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DOMINGUES, Juliana Oliveira; SOLLA, Kaira Regiani. Sistema Financeiro Aberto e a competência
do Cade. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 12, n. 2, p. 104-122, 2024.
https://doi.org/10.52896/rdc.v12i2.1137
No caso brasileiro, trata-se de regulação induzida por autoridade reguladora do SFN
19
, em
que se pode observar, como características principais, i) a associação com o objetivo de promoção da
concorrência por meio da quebra do monopólio informacional, com participação ativa da autoridade
reguladora; ii) o projeto é iniciado e conduzido pela autoridade reguladora de modo abrangente, com
a edição de atos normativos, imposição de padrões de infraestrutura, criação de um mecanismo de
governança, entre outros; e iii) tendência à imposição obrigatória a pelo menos um grupo específico
de instituições, visando conferir maior eficiência à estratégia de quebra do monopólio informacional
(Ragazzo; Tolentino; Cataldo, 2022, p. 15).
Já em países como China e Singapura, de modo diverso, a implementação do modelo de
Open Banking foi uma iniciativa organicamente impulsionada pelas próprias instituições privadas
(Guimarães, 2021, p. 129). Sendo assim, não existe um padrão comum dos modelos, uma vez que cada
jurisdição possui características distintas em seus desenhos regulatórios e sistemas financeiros.
Para a concretização das diretrizes contidas na AgendaBC#, o Banco Central buscou uma
abordagem regulatória mais flexível, interativa, propositiva, tanto para fomento das inovações
tecnológicas no setor, quanto – e principalmente – para promover a competitividade entre os agentes
econômicos, com a participação mais intensa de novos modelos de negócios e aumento da inclusão
financeira a partir da facilidade de acesso ao mercado (Rangel, 2021, p. 93). Tanto é que, desde o
início do processo de regulação, o Banco Central possibilitou ampla participação dos regulados na
criação das normas regulatórias
20
que, na prática, atribuíram às instituições participantes, a partir de
trabalho conjunto, a responsabilidade de definir e desenvolver o padrão tecnológico, de segurança e
a implementação das interfaces para operação do sistema a fim de possibilitar o compartilhamento
de dados e serviços.
Em contrapartida, a autoridade reguladora preestabeleceu requisitos mínimos relacionados a
esse desenvolvimento, além de uma série de regras direcionadas à conduta dos agentes participantes,
ao escopo dos dados objeto de compartilhamento e para a obtenção do consentimento dos usuários.
Ainda, o Banco Central tem como funções atuar na coordenação da autorregulação inicial, atestar
a conformidade das normas instituídas pelos participantes e das decisões tomadas pelo órgão de
governança previsto na Circular BC nº 4.032/2020
21
, bem como vetar, impor restrições ou regular
aspectos não convencionados.
19 Em apertada síntese, o Sistema Financeiro Nacional é composto por: (i) Conselho Monetário Nacional (CMN), órgão
normativo responsável pela formulação da política da moeda e do crédito, metas de inflação, diretrizes de câmbio, normas
principais de funcionamento das instituições financeiras, dentre outras atribuições; (ii) Comissão de Valores Mobiliários
(CVM), que tem suas atribuições previstas na Lei 6.385/1976, com objetivo de fiscalizar, normatizar, disciplinar e desenvolver
o mercado de valores mobiliários no Brasil (Sobre [...], 2024); e (iii) Banco Central do Brasil (BC), a quem compete garantir o
cumprimento das normas do CMN, monitorar e fiscalizar o Sistema Financeiro e executar as políticas monetária, cambial e
de crédito (Sistema [...], [2024]). No Brasil, o Open Banking, posteriormente ampliado para Open Finance¸ foi implementado a
partir de esforço regulatório capitaneado pelo BC (Ragazzo; Lima, 2022, p. 375).
20 A proposta inicial do Open Banking foi concretizada por meio da publicação do Comunicado nº 35.455, de 24
de abril de 2019 do BC, fixando os objetivos de aumento da eficiência no setor, por meio da promoção de ambiente mais
inclusivo e competitivo, garantido a segurança do Sistema Financeiro e a proteção dos consumidores. Já neste momento, foram
abordados contornos iniciais da estrutura de governança do processo de implementação, a ser constituída pelos próprios
participantes do Sistema Financeiro Aberto. Em novembro de 2019, o Banco Central publicou Edital de Consulta Pública nº
73/2019, oportunizando a participação de interessados até 31 de janeiro de 2020 (BC, 2019).
21 A Circular BC nº 4.032/2020, publicada em 23 de junho de 2020 – ainda no momento inicial de desenvolvimento da
estrutura inicial de implementação do modelo –, determina as responsabilidades e critérios da governança desta estrutura
inicial, constituída por três níveis: estratégico, administrativo e técnico. No nível estratégico, está o Conselho Deliberativo,
responsável pelas decisões de governança, formado por seis conselheiros indicados por associações representativas dos
participantes do Open Finance, mais um conselheiro independente. Logo, a instância decisória inicial não é formada por
representantes diretos das instituições financeiras reguladas.