149148
SILVA, Fábio; LEDO; Bruno. Aspectos regulatórios e seus efeitos no setor de água e esgoto do
Brasil. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 127-148, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1045
PROCESSO DE RESPONSABILIZA-
ÇÃO DE PESSOAS JURÍDICAS: A
ACUMULAÇÃO DAS PENALIDADES
PREVISTAS NA LEI DO SISTEMA BRA-
SILEIRO DE DEFESA DA CONCOR-
RÊNCIA E NA LEI ANTICORRUPÇÃO
NA HIPÓTESE DE FRAUDE EM LI-
CITAÇÃO E CONTRATOS PÚBLICOS
PRATICADA POR EMPRESAS ASSO-
CIADAS NA FORMA DE CARTEL.
1
Liability Process of Legal Entities: the accumulation of
penalties provided for in the Law of the Brazilian System
for the Defense of Competition and in the Anti-Corruption
Law in the event of fraud in bidding and public contracts
practiced by associated companies in the form of a cartel
Vítor César Silva Xavier
2
Controladoria-Geral da União (CGU) – Belo Horizonte/MG, Brasil
RESUMO ESTRUTURADO
Contexto: o microssistema jurídico de combate a corrupção é o conjunto de normas jurídicas que
prevê penalidades para aqueles que se apropriam do Estado, corrompendo agentes públicos,
para lograr benefícios próprios. Fazem parte desse microssistema diversas leis, dentre as quais
a Lei n. 12.529/2011 (Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência) e a Lei n. 12.846/2013
(Lei Anticorrupção). O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e a Controladoria-
Geral da União (CGU) têm competências xadas nessas leis, as quais se pressupõem válidas, e,
consequentemente, essas instituições têm o poder-dever de punir os agentes infratores em situações
previamente determinadas.
Considerando esse contexto, existe relevante controvérsia sobre a possibilidade de que as empresas
Editor responsável: Prof. Dr. Luis Henrique Bertolino Braido, Fundação Getúlio Vargas (FGV/RJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/4648392251476133. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6085-1446.
1 Recebido em: 30/01/2023 Aceito em: 12/06/2023 Publicado em: 31/07/2023
2 Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (2003) e em Relações Internacionais pela Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais (2002). Mestre em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (2005) e doutor em
Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (2022). Atualmente é auditor federal na Controladoria-Geral da União
(CGU), desempenhando a função de Presidente de Comissão de Processo Administrativo Disciplinar. Foi professor do IBMEC,
da Escola de Administração Fazendária (ESAF), da Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) e da Faculdade de Direito
da UFMG, dentre outras instituições. Autor do livro "Lei de Acesso à Informação: teoria e prática". E-mail: vitor.xavier@cgu.gov.
br . Lattes: http://lattes.cnpq.br/8330872431608261. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7448-1511.
8
151150
XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1023
que fraudam licitações e contratos associadas em cartel possam ser apenadas concomitantemente
pelo Cade e pela CGU. Há autores que alegam que a aplicação conjunta e concomitante dessas
sanções conguraria abuso da pretensão punitiva estatal, contrariando em especial os princípios
do non bis in idem, da proporcionalidade e da razoabilidade. Por outro lado, este artigo defende o
dever de se aplicar a dupla punição, na situação em questão, justamente em razão dos princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade.
Objetivo: avaliar a possibilidade de aplicação conjunta das sanções previstas na Lei do Sistema
Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção em situações de fraude em licitações e
contratos públicos praticados por pessoas jurídicas associadas na forma de cartel, considerando as
diretrizes estabelecidas pelos princípios do non bis in idem, da proporcionalidade e da razoabilidade.
Método: o artigo foi produzido a partir de pesquisa documental, em especial incidente sobre a Lei do
Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e a Lei Anticorrupção. Além disso, o artigo também se
baseou em pesquisa jurisprudencial e bibliográca, inclusive com a utilização de diversos institutos
jurídicos reconhecidos pela doutrina.
Conclusões: o Direito Administrativo Sancionador não possui uma resposta especíca e expressa para
dosar a multiplicidade de penalidades aplicáveis a uma mesma pessoa jurídica por uma conduta ou
um conjunto de condutas infratoras do microssistema jurídico anticorrupção. Dentro da hipótese
de fraude em licitação e contratos públicos praticada por pessoas jurídicas associadas na forma de
cartel, vericou-se que a aplicação acumulada das sanções previstas na Lei do Sistema Brasileiro de
Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção é medida razoável e proporcional, não havendo bis in
idem haja vista serem condutas autônomas que atingem valores sociais diferentes.
Palavras-chave: Acumulação de Penalidades – Princípio da Proporcionalidade – Princípio da
Razoabilidade - Princípio do non bis in idem – Concurso de Infrações.
STRUCTURED ABSTRACT
Context: the legal microsystem for combating corruption is the set of legal norms that provides for
penalties for those who appropriate the State, corrupting public agents, to achieve their own benets.
Several laws are part of this microsystem, among which Law n. 12,529/2011 (Brazilian Competition
Defense System Law) and Law no. 12,846/2013 (Anti-Corruption Law). The Administrative Council
for Economic Defense (CADE) and the Comptroller General of the Union (CGU) have competences
established in these laws, which are assumed to be valid, and, consequently, these institutions have
the power-duty to punish the offending agents in situations previously determined.
Considering this context, there is a relevant controversy over the possibility that companies that
defraud bids and contracts associated with cartels can be punished concurrently by CADE and CGU.
There are authors who allege that the joint and concomitant application of these sanctions would
constitute an abuse of the state’s punitive intention, contravening in particular the principles of
non bis in idem, proportionality and reasonableness. On the other hand, this article defends the
duty to apply double punishment, in the situation in question, precisely because of the principles of
proportionality and reasonableness.
Purpose: evaluate the possibility of joint application of the sanctions provided for in the Brazilian
151150
XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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System Law for the Defense of Competition and in the Anti-Corruption Law in situations of fraud in
bids and public contracts practiced by legal entities associated in the form of a cartel, considering
the guidelines established by the principles of non bis in idem, proportionality and reasonableness.
Method: the article was produced from documentary research, in particular incident on Law n. The
article was produced from documentary research, in particular incident on the Law of the Brazilian
System of Defense of Competition and the Anti-Corruption Law. In addition, the article was also
based on jurisprudential and bibliographical research, including the use of several legal institutes
recognized by the doctrine.
Conclusions: Sanctioning Administrative Law does not have a specic and express answer to measure
the multiplicity of penalties applicable to the same legal entity for a conduct or a set of infringing
conducts of the anti-corruption legal microsystem. Within the hypothesis of fraud in bidding and
public contracts practiced by legal entities associated in the form of a cartel, it was veried that the
cumulative application of the sanctions provided for in the Law of the Brazilian System of Defense of
Competition and in the Anti-Corruption Law is a reasonable and proportional measure, not if there is
bis in idem, given that they are autonomous behaviors that affect different social values.
Keywords: Accumulation of Penalties – Principle of Proportionality – Principle of Reasonability –
Principle of non bis in idem – Concurrent Infractions.
Classicação JEL: K21; K42
Sumário: 1. Introdução; 2. Enquadramento das Infrações
Disciplinares; 3. Da Política Legislativa Brasileira
Relativamente à Acumulação de Sanções; 4. Dos
Mecanismos de Contenção do Abuso da Pretensão
Punitiva do Estado; 5. Da Cumulatividade das Sanções da
Lei n. 12.529/2011 e Lei n. 12.846/2013; 6. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
A Constituição da República e a legislação infraconstitucional estabelecem o poder-dever
do Estado de punir, dentro de parâmetros razoáveis e proporcionais, aqueles que praticam condutas
atentatórias aos valores juridicamente protegidos. Nesse sentido, junto com as normas prescritivas
da conduta desejada, que contêm as respectivas sanções, o Direito brasileiro pre diversos
mecanismos jurídicos para limitar a ação do Estado e impedir punições injustas.
Com base nesses limites jurídicos, no Direito Administrativo Sancionador, é recorrente a
alegação de abuso da pretensão punitiva do Estado em situações de cumulatividade de sanções.
Essa discussão sobre a acumulação de sanções, feita na prática em procedimentos administrativos
de responsabilização e também no Poder Judiciário, considera basicamente duas situações distintas:
a) quando uma única conduta enquadrável numa pluralidade de sanções, estabelecidas pelo
Poder Legislativo em um ou diversos textos legais; ou b) quando existem mais de uma conduta cujas
consequências são igualmente estatuídas em uma ou mais de uma lei. Assim, além da possibilidade
teórica de uma única ação ofender uma única norma que possui duas ou mais sanções, não raramente
uma mesma situação concreta ofende dois ou mais valores jurídicos diferentes ao contrariar dois
mandamentos diversos.
153152
XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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Considerando essas duas hipóteses teóricas para acumulação de sanções, num primeiro
momento, no âmbito do processo legislativo e pautando-se em especial nos princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade, deve-se considerar a autonomia do Poder Legislativo para
estabelecer as consequências advindas do descumprimento das normas proibitivas, isto é, aquelas
penalidades derivadas da conduta juridicamente não desejada. Para além das questões políticas,
não dúvidas que a função legislativa deve ser exercida em conformidade com a Constituição da
República, o que implicaria seguir os princípios implícitos do non bis in idem, da proporcionalidade
e da razoabilidade, cabendo ao Poder Judiciário o controle direito e indireto de constitucionalidade
sobre as leis aprovadas. Num segundo momento, a análise de conformidade do exercício do poder
punitivo estatal deve considerar a aplicação da lei pelas autoridades públicas competentes, em
processos de natureza judicial ou administrativa, a quem compete sobretudo interpretar a lei e julgar
o caso concreto. O enquadramento legal da conduta ou condutas ao tipo é igualmente essencial
para a atribuição das consequências legalmente estabelecidas; nessa atividade, o aplicador do
Direito também deve se atentar para a existência de limites constitucionais e legais, tais como os
anteriormente citados.
Sendo qual for a situação de acumulação de sanções, Vianna e Souza (2022) manifestam
preocupação com a proliferação de penalidades administrativas no microssistema anticorrupção.
Dada a falta de estudos quanto aos efeitos dessas sanções no Brasil, os autores defendem que não se
pode presumir que a simples imposição de punições cada vez mais rigorosas são capazes de reprimir
adequadamente a prática de ilícitos. Indo além, esses autores questionam a constitucionalidade da
acumulação de sanções estabelecidas no microssistema anticorrupção, situação que ofenderia os
princípios do non bis in idem, da proporcionalidade e da razoabilidade.
Dentro do contexto apresentado, a proposta deste artigo é justamente avaliar a possibilidade
de aplicação conjugada especicamente das sanções previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa
da Concorrência e na Lei Anticorrupção na situação de fraude em licitações e contratos públicos
praticada por pessoas jurídicas associadas na forma de cartel.
Para a solução do problema proposto, será realizada uma análise sistemática das leis
supracitadas dentro do contexto normativo vigente, considerado os limites da atividade punitiva do
Estado, os cânones da hermenêutica e a ideia de tipicação, apoiando-se ainda nos consagrados
conceitos do concurso de infrações que se originaram no Direito Penal, mas que podem ser aplicados
de forma suplementar ao Direito Administrativo Sancionador.
2. DO ENQUADRAMENTO DAS INFRAÇÕES DISCIPLINARES
Toda norma jurídica é composta basicamente por duas partes, uma descrição da conduta
idealizada ou indesejada, que possui como pano de fundo um valor socialmente relevante, e a
correlata consequência atribuída pelo Estado no caso dessa expectativa ser cumprida ou descumprida
(KELSEN, 2011). A descrição da conduta se consubstancia num tipo que possuí como núcleo um verbo
e ainda elementos secundários objetivos e subjetivos, tais como o ânimo do agente, a nalidade da
conduta, as circunstâncias de tempo e lugar. A consequência estatuída pelo Direito é chamada de
sanção, a qual pode ser de caráter punitivo ou premial.
É um equívoco imaginar que uma norma jurídica corresponda necessariamente a um artigo
153152
XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1023
ou a um inciso ou mesmo a uma lei. De acordo com Kelsen (2011), a norma jurídica é o sentido de um
ato de vontade que ultrapassa qualquer texto e é resultado nal de um processo de interpretação do
que seria o Direito em um sentido mais amplo, enquanto ordenamento jurídico. Dito de outra forma,
a norma jurídica pode até corresponder a interpretação literal extraída isoladamente de um único
artigo, alínea ou inciso, mas não raramente o sentido vai além da literalidade e é dado pelo conjunto
normativo que é objetivado em diversos textos diferentes, sendo inclusive possível que o tipo esteja
em uma lei diversa daquela que contém a sanção.
O enquadramento da conduta praticada efetivamente pelo infrator ao tipo legalmente
estatuído é condição essencial para a aplicação da penalidade. Para existir esse enquadramento,
é preciso que todos os elementos legalmente estabelecidos no tipo estejam na conduta concreta
do agente, sendo que a ausência de qualquer dos elementos do tipo afasta a aplicação da sanção
punitiva.
Dito isso, o fato é que existe uma pluralidade de infrações diferentes previstas nos
ordenamentos jurídicos, o que coloca como questão central a possibilidade que o Direito preveja
múltiplas penalidades para exatamente uma mesma e única conduta e também para as situações em
que existe uma pluralidade de condutas infracionais, ligadas ou não a um mesmo objetivo.
Nesses termos, considera-se que, em teoria, uma única conduta do acusado poderia se
enquadrar em uma única infração sujeita a uma ou mais penalidades ou essa conduta singular
poderia ser teoricamente enquadrada em mais de uma infração prevista na legislação, podendo
igualmente atrair diferentes tipos de penalidades, tais como as administrativas, cíveis e criminais.
Além disso, em muitos casos concretos, o infrator pratica diversos atos para alcançar seus objetivos
ilícitos, os quais também podem se enquadrar em numa pluralidade de condutas tipicadas como
infração, ensejando a aplicação de uma multiplicidade de sanções.
Por tudo isso, quanto a aplicabilidade de sanções, saliente-se que tanto faz para a Ciência
do Direito se a conduta é uma infração prevista como tal em uma única lei ou duas leis diferentes,
o que importa, ao menos num primeiro momento, é se a conduta se enquadra ou não em tipos
infracionais. Assim, a aplicação de mais de uma sanção ao infrator decorre do Ordenamento Jurídico
e não da interpretação isolada de uma lei; contudo, ressalte-se que a aprovação de leis e a eventual
aplicação de uma pluralidade de sanções precisam ser analisadas a partir da legislação especíca de
cada Estado, considerando a eventual existência de limites aplicáveis ao legislador ou à autoridade
pública responsável pela aplicação da lei, o que será feito a seguir neste trabalho.
3. DA POLÍTICA LEGISLATIVA BRASILEIRA RELATIVAMENTE À
ACUMULAÇÃO DE SANÇÕES
A análise da política legislativa brasileira relativamente a acumulação de sanções deve partir
da Constituição nacional; é certo dizer que não previsão especíca e expressa sobre o assunto. Por
isso, a doutrina corrobora majoritariamente o entendimento de que pode o Poder Legislativo atribuir
uma multiplicidade de sanções, alternativas e acumulativas, a uma mesma conduta infracional
ou a condutas infracionais diversas. Nesse sentido, cite-se que Ferreira (2001, p. 133) reconhece a
possibilidade de aplicação de múltiplas penalidades administrativas para uma única conduta
praticada pelo administrado em razão de não existir proibição constitucional ou legal. Vitta (2003, p.
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XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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119) também reconhece a possibilidade de “ser imposta mais de uma penalidade administrativa ao
infrator ou responsável, quando ocorre descumprimento de um mesmo dever, porém, explicitamente,
a norma determina a imposição, concomitante, de diferentes penalidades administrativas.
A despeito da omissão autorizativa constitucional, destaca-se que a Lei de Introdução ao
Direito Brasileiro (LINDB), a qual possui a nalidade de orientar a interpretação de todo o Direito
pátrio e é dirigida inclusive aos legisladores, admitiu expressamente a sobreposição de penalidades
sobre um mesmo agente:
Art. 22. [...]
§ 3º As sanções aplicadas ao agente serão levadas em conta na dosimetria
das demais sanções de mesma natureza e relativas ao mesmo fato (BRASIL,
1942, grifo nosso).
Destaca-se que, conforme previsto expressamente na LINDB, a pluralidade de penalidades
aplicadas em conjunto pode ter inclusive a mesma natureza
3
; ou seja, há autorização da LINDB para
que o Poder Legislativo estabeleça a pluralidade de sanções administrativas que for necessária para
a repressão das condutas indesejadas.
Conrmando a orientação geral estabelecida na LINDB, verica-se que o Direito brasileiro é rico
em situações em que uma única conduta atrai múltiplas penalidades, sejam elas de mesma natureza
ou não, estando em textos jurídicos distintos ou em uma mesma lei. A título de exemplo, citem-
se: o Código Penal prevê diversas hipóteses de restrição de liberdade cumulada com o pagamento
de multa penal
4
; o Código de Trânsito Nacional prevê acumulação das penas administrativas de
multa e suspensão do direito de dirigir
5
; a prática de homicídio atrai, além de sanções criminais, o
dever de indenizar a vítima e a família previsto no Código Civil
6
; o artigo 12 da Lei nº 8.429/1992 (Lei
de Improbidade Administrativa) estabelece expressamente diversas sanções que podem ainda se
3 Além disso, a natureza da sanção não pode ser motivo para dúvida quanto à possibilidade de acumulação de san-
ções. A diferença básica entre as sanções penais e administrativas é a autoridade que a impõe. Em sua essência, as sanções
possuem as mesmas nalidades, a diferença é que a administrativa é xada pela Autoridade Pública no exercício da função
administrativa e, assim, dentro de um processo administrativo, conforme entende Mello (2019, p. 898): “reconhece-se a natu-
reza administrativa de uma infração pela natureza da sanção que lhe corresponde, e se reconhece a natureza da sanção pela
autoridade competente para impô-la”. A igualdade de natureza das sanções a serem acumuladas sobre uma única conduta ou
mesmo sobre condutas diferentes não determina por si só o grau de reprimenda que a infração exige do Poder Legislativo e,
por isso, é possível se acumular sanções de mesma natureza para se punir mais duramente as ofensas mais graves aos valo-
res sociais, mas igualmente se pode acumular sanções de natureza diversa para combater as condutas indesejadas, se assim
entender o Poder Legislativo. Na verdade, a aplicação de sanções de natureza diversa é tão somente um desdobramento da
independência inquestionável das instâncias penal, administrativa e civil.
4 Calúnia
Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato denido como crime:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa (BRASIL, 1940).
5 Art. 174. Promover, na via, competição, eventos organizados, exibição e demonstração de perícia em manobra de
veículo, ou deles participar, como condutor, sem permissão da autoridade de trânsito com circunscrição sobre a via:
Infração - gravíssima;
Penalidade - multa (dez vezes), suspensão do direito de dirigir e apreensão do veículo; [...]
Art. 306 Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da inuência de álcool ou de
outra substância psicoativa que determine dependência:
Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para
dirigir veículo automotor (BRASIL, 1997).
6 Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:
I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família;
II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima
(BRASIL, 2002).
155154
XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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acumular com outras sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação especíca; o
artigo 87, §2º, da Lei 8.666/93 (Lei de Licitações), permite expressamente a imposição conjunta de
multa com a advertência, a suspensão temporária ou a declaração de inidoneidade, tal como a Nova
Lei de Licitações.
Especicamente sobre a questão levantada neste trabalho acadêmico, tem-se que a Lei
n. 12.529/2011 (Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência) estabelece em seu artigo 36
uma pluralidade de sanções que expressamente podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente
entre si, independentemente de culpa e em conformidade com a gravidade dos fatos ou o interesse
público geral, mesmo nas situações em que houve apenas uma única conduta punível: multa;
publicação extraordinária da decisão condenatória, às expensas do infrator; proibição de contratar
com instituições nanceiras ociais e participar de licitação; inscrição do infrator no Cadastro
Nacional de Defesa do Consumidor; cisão de sociedade, transferência de controle societário, venda
de ativos ou cessação parcial de atividade; proibição de exercer o comércio em nome próprio ou
como representante de pessoa jurídica, pelo prazo de até 5 (cinco) anos; e qualquer outro ato ou
providência necessários para a eliminação dos efeitos nocivos à ordem econômica. Por seu turno,
a Lei n. 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) igualmente prevê, em seu artigo 6
o
, o pagamento de multa
cumulado com a publicação extraordinária da decisão condenatória, às expensas do infrator, na
hipótese de cometimento das infrações previstas no seu artigo 5
o
. Além disso, em seu artigo 30 , a
Lei Anticorrupção prevê expressamente a acumulação de suas sanções administrativas com a Lei
n. 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa) e com a Lei n. 8.666/1993 (Lei de Licitações, em
processo de substituição pela nova Lei de Licitações – n. 14.133/21)
7
e, em seu artigo 19, estabelece a
possibilidade de acumulação das sanções de multa e publicação extraordinária com outras sanções,
de natureza judicial, as quais somente podem ser impostas pelo Poder Judiciário. Então, ao menos
isoladamente, não dúvidas quanto a pluralidade de sanções, inclusive administrativas, que
decorrem da Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e da Lei Anticorrupção.
Assim, os exemplos de acumulação de sanções para uma ou mais condutas previstas em
uma mesma lei ou em leis diferentes são incontáveis no Direito brasileiro e, considerando que a
norma é o sentido de um ato de vontade, o local textual de onde se origina a sanção é um mero
detalhe. Conrmada a possibilidade de aplicação de uma pluralidade de sanções para uma única
conduta infracional, não deve haver dúvidas de que o Direito Administrativo Sancionador pode
também prever mais de uma penalidade quando há a prática de duas ou mais condutas indesejadas.
E denitivamente a acumulação de penalidades não depende da natureza da sanção, que por si
pouco diz sobre a maior ou a menor necessidade de repreensão da conduta que depende também
do tipo da sanção (aspecto qualitativo).
4. DOS MECANISMOS DE CONTENÇÃO DO ABUSO DA PRETENSÃO
PUNITIVA DO ESTADO
Os princípios do ne bis in idem, da proporcionalidade e da razoabilidade integram a
7 A Controladoria-Geral da União (CGU) entende que é possível a acumulação de penalidades administrativas previstas
na Lei de Licitações (Lei n. 8.666/93) com a Lei n. 12.846/2013 (Lei Anticorrupção), mesmo estando as sanções em textos
diferentes, conforme consta de seu Manual de Responsabilização de Entes Privados (BRASIL, 2022, p. 68): “A responsabilização
administrativa de entes privados tem respaldo de múltiplas fontes normativas. [...] As penalidades previstas nos diplomas
podem ser cominadas aos infratores de modo isolado ou cumulado, dependendo da subsunção do caso concreto num ou em
mais de um dispositivo legal, o que evidencia a necessidade de diálogo das normas para harmonia do sistema”.
157156
XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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Constituição da República Federativa do Brasil de forma implícita, são pressupostos lógicos
estabelecidos a partir de outras regras constitucionais vigentes e respaldados nos cânones da ciência
do Direito e na hermenêutica jurídica.
Em relação aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, não há dúvidas que
possuem um alcance imenso tanto como orientação para a atividade legislativa como para a
aplicação da norma jurídica. Especicamente no que se refere a xação legal das penalidades, esses
princípios não vedam que o Poder Legislativo estabeleça a aplicação de uma pluralidade de sanções.
Contudo, o Poder Legislativo deve considerar a necessidade da ação dissuasória e pedagógica do
Estado no combate a ofensa aos valores sociais, prevendo penalidades razoáveis e proporcionais
para se atingir a nalidade do ius puniendi estatal. Assim, condutas mais graves devem ser punidas
mais duramente e isso pode exigir a aplicação de diferentes tipos de sanção. certas condutas
extremamente ofensivas aos valores sociais que exigirão penalidades cumulativas para sua
repreensão, por outro lado, há situações em que a pluralidade de sanções visa conferir a autoridade
pública alternativas sancionatórias para combater com efetividade a infração perpetrada, de modo
que se possa selecionar as consequências mais adequadas ao tratamento do caso, sejam as penas
mais brandas ou as mais duras.
Já no momento da aplicação do Direito, com base nesses princípios, é preciso citar que
aquele que comete duas ou mais infrações não poderia, por razoabilidade e proporcionalidade, ser
punido igual àquele que praticou uma única dessas mesmas infrações. Para justicar a pluralidade
de punições nessas situações de concurso de infrações, Zanobini (1924, p. 156) defende que “se a
pessoa tinha um duplo dever de não cometer o fato, cometendo-o, viola duas diversas obrigações e
deve suportar as consequências da dupla transgressão. Ademais, também no momento de aplicação
das penalidades e por razoabilidade, com base no § 3º do artigo 22 da LINDB, é preciso reconhecer a
possibilidade de detração das penas, de modo que pode ser feito abatimento da aplicação de uma
pena imposta por uma determinada autoridade pública na penalidade xada por outra autoridade
de exatamente mesma natureza e com base na mesma conduta e base legal, situação diversa daquela
retro mencionada em que existem dois deveres distintos
8
.
Já o princípio ne bis in idem é um mecanismo especíco de contenção do abuso da pretensão
punitiva do Estado, desdobramento do princípio da legalidade e da correlata exigência de tipicidade
prévia à punição. Ao contrário dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade que limitam
a ampla discricionariedade do legislador e do aplicador do Direito, o princípio ne bis in idem é uma
diretriz voltada restritiva e primordialmente àqueles que aplicam o Direito. Nesse sentido, no âmbito
administrativo, Mello (2007, p. 210-211) entende que o princípio do non bis in idem é uma orientação
dirigida para a autoridade pública que processa e pune seus agentes. Esse princípio proibi o duplo
enquadramento no mesmo tipo a atrair a dupla punição de um agente pela prática de um único
ato, afastando a possibilidade de que o enquadramento seja feito duas vezes em um mesmo tipo
penal, administrativo ou civil. Nakayoshi e Bandeira de Mello (2022) concluem, após vasta revisão
bibliográca, que haveria bis in idem quando duas ou mais punições possuem a tríplice identidade
de sujeito infrator, fatos e fundamentos. Assim, de acordo com esse princípio, a sanção ou o conjunto
de sanções previstas numa norma descumprida somente pode incidir uma única vez para cada
8 O Tribunal de Contas da União já reconheceu em seus julgados, conforme consta no Acórdão 977/2023 – Plenário, a
possibilidade de detração: “que fosse considerada a detração do tempo da penalidade aplicada pela CGU, pois, nos dois casos
citados, as sanções desta e do TCU seriam de mesma natureza e relativas ao mesmo fato, que seria a existência de “fraudes
em licitações para obras de implantação da Renaria do Nordeste (Rnest)” (BRASIL, 2023).
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XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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conduta delituosa efetivamente praticada.
Consequentemente, a duplicidade de punição que o princípio ne bis in idem evita é aquele
em que uma ou mais autoridades de julgamento aplicam a uma mesma conduta exatamente a mesma
norma (em termos de tipicação e sanção) duas ou mais vezes
9
. Outro desdobramento do princípio
em comento é a não possibilidade de nova punição por norma posterior que revogou norma anterior
que justicou uma primeira punição, seja a segunda mais grave ou não. Além disso, a regra do ne bis
in idem proíbe que uma mesma circunstância fática seja utilizada duas vezes em condições diferentes
para penalizar o agente como agravante dentro do mesmo tipo infracional; em tipos distintos, essa
regra fundamenta a absorção da infração menos grave contida na mais grave, uma vez que a primeira
integra a segunda.
Ou seja, somente haverá bis in idem quando existir identidade de conduta, agente e
fundamento jurídico, aqui entendido como norma proibitiva (tipo e sanção). Dito em termos mais
simples, a duplicidade de punição que o princípio ne bis in idem evita é aquele em que uma ou
mais autoridades de julgamento aplicam a uma mesma conduta exatamente a mesma norma (em
termos de tipicação e sanção) duas ou mais vezes. Se o fundamento jurídico para a punição (tipo
infracional e sanção) da conduta é outro ou se existe mais de uma conduta enquadrável em dois ou
mais tipos diferentes, não há bis in idem e sim concurso de infrações: houve realmente mais de uma
infração e é natural que a legislação estabeleça punição mais dura para aquele que descumpre mais
de um dever.
5. DA CUMULATIVIDADE DAS SANÇÕES DA LEI N. 12.529/2011 E LEI N.
12.846/2013
A Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência dispõe que compete ao Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem
econômica, orientada pelos ditames constitucionais de liberdade de iniciativa, livre concorrência,
função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico,
sem mencionar expressamente qualquer atribuição relativa especicamente a práticas de corrupção
(BRASIL, 2011).
Dentro dessa pluralidade de temas, a Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência
prevê diversas infrações, dentre as quais se destaca a infração à ordem econômica de “ajustar
com concorrente, sob qualquer forma: [...] preços, condições, vantagens ou abstenção em licitação
pública”:
Art. 36. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de
culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto
ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados:
I - limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou
a livre iniciativa;
II - dominar mercado relevante de bens ou serviços;
III - aumentar arbitrariamente os lucros; e
9 Além disso, o princípio ne bis in idem prbe que uma mesma circunstância fática seja utilizada duas vezes em
condições diferentes para penalizar o agente como agravante dentro do mesmo tipo infracional.
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XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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IV - exercer de forma abusiva posição dominante. [...]
§ 3º As seguintes condutas, além de outras, na medida em que congurem
hipótese prevista no caput deste artigo e seus incisos, caracterizam infração
da ordem econômica:
I - acordar, combinar, manipular ou ajustar com concorrente, sob qualquer
forma:
a) os preços de bens ou serviços ofertados individualmente;
b) a produção ou a comercialização de uma quantidade restrita ou limitada
de bens ou a prestação de um número, volume ou frequência restrita ou
limitada de serviços;
c) a divisão de partes ou segmentos de um mercado atual ou potencial
de bens ou serviços, mediante, dentre outros, a distribuição de clientes,
fornecedores, regiões ou períodos;
d) preços, condições, vantagens ou abstenção em licitação pública; [...]
(BRASIL, 2011, grifo nosso).
Então, com base na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, é preciso reconhecer
duas situações fáticas distintas indesejadas que devem ser consideradas como formação de cartel
10
:
a) agentes econômicos em tese concorrentes que passam a combinar previamente a atuação conjunta
em licitações para controlar preço e outras condições de contratação (inciso I, alínea “d” do §3º
do artigo 36); b) agentes econômicos em tese concorrentes que passam a combinar previamente
a atuação conjunta em outras situações de mercado que não sejam afetas a procedimentos de
licitação (demais hipóteses do §3º do artigo 36). Na primeira hipótese, o enquadramento na Lei do
Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência é feito especicamente no inciso I, alínea “d”, do §
do artigo 36, enquanto a segunda hipótese se enquadraria na previsão mais genérica das alíneas a,
b e c no inciso I do § 3º do mesmo artigo (BRASIL, 2011). Será, consequentemente, competência do
Cade avaliar a formação de cartel, inclusive quando procedimentos licitatórios ou contratos públicos
são afetados.
Por outro lado, a Lei Anticorrupção trata especicamente do combate à corrupção e conferiu
à CGU competência concorrente com outras autoridades públicas para instauração de procedimentos
de responsabilização de pessoas jurídicas, nos termos do § 2º do art. 8º. Essa lei prevê diversas
práticas como corrupção, das quais se destaca a fraude em licitação pública ou do contrato dela
decorrente:
Art. Constituem atos lesivos à administração pública, nacional ou
estrangeira, para os ns desta Lei, todos aqueles praticados pelas pessoas
jurídicas mencionadas no parágrafo único do art. 1º, que atentem contra
o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da
administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos
pelo Brasil, assim denidos: [...]
10 De acordo com a Cartilha do Cade de 2016, “cartel é qualquer acordo ou prática concertada entre concorrentes
para xar preços, dividir mercados, estabelecer quotas ou restringir produção, adotar posturas pré-combinadas em licitação
pública, ou que tenha por objeto qualquer variável concorrencialmente sensível” (BRASIL, 2016, p. 14).
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XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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IV - no tocante a licitações e contratos:
a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro
expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público;
b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de
procedimento licitatório público;
c) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento
de vantagem de qualquer tipo;
d) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente; [...] (BRASIL, 2013,
grifo nosso).
O artigo da Lei Anticorrupção, ao tipicar os atos lesivos à Administração Pública brasileira,
destaca, nas alíneas “a” e “d” do seu inciso IV, a fraude praticada no âmbito das licitações e dos
contratos públicos. Num primeiro momento, o intérprete poderia imaginar que essas regras estão
em conito entre si. A solução da antinomia aparente é simples em razão da regra hermenêutica da
especialidade. A alínea “a” trata das fraudes em licitação mediante ajuste de vontades e a alínea “d”
trataria das demais fraudes em licitação e contratos públicos, as quais não exigem ajuste prévio ou
combinação. Assim, a alínea “a” do inciso IV do artigo 5º da Lei n. 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) diz
respeito especicamente a qualquer ajuste para fraudar licitações
11
(BRASIL, 2013).
Dito isso, restaria uma outra aparente contradição a ser discutida. A alínea “a” do inciso IV
do artigo 5º da Lei Anticorrupção e a alínea “d” do inciso I do §3º do artigo 36 da Lei do Sistema
Brasileiro de Defesa da Concorrência, já que ambas as regras também versariam sobre fraude em
licitação pública mediante ajuste. Uma leitura pautada meramente na literalidade dos textos legais
levaria ao equivocado entendimento que uma pessoa jurídica que ajusta com o concorrente o preço
de uma licitação não poderia ser punida de forma cumulativa pela Lei do Sistema Brasileiro de
Defesa da Concorrência e Lei Anticorrupção em função principalmente do princípio do non bis in
idem, de modo que incidiria no caso concreto apenas uma dessas leis.
Contudo, se presume a validade das leis não revogadas expressamente; assim, a primeira
hipótese a se considerar é que não existe contradição real entre as normas, mas apenas uma
necessidade de delimitação da abrangência normativa a ser resolvida por uma interpretação
adequada, de modo que se deve considerar a compatibilidade das regras em discussão. Além do
mais, a partir de uma interpretação nalística do Direito, a atuação dos órgãos de controle interno e
externo não pode ser considerada antagônica, mas complementar na medida em que suas atividades
buscam alcançar nalidades no mínimo conexas. Por isso e considerando uma interpretação
sistemática do Direito, durante a atividade de xar sentido (reconhecer a norma jurídica), deve-se
buscar a conciliação das competências do Cade e da CGU na atividade de controle.
Não há dúvidas de que o escopo de atuação do Cade é diferente que o da CGU e isso está
pautado na literalidade normativa, sendo certo de que a lei não traz palavras inúteis; o Cade busca
basicamente a proteção da ordem econômica enquanto a CGU é a autoridade de combate à corrupção
e de melhoria da gestão no nível federal. Assim, a competência para prevenir e reprimir infrações à
ordem econômica, inclusive cartéis, é do Cade que, nos termos da Lei do Sistema Brasileiro de Defesa
da Concorrência, deve impor sanções administrativas às condutas anticompetitivas descritas no artigo
11 O ajuste poderia ser entre uma única empresa concorrente e os funcionários do Estado, o que não congura cartel.
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XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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36 da Lei de Defesa da Concorrência, dentre as quais a formação de cartel. Essas são competências
distintas das da CGU, assim explicitamente reconhecidas no art. 29 da Lei Anticorrupção, norma que
reforça a tese de que as sanções poderiam em tese ser acumuladas:
Art. 29. O disposto nesta Lei não exclui as competências do Conselho
Administrativo de Defesa Econômica, do Ministério da Justiça e do Ministério
da Fazenda para processar e julgar fato que constitua infração à ordem
econômica (BRASIL, 2013).
O próprio Cade reconhece que tem competência para punir a formação de cartel, mas não é
de sua competência avaliar qualquer prática de corrupção:
Importa ressaltar que a relação entre as esferas se trata de ação coordenada,
pois o combate à corrupção, ainda que a prática esteja intimamente ligada
a um ilícito de cartel, não é competência do Cade (BRASIL, 2019, p. 57, grifo
nosso).
Isto posto, não há dúvidas de que a Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência
incumbiu o Cade de aplicar sanções administrativas aos membros de cartéis, inclusive quando um
cartel age para fraudar licitação ou contratos públicos. Por outro lado, é de se ressaltar que nem toda
prática de corrupção irá atrair a competência do Cade, mas apenas aquelas vinculadas à manutenção
da ordem econômica.
Já a CGU é a principal agência anticorrupção do Brasil. A Lei n. 12.846/2013 (Lei Anticorrupção)
conferiu a esse órgão de controle competência para instauração ou avocação de procedimentos de
responsabilização de pessoas jurídicas, no âmbito do Poder Executivo federal, conforme § do
art. 8
o
(BRASIL, 2013). Essa competência abarca as infrações do retro mencionado artigo 5
o
da Lei
Anticorrupção, inclusive quaisquer fraudes a licitação ou contratos públicos envolvendo o Poder
Executivo federal.
A fraude em uma licitação pode ocorrer de diversas maneiras diferentes; existem formas
de se fraudar licitações e contratações públicas que não envolvem acordo entre concorrentes:
superfaturamento, falta de ampla divulgação do certame, dispensa ou inexigibilidade indevida de
licitação, direcionamento a uma empresa no momento da elaboração do edital, apresentação de
documentos falsos, desnecessidade de contratação etc. Então, a fraude à licitação e contratação
pública pode ou não envolver ajuste prévio; e mesmo quando há ajuste com o intuito fraudatório
não necessariamente ele é feito entre as empresas licitantes ou contratantes. O acordo de vontades
para fraudar a licitação pode, por exemplo, ser feito por um dos licitantes com servidor do órgão
contratante ou mesmo dos órgãos públicos supervisores ou de controle.
Independentemente da modalidade de fraude à licitação, o ato fraudulento cometido em
um procedimento licitatório lesa o patrimônio público e a lisura da escolha do fornecedor de bens e
serviços, valores jurídicos protegidos pela CGU. A formação de cartel, por seu turno, ofende a economia
de mercado, em especial a livre concorrência entre os agentes privados, atraindo a atuação do Cade.
Formar um cartel e fraudar uma licitação ou contratação pública são condutas diversas, ainda que
possam estar presentes no mesmo caso concreto, e ofendem valores sociais diferentes, possuindo
tipicação penal e administrativas também diversas. Nesse sentido, o Cade registrou entendimento
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previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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em seu Guia de Combate a Cartéis em Licitação de que a formação de cartel e a fraude seriam
realmente duas infrações diferentes:
é preciso entender que ainda que interconectadas as práticas de corrupção
e colusão são ilícitos autônomos, i.e., uma não é condição para a existência
da outra, podendo, nesse sentido, existir de maneira completamente
independente.
Consequentemente, cartéis em licitações e atos de corrupção são infrações
de natureza diversa e recebem tratamento próprio no ordenamento jurídico
brasileiro. Logo, é muito importante reconhecer corretamente as condutas
que caracterizam um e outro e os efeitos daí decorrentes, como a espécie
de sanção aplicável a cada caso, os órgãos competentes para investigar e
aplicar punições, e etc. (BRASIL, 2019, p. 56, grifo nosso).
Dito isso, tem-se que: 1) Nem sempre haverá cartel em situação de fraude à licitação ou
contratação pública; 2) situações de cartel em que não fraude à procedimento de licitação
ou contratação pública; 3) o Cade somente pune em razão do ato de formação de cartel, haja ou
não procedimento de licitação ou contratação pública; 4) enquanto a CGU pune em decorrência da
existência da fraude, haja ou não a formação de cartel; 5) para se cometer a infração de cartel não
é necessário fraudar licitação e vice-versa, então, não se aplica o princípio da absorção de uma
penalidade pela outra; 6) a alínea “d” do inciso I artigo 36 da Lei do Sistema Brasileiro de Defesa
da Concorrência versa sobre um ajuste especíco atentatório à ordem econômica, a formação de
cartel em situação de fraude em licitação pública, não havendo contradição com as normas da Lei
Anticorrupção que pune exclusivamente fraudes, independentemente da existência de cartel, como
por exemplo o ajuste entre funcionários públicos e uma única empresa e o superfaturamento na
execução do contrato.
Dessa forma, observa-se que, apesar da fraude em licitação e formação de cartel possuírem
certa congruência prática, as infrações permanecem sendo situações que não se confundem e, em
cada caso, haverá uma norma aplicável e um órgão competente para investigação e responsabilização.
Consequentemente, um mesmo caso concreto pode conter ações que se enquadrem como
infrações contra a ordem econômica, como a formação de cartel, cuja competência para apuração
administrativa é exclusiva do Cade, e outras condutas lesivas ao patrimônio público que caracterizam
ato de corrupção, como a fraude a licitações e contratos públicos, mediante ajuste ou não, cuja
competência para apuração administrativa é das unidades de correição do Poder Executivo federal
ou concorrentemente da própria CGU.
Esse entendimento sepulta qualquer incoerência aparente entre a Lei do Sistema Brasileiro
de Defesa da Concorrência e a Lei Anticorrupção. Ademais, sendo certo de que a fraude e a formação
do cartel são condutas ilícitas diversas e autônomas, previstas em tipos legais diferentes em que
um não pressupõe a prática do outro, não que se alegar situação de bis in idem. Também por
causa dessa autonomia dos tipos ilícitos em comento, não é possível a detração das penalidades
aplicadas pela CGU e pelo Cade, ainda que se trate de sanções de mesma natureza, seja de multa ou
impedimento de licitar.
Sob a ótica dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, ainda resta pendente a
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previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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discussão sobre a possibilidade de acumulação entre as infrações previstas na alínea “d” do inciso
IV do artigo 5º da Lei Anticorrupção e a alínea “d” do inciso I do §3º do artigo 36 da Lei do Sistema
Brasileiro de Defesa da Concorrência, respectivamente, “fraudar licitação pública ou contrato
dela decorrente” (BRASIL, 2013) e “acordar, combinar, manipular ou ajustar com concorrente, sob
qualquer forma: [...] preços, condições, vantagens ou abstenção em licitação pública” (BRASIL, 2011).
Isso porque, embora esteja pacicada a existência de competências da CGU e do Cade para atuar
numa mesma situação concreta de fraude à licitação mediante atuação de cartel com base em tipos
infracionais autônomos, a acumulação de sanções poderia ser desproporcional ou desarrazoada.
Considerando os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, não pode haver dúvida
de que a prática das duas condutas ilícitas autônomas em discussão é uma ofensa ainda maior à
sociedade do que cada prática isoladamente de uma delas, causando danos mais profundos aos
valores sociais tutelados pelo Direito
12
. Ora, a formação prévia de um cartel confere muito mais
potencial lesivo à sociedade para fraudar licitações e, consequentemente, lesar o patrimônio público
do que uma fraude envolvendo uma única empresa em conluio com um único funcionário público;
além do que o cartel pode se manter para a prática de outras infrações, inclusive diversas da fraude
de licitações e contratos públicos.
No Direito Penal, a xação das penalidades quando a prática de duas condutas ilícitas
diversas é solucionada pelos institutos do concurso de infrações, mais especicamente o concurso
material
13
. Nesse sentido, um exemplo do Direito Penal pode ser ilustrativo e contribuir, por analogia
de tratamento, para a solução do suposto conito entre as alíneas “d” do inciso IV do artigo da Lei
n. 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) e alínea “d” do inciso I artigo 36 Lei n. 12.529/2011 (Lei do Sistema
Brasileiro de Defesa da Concorrência). Suponha que 3 ou mais pessoas se associem para a prática de
crimes e, de fato, consumem a prática de roubo. A associação criminosa está prevista no artigo 288
do Código Penal, enquanto o roubo congura o delito autônomo do artigo 157 do mesmo diploma.
Não há dúvidas de que são praticados 2 crimes diferentes, em que um não é meio necessário para a
prática do segundo, havendo consequentemente concurso de crimes. Ora, o cartel é justamente uma
forma de associação ilícita, típica de empresas, e não é meio necessário para realizar fraudes, mas
necessariamente visa a prática de atos ilícitos. Então, em paralelo com a associação criminosa para
prática de outros delitos, caso o agente cometa as duas infrações administrativas, as penas devem
ser acumuladas:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ASSOCIAÇÃO
CRIMINOSA ARMADA (ART. 288, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO PENAL).[...]
CONDENAÇÃO CONCOMITANTE PELOS DELITOS DE ROUBO CIRCUNSTANCIADO
PELO CONCURSO DE PESSOAS E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA ARMADA. BIS IN IDEM.
INOCORRÊNCIA. VÍNCULO ASSOCIATIVO. EXISTÊNCIA DE PROVA SUFICIENTE À
CONDENAÇÃO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA N. 7/
STJ. [...]
12 A formação de cartel, por si só, causa efeitos gravíssimos à sociedade. Nesse sentido, cite-se Deschk (2016, p.
177, grifo nosso): “O cartel é considerado a mais grave lesão à concorrência, dentre as condutas anticompetitivas. Cartel é
um acordo entre concorrentes, cujo objetivo é eliminar a concorrência, podendo ser através de xação de preços, cotas de
produção, divisão de mercados, entre outros. O cartel traz enormes prejuízos para a sociedade, aumentando o preço dos
produtos e afetando sua disponibilidade no mercado, prejudicando os consumidores, o desenvolvimento da economia, e a
inovação tecnológica, afetando de maneira considerável o bem-estar social [...]”.
13 De acordo com o Código Penal (art. 69), haveria concurso material quando: “Quando o agente, mediante mais de uma
ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade
em que haja incorrido” (BRASIL, 1940).
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XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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4. Segundo a jurisprudência desta Corte, não há bis in idem na condenação
pelo crime de associação criminosa armada e pelo de roubo qualicado
pelo concurso de agentes, pois os delitos são autônomos, aperfeiçoando-
se o primeiro independentemente do cometimento de qualquer crime
subsequente. Ademais, os bens jurídicos protegidos pelas normas
incriminadoras são distintos – no caso do art. 288, parágrafo único, do CP,
a paz pública e do roubo qualicado, o patrimônio, a integridade física e a
liberdade do indivíduo (BRASIL, 2019, grifo nosso).
A solução da questão proposta neste artigo pelas regras do concurso material de infrações é
razoável, tal como no Direito Penal, e proporcional, já que a reprimenda pela prática de atos contra
a ordem econômica e ainda contra o patrimônio público deve ser maior do que pela prática isolada
de uma delas.
Indo além do paralelismo com o Direito Penal, o Supremo Tribunal Federal possui julgados
que corroboram o entendimento de que a acumulação de penalidades administrativas seria possível,
seja pela prática de uma única ou mais de condutas ilícitas. Nesse sentido, no MS 35.435/DF, a
decisão do STF registrou que “diferente do que ocorre no regime do Sistema Brasileiro de Defesa da
Concorrência, ca claro que as condutas passíveis de punição pela Lei Anticorrupção também podem
congurar, além de crimes, outras infrações administrativas e também com repercussões judiciais”
(BRASIL, 2021, p. 18, grifo nosso). Com base nessa decisão, o STF, tacitamente, também entendeu que
as diversas instituições que atuam no combate a corrupção não têm suas competências prejudicadas
pela atuação pretérita de outro, desde que não ainda restem condutas a serem avaliadas
14
. A
conclusão principal foi de que não é possível a dupla penalização administrativa no microssistema
anticorrupção quando não for evidente que valores jurídicos diversos foram atingidos
15
, o que reforça
a tese de que o acúmulo de penas do Cade e da CGU no caso de fraude à licitação mediante formação
de cartel seria lícita.
O mesmo tribunal, no âmbito do MS 38007 MC / DF, apreciou pedido de empresa apenada
administrativamente de forma acumulativa; a empresa “armou que na dosimetria da sanção
aplicada pelo Tribunal de Contas da União deve[riam ter sido] consideradas as penas impostas por
outros órgãos de controle, sobretudo a Controladoria-Geral da União” (BRASIL, 2021, p. 2). Em decisão
liminar relativamente a esse pedido, o STF entendeu que o argumento em questão não afasta a
presunção de legalidade da punição vigente.
Embora essas decisões citadas do STF não se reram especicamente a acumulação de
penalidades aplicadas pela CGU e pelo Cade em situação de fraude à licitação decorrente de atuação
de cartel, devem ser consideradas, por raciocínio a contrário senso, referência importante que
conrma a ideia central de que as penas devem ser somadas na hipótese discutida pelo artigo.
14 O caso concreto é diferente do problema proposto neste artigo, mas o raciocínio nessa decisão é válido: “Em decisão
formalizada, em 13.4.2018, no MS 35.435 [...] busquei deixar claro que: “se os acordos de leniência não contemplarem em sua
totalidade a reparação do dano causado ao erário, é possível ao TCU julgar as contas daqueles que deram causa à perda,
extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público” (BRASIL, 2021, p. 34, grifo nosso). Ainda assim,
curiosamente, essa decisão do STF impediu a aplicação da penalidade cominada pelo TCU: “tendo o TCU outros mecanismos
aptos a atingir tais nalidades, não é razoável que aplique penalidade que inviabilize o cumprimento dos acordos rmados
por outros entes” (BRASIL, 2021, p. 34, grifo nosso).
15 “[...] há inegável sobreposição fática entre os ilícitos admitidos pelas colaboradoras perante a CGU/AGU e o objeto
de apuração do controle externo. Se tal sobreposição fática não for considerada de forma harmônica, sobreleva-se o risco de
determinada empresa ser apenada duas ou mais vezes pelo mesmo fato, a despeito de não ser evidente a pluralidade de bens
jurídicos tutelados pelas distintas esferas de responsabilização” (BRASIL, 2021, p. 46).
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XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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6. CONCLUSÃO
Existem diversos limites constitucionais e legais para a atividade punitiva do Estado,
tais como os princípios da legalidade, anterioridade, tipicidade, ampla defesa e contraditório,
proporcionalidade, razoabilidade, non bis in idem etc.
Contudo, não existe qualquer norma constitucional ou legal que proíba o Poder Legislativo
especicamente de prescrever a acumulação de sanções administrativas ou de sanções administrativas
com sanções de outras naturezas, como as criminais e civis; ainda assim, o Poder Legislativo deve
desempenhar sua função de estabelecer as sanções de forma proporcional e razoável com os valores
sociais ofendidos
16
. Dito isto, é absolutamente normal em um Estado de Direito a previsão legal de
acumulação de penalidades tanto para uma mesma conduta como para múltiplas condutas, sendo
que teoricamente na primeira hipótese a justicativa é a necessidade de maior rigor no combate a
prática indesejada e, na segunda hipótese, a dupla punição decorre da prática de duas condutas
infracionais que atingem valores sociais diversos, não sendo razoável, proporcional e isonômico que
aquele que pratica somente uma delas seja punido da mesma forma que quem praticou as duas.
No momento da aplicação das penalidades legalmente cominadas, também cabe observar os
limites retro mencionados. A aplicação das penalidades no Brasil, relativamente a fraude à licitação
mediante formação de cartel é complexo, pois existem diversos órgãos competentes para processar
e julgar as diversas condutas tipicadas como infração. Exigir que haja apenas uma única autoridade
pública competente para julgar todas as práticas infracionais possíveis, mesmo se fossem apenas
as administrativas, seria inviável dada a necessidade de especialização dos órgãos públicos. Se, por
um lado, é plenamente possível do ponto de vista jurídico que o Cade e a CGU atuem reprimindo
infrações dentro de um mesmo contexto fático, formado por diversas condutas antijurídicas, deve-se
reconhecer certa diculdade na unicação razoável e proporcional das penalidades, mas se trata de
obrigação prevista na LINDB, conforme já mencionado.
Retomando especicamente os limites punitivos discutidos neste trabalho, uma análise
afoita da Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e da Lei Anticorrupção poderia concluir
que pessoas jurídicas que praticam fraude em uma única e especíca licitação mediante formação
de cartel não poderiam ser punidas cumulativamente com as penalidades xadas por essas leis; por
exemplo, não poderia haver a aplicação de duas multas ou duas declarações de inidoneidade, uma
pelo Cade e a outra pela CGU. Assim, aqueles que defendem a existência de excesso punitivo do
Estado na fraude em licitação mediante cartelização, como Vianna e Souza (2022), costumeiramente
retratam a acumulação de sanções administrativas como infringente ao princípio ne bis in idem
no momento da aplicação da norma jurídica ou alegam genericamente que a penalização seria
desproporcional e desarrazoada
17
.
De fato, o princípio ne bis in idem é um dos muitos mecanismos de contenção do abuso da
pretensão punitiva do Estado. Mas, conforme retro discutido, não há bis in idem quando se pune
16 Nesse sentido, Mello (2007, p. 212) defende que: “[...] o princípio do non bis in idem, por outro lado, não veda ao
legislador a possibilidade de atribuir mais de uma sanção administrativa a uma mesma conduta. Foi armado acima que a
sanção que atende ao princípio da proporcionalidade é a prevista no ordenamento jurídico: o legislador, observadas as normas
constitucionais, dene as medidas sancionadoras adequadas e proporcionais para cada situação de fato. Se estabelece a lei
formal múltiplas sanções para uma mesma conduta, são elas as sanções adequadas e proporcionais, não sendo sua aplicação
ofensiva ao princípio do non bis in idem.”
17 Sobre a acumulação de sanções oriundas do microssistema anticorrupção brasileiro, Vianna e Souza (2022, p. 868)
defendem que a acumulação de sanções “não é, necessariamente, a aplicação do Direito que melhor atende à nalidade do
Direito Sancionador. A defesa de tal entendimento teria que se sustentar apenas sob o aspecto retributivo de tais penas,
deixando de lado os objetivos de reabilitação, atingimento da política pública e mesmo de dissuasão geral.
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XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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uma pessoa jurídica pela associação criminosa na forma de cartel seguida pela prática de fraude
em licitação, já que não há nessa situação identidade de fundamento fático e legal
18
, embora haja
identidade de sujeitos. Se o fundamento jurídico para a punição (tipo infracional e sanção) de uma
única conduta é outro, como no presente estudo em que existe mais de uma conduta enquadrável
em dois tipos diferentes, não há bis in idem e sim concurso de infrações (houve realmente mais
de uma infração). Então, o princípio non bis in idem somente proíbe a repetição punitiva se seu
fundamento for exatamente o mesmo que justicou a primeira punição, aqui entendida a situação
em o agente realmente praticou uma conduta enquadrável em uma única tipicação
19
. Por tudo
isso, dentro de um contexto jurídico em que se admite a pluralidade de sanções para uma mesma
conduta, inclusive o concurso de infrações, o argumento do ne bis in idem é restringido, não se
aplicando a essas situações absolutamente normais de múltipla penalização legalmente previstas
retratadas exaustivamente neste trabalho, em especial quando duas infrões diferentes como no
caso da fraude mediante formação de cartel.
Discussão igualmente relevante é sobre a importância dos princípios da desarrazoabilidade
e da desproporcionalidade no momento da xação das sanções administrativas, cíveis e judiciais
para as infrações de formação de cartel e fraude à licitação; a aplicação cumulativa exige a avaliação
dessas sanções não apenas isoladamente consideradas, mas também o impacto do conjunto das
medidas à pessoa jurídica. Isoladamente, não dúvidas de que quem pratica duas infrões
diversas deve ser punido mais duramente do que aquele que praticou apenas uma dessas mesmas
condutas infracionais
20
, o que reforça a presunção de constitucionalidade da Lei do Sistema Brasileiro
de Defesa da Concorrência e da Lei Anticorrupção.
Quando da avaliação da proporcionalidade e razoabilidade do conjunto das sanções, é, nesse
momento, que as alegações de Vianna e Souza (2022, p. 867) se tornam referências importantes: “Além
dos efeitos retributivo e dissuasório especíco, a aplicação de penas administrativas visa a corrigir
e coibir os comportamentos considerados reprováveis e, assim, criar uma estrutura de incentivos
para que os administrados atuem de acordo com a forma desejada pelo Estado.” Nesse sentido,
Vianna e Souza (2022) entendem que, às vezes, o ente privado é punido “de forma tão gravosa que
atinge o ponto de impedir sua correção de rumo e retorno à atividade tutelada pelo Estado (na
maioria das vezes, econômica).Realmente, as pessoas jurídicas são apenas uma cção, mas que
geram produtos, serviços, empregos e tributos para a sociedade; talvez a melhor decisão em termos
de política legislativa não seja punir severamente as empresas e sim aqueles que atuaram em seu
nome, permitindo mais facilmente a reabilitação da empresa para continuidade de suas atividades
lícitas. Concretamente, a múltipla punição por autoridades públicas diferentes
21
tem alto potencial de
18 Mello (2007, p. 210-211) entende que a regra do non bis in idem é uma orientação dirigida para a Administração
Pública; esse princípio estabelece que a sanção prevista na norma descumprida somente pode incidir uma única vez para
cada conduta delituosa efetivamente praticada. Inclusive, por isso, o princípio ne bis in idem é desdobramento do princípio
da legalidade e da regra da tipicidade.
19 Tacitamente a Súmula n. 19 do Supremo Tribunal Federal contém esse raciocínio, pois a identidade de processos
(litispendência e coisa julgada) exige igualdade de partes (Estado e acusado), a mesma causa de pedir (fundamento jurídico
e fático para a punição) e o mesmo pedido (enquadramento da conduta em determinado tipo e sanção): “Súmula 19/STF -
Servidor público. Processo administrativo disciplinar. É inadmissível segunda punição de servidor público, baseada no mesmo
processo em que se fundou a primeira” (BRASIL, 1963).
20 A penalidade a ser aplicada a quem pratica concurso de infrações, seja formal ou material, não pode jamais ser
a mesma aplicável a quem comete apenas uma delas, pois do contrário os princípios da proporcionalidade e razoabilidade
estariam sendo completamente desrespeitados.
21 Ao deixar de comutar a sanção imposta pelo conjunto de órgãos sancionadores poder-se-ia estar desrespeitando os
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
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XAVIER, Vítor. Processo de responsabilização de pessoas jurídicas: a acumulação das penalidades
previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
hipótese de fraude em licitação e contratos públicos praticada por empresas associadas na
forma de cartel. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 149-168, 2023.
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acarretar abuso do poder punitivo do Estado, notadamente quando a soma das punições ultrapassa
os limites máximos de declaração de inidoneidade e da multa previstos em lei, o que não seria
admissível, ou ainda quando o conjunto das penalidades se revela evidentemente acima daquilo que
a pessoa jurídica poderia suportar. Por essa razão, faz sentido a discussão do excesso de punição
tanto na academia, no Poder Judiciário e na política para se avaliar se realmente a legislação e
a aplicação das penalidades realmente está adequada à Constituição da República
22
, ao § 3º do
artigo 22 da LINDB e aos anseios sociais, competindo primacialmente ao Poder Legislativo realizar a
mudança caso seja essa necessária.
Nesse sentido, a falta de um regramento especíco para a exasperação da pena, em qualquer
hipótese de concurso de infrações administrativas, é merecedora de críticas. É no momento da
unicação das penas, qualquer que seja a natureza delas, que seria viável avaliar a aplicação do
conjunto de sanções a uma determinada conduta sob o prisma da proporcionalidade e razoabilidade
23
.
A solução do problema em discussão, considerando a omissão do Poder Legislativo, perpassa
notadamente pela cooperação entre os entes públicos responsáveis pela atividade punitiva, no caso
concreto a CGU e o Cade, a m de serem estabelecidos critérios para afastar o abuso da pretensão
punitiva em sede administrativa
24
. Embora a aplicação das sanções decorra do estatuído pelo Poder
Legislativo, a quem compete estabelecer quais valores sociais serão tutelados e quais sanções
serão aplicáveis na hipótese de ofensa aos mesmos, é admitido que o aplicador da norma jurídica
sopese as sanções a partir dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, em um momento
especíco de unicação das penas administrativas que precisa estar previsto normativamente,
mesmo que em uma portaria conjunta que estabeleça objetivamente os limites legais do razoável e
proporcional para persecução da nalidade da Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e
da Lei Anticorrupção.
Dito tudo isso, é preciso reconhecer a legitimidade do movimento garantista no Direito
brasileiro preocupado em limitar o abuso do exercício do poder-dever do Estado de punir os
infratores. Deve haver uma preocupação com a punição excessiva, mas não parece ser em regra o caso
das empresas que formam um cartel para fraudar licitações e contratos públicos. Não há identidade
de nalidade das atividades sancionatórias da CGU e do Cade e as infrações tipicadas cometidas
sequer são as mesmas, ofendendo valores sociais completamente diversos, tratando-se na verdade
de situação de concurso material de infrações, cuja solução doutrinária, na ausência de regra legal
especíca, é a acumulação das penalidades, solução é plenamente coerente com os princípios da
razoabilidade, proporcionalidade e isonomia estabelecidos pelo Direito, já que não é justo que
aquele que praticou duas infrações acumuladas seja punido igualmente como aquele que praticou
somente uma. Por isso, enquanto não forem promovidas alterações legislativas, as empresas que
integrem cartéis e fraudem licitações irão atrair as sanções da Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da
Concorrência e da Lei Anticorrupção, havendo concurso material de infrações administrativas regido
22 O Poder Judiciário pode reconhecer o excesso de punição prevista pelo Poder Legislativo, declarando a
inconstitucionalidade da lei com base nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, mas isso tende a ser feito em
casos concretos isolados pelo controle de constitucionalidade difuso.
23 Há outras vantagens na unicação das penas, uma delas é conhecer a existência de acordos de leniência que podem
em tese abonar certas infrações.
24 A necessidade de cooperação é, de fato, mais ampla do que estabelecer regras para a unicação das penalidades. A
atuação coordenada das instituições públicas garantidoras do microssistema anticorrupção é imprescindível para se alcançar
a nalidade legal de combater a corrupção e, ao mesmo tempo, manter a segurança jurídica na sociedade. O CADE e a CGU
possuem normativos prevendo a cooperação, tais como Portaria Normativa Cade nº 21/2022; ACT Cade-MPF nº 1/2020 e Acordo
de Cooperação nº 02/2014, mas nenhum deles estabelece procedimento para unicação das penalidades.
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previstas na Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e na Lei Anticorrupção na
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pela soma das penas, sejam essas as restrições ao direito de licitar, as publicações extraordinárias
ou as multas.
Contudo, no momento da aplicação, as penalidades cominadas devem ser sopesadas pelos
princípios da razoabilidade e proporcionalidade, por força do § 3º do artigo 22 da LINDB. Na hipótese
em que o conjunto das penas evidenciar um ônus que impeça a correção de rumo da pessoa jurídica
para a atividade lícita de gerar produtos, serviços, empregos e tributos para a sociedade, a nalidade
da lei estaria sendo descumprida e seria possível limitar as consequências com base nos princípios
da proporcionalidade e razoabilidade reconhecidos tacitamente no § 3º do artigo 22 da LINDB.
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