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FRAGA, Vivian; ZENKNER, Marcelo; MICHELI, Marco. Responsabilização 360°: desdobramentos de
um movimento responsivo dissuasório estimulado pela autoridade de defesa da concorrência.
Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 11, n. 1, p. 169-185, 2023.
https://doi.org/10.52896/rdc.v11i1.1035
4. A RESPONSABILIZAÇÃO HOLÍSTICA 360°: PRECEDENTES DO TRIBUNAL
ADMINISTRATIVO DO CADE
A reparação por eventuais danos advindos do conluio em processos licitatórios tem
se mostrado especialmente relevante tanto na seara privada quanto na tutela dos direitos da
coletividade; esta última, que, anal, trata-se do bem jurídico maior protegido pela normativa da
defesa da concorrência, consoante o parágrafo único do art. 1º da lei 12.529/2011.
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A título de elucidar essa prática, veja-se que, no âmbito do Processo Administrativo
n.º 08012.009732/2008-01, julgado na 166ª Sessão Ordinária de Julgamento, e que apurava cartel
em licitações municipais para aquisição de unidades móveis de saúde e equipamentos médicos
hospitalares realizados com recursos provenientes de convênios com o Ministério da Saúde entre
2000 e 2005, a decisão do colegiado decidiu pela “a expedição de ofício com cópia da decisão desse
Tribunal Administrativo ao Ministério Público Federal em Resende, Rio de Janeiro (MPF-RJ), para
ciência e eventual propositura de ação para ressarcimento de danos à coletividade (art. 1º, inciso V,
da Lei nº 7.347/1985)” (BRASIL, 2020). No voto da Relatora – ex-Conselheira Paula Azevedo – pugnou-
se, ainda, pela ampla divulgação da decisão, com “remessa a potenciais interessados e às Prefeituras
e/ou Organizações Sociais afetadas pela conduta anticompetitiva, para que, querendo, exerçam o
direito de reparação a que, eventualmente, tenham direito” (BRASIL, 2020).
Nesse mesmo diapasão, recente decisão
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do Tribunal do Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade), que condenou empresas a multas de aproximadamente R$ 800 milhões, consolida
um movimento institucional da autoridade em promover uma responsabilização jurídica holística
de infratores. Condenadas por infração concorrencial da Lei nº 12.529/2011 ao agirem consórcio em
licitação pública para contratação de serviços de conectividade para Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos (Correios), o Tribunal encaminhou cópia da sua condenação aos Correios para que tomasse
ciência e adotasse as providências cabíveis. A autoridade também determinou ampla divulgação da
decisão, em jornais de grande circulação, e sua remessa a potenciais interessados para que possam
exercerem o direito de reparação a que, eventualmente, tenham direito (BRASIL, 2022a).
Na 194ª. Sessão Ordinária de Julgamento do Cade, em item da pauta
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em que se discutia
7 Art. 1º Esta Lei estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência - SBDC e dispõe sobre a prevenção e a
repressão às infrações contra a ordem econômica, orientada pelos ditames constitucionais de liberdade de iniciativa, livre
concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico. Parágrafo
único. A coletividade é a titular dos bens jurídicos protegidos por esta Lei. (BRASIL, 2011, grifo nosso).
8 Decisão: “O plenário, por unanimidade, condenou as representadas Claro, OI e Telefônica, e por maioria, determinou
a aplicação de multa no valor de R$ 395.228.792,70 para Claro S.A., aplicação de multa de R$ 266.115.266,00 para a represen-
tada Oi Móvel S.A.; e aplicação de multa de R$ 121.721.935,70 para a representada Telefônica; o valor integral da multa deverá
ser recolhido no prazo de 30 dias a contar da publicação da decisão plenária, sob pena de multa no valor de R$ 100.000,00
(cem mil reais) por dia de atraso, nos termos do voto da Conselheira Relatora. Vencidos o Presidente do Cade, o Conselheiro
Luiz Hoffman e o Conselheiro Gustavo Augusto. O plenário, por unanimidade, determinou a expedição de ofício com cópia da
decisão à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos para que tome ciência e adote as providências que julgar cabíveis, nos
termos do voto da Conselheira Relatora.” (BRASIL, 2022a).
9 Decisão: “O Plenário, por unanimidade, determinou a condenação em relação aos Representados com aplicação
das respectivas multas: Alimentare Serviços de Restaurante e Lanchonete Ltda. – multa de R$ 35.171,60; Ventana Manutenção
e Serviços Ltda. – multa de R$ 2.780.203,30, Confraria André Ltda. – multa de R$ 84.592,82; Boa Viagem Cafeteria Ltda. – multa
de R$ 616.054,12; Delícias da Vovó Ltda. – multa de R$ 286.525,15; Vitor Hugo dos Santos – multa de R$ 7.034,32; César Giacomini
Evangelista Kinaki – multa de R$ 16.918,56; Gustavo Locks de Pauli – multa de R$ 57.305,03; e Jean Diego Brunetta – multa de
R$ 50.000,00; determinou, ainda, o arquivamento do processo em relação ao Representado Fabiano Luis Gusso, considerando
seu falecimento, no termos do voto do Conselheiro Relator. O Plenário, por maioria, determinou a condenação em relação aos
Representados com aplicação das respectivas multas: Christian dos Santos Marques Motta – multa de R$ 417.030,50; e Juliana
Osório Saul – multa de R$ 417.030,50, nos termos do voto do Conselheiro Gustavo Augusto. Vencidos o Conselheiro Relator e o
Conselheiro Luis Braido. O Plenário, por maioria, determinou o arquivamento do processo em relação ao Representado Hugo
Evangelista Kinaki, nos termos do voto do Conselheiro Gustavo Augusto. O Presidente do Cade fez uso do voto de qualidade,