de Informações do Brasil. Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Brasília, 12 jul. 2021. Disponível em: https://bit.ly/45Y0Svn. Acesso em: 12 set. 2022.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 1.083.955/DF. Relator: Ministro Luiz
Fux, 28 de maio de 2019c. Disponível em: https://bit.ly/3JeSbTL. Acesso em: 22 set. 2022.
CABRAL, Mário André Machado. Abuse of dominant position and cease-and-desist agreements:
risks to Brazilian competition policy arising from the atypical case of PetrobrasReneries. GRUR
International, Colônia, Alemanha, v. 69, n. 7, p. 706-726, 2020.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 28. ed. São Paulo: Atlas, 2015.
CARVALHO, Vinicius Marques de. Antitruste Under Pressure: Crises Econômicas e Impactos nas
Estratégias de Intervenção. Revista Direito Público, Brasília, v. 18, n. 98, p. 825-878, abr./jun. 2021, DOI
https://doi.org/10.11117/rdp.v18i98.5627.
CASTRO, Bruno Braz de. Eciência e ideologia: inovação, desigualdade e o custo dos erros na
tecnocracia antitruste. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 6, n. 2, 2018.
CORDEIRO, Alexandre; SIGNORELLI, Ana Soa Cardoso Monteiro. Os objetivos do Direito Antitruste:
evolução e perspectivas para o pós-Covid-19. Jota, São Paulo, 01 ago. 2020. Disponível em: https://bit.
ly/3Pdkeqe. Acesso em: 30 ago. 2022.
211210
TREVIZO, Carolina. Uma análise da (in)compatibilidade entre o exercício do leverage regulatório
e a atuação do Cade na defesa da concorrência no Brasil. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 11, n. 1, p. 186-211, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1020
DISTRITO FEDERAL. Seção Judiciária do Distrito Federal. Ação Popular nº 1045614-30.2020.4.01.3400.
16ª Vara Federal Cível. Relator: Juiz Marcelo Rebello Pinheiro, DJ 20 jun. 2022.
FEDERAL TRADE COMMISSION Closes Google/DoubleClick Investigation. Federal Trade Commission.
Washington, 20 dez. 2007. Disponível em: https://bit.ly/42GiPLS. Acesso em: 17 set. 2022.
FELDMAN, Robin Cooper. Defensive Leveraging in Antitrust. Georgetown Law Journal, Georgetown, v.
87, 1999.
FTC ORDER Restores Competition in U.S. Market for Equipment Used to Recharge Vehicle Air
Conditioning Systems. Federal Trade Commission, Washington, 26 nov. 2012. Disponível em: https://
bit.ly/43F8ykC. Acesso em: 2 jul. 2022.
GARNER, Bryan A. Black’s Law Dictionary. 10. ed. Los Angeles: Claitor’s Pub Division, 2014.
HOUAISS, Antônio (ed.). Dicionário Inglês-Português. Rio de Janeiro: Record, 2002.
JASPER, Eric Hadmann. Paradoxo tropical: A nalidade do Direito da Concorrência no Brasil. Revista
de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 7, n. 2, p. 171-189, 2019.
JASPER, Eric. 10 anos da lei de defesa da concorrência. [Entrevista cedida a] Flávia Chiquito dos
Santos. 10 anos de lei de defesa da concorrência. São Paulo: IBRAC, 2022. Disponível em: https://bit.
ly/3N9LDqm. Acesso em: 27 ago. 2022.
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense Ltda., 2023.
KOVACIC, William E.; HYMAN, David A. Regulatory Leveraging: Problem or Solution? George Mason
Law Review, Fairfax, Virginia, Estados Unidos, v. 23, n. 5, p. 1163-1186, 2016. Disponível em: https://bit.
ly/3p73rdK. Acesso em: 30 jul. 2022.
RAMACHANDRAN, Shalini; MCKINNON, John D. Regulators Recommend Approval of Charter-Time
Warner Cable Deal. The Wall Street Journal, Nova Iorque, 25 abr. 2016. Disponível em: https://on.wsj.
com/42Iq06p. Acesso em: 27 ago. 2022.
SOUZA, Kelly Cristina Mendes.Direito Antitruste: defesa da concorrência ou políticas econômicas?2006.
Dissertação (Mestrado em Direito Político e Econômico) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São
Paulo, 2006. Disponível em: https://bit.ly/43EV9cg. Acesso em: 2 ago. 2022.
SOUZA, Sergio Luiz Ribeiro de. Abuso de Poder. Revista da EMERJ, Rio de Janeiro, v. 8, n. 32, 2005.
SPERRY, Paul. Bank CEO Reveals How Obama Administration Shook Him Down. New York Post, Nova
Iorque, 21 fev. 2016. Disponível em: https://bit.ly/440V6aC. Acesso em: 17 set. 2022.
TODD, Patrick F. Digital Platforms and the Leverage Problem. Nebraska Law Review, Lincoln, Nebraska,
Estados Unidos, v. 98, n. 2, p. 487-541, 2019. Disponível em: https://bit.ly/3NtLyPE. Acesso em: 16 ago.
2022.