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FIGUEIREDO, Natália de Lima; PASQUALETO, Olívia de Quintana Figueiredo. O direito do trabalho
em fuga e os novos desafios do Direito Antitruste na proteção de motoristas de aplicativos.
Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 13, n. 1, p. 161-193, 2025.
https://doi.org/10.52896/rdc.v13i1.1397
No Brasil, e mais especificamente no direito do trabalho brasileiro, os reflexos dos ideais
neoliberais foram sensíveis, sobretudo após a redemocratização, a partir da década de 1990, com
a implementação de diretrizes do Consenso de Washington. Sob a justificativa de proporcionar
estabilidade macroeconômica, crescimento e controle da inflação, no governo de Fernando
Henrique Cardoso, o Brasil (assim como muitos países da América Latina) implementou reformas
diversas entendidas como condição necessária para aumento da produtividade brasileira, dentre
elas, reformas trabalhistas com vistas a uma suposta modernização – baseada na flexibilização –
da legislação do trabalho (Freitas, 2004). São exemplos a valorização da negociação e do contrato
em detrimento da lei, as medidas de flexibilização da jornada de trabalho, o enfraquecimento da
fiscalização trabalhista, o estímulo a contratos de trabalho temporários e precários, dentre outras no
âmbito salarial e sindical (Galvão, 2003).
Além das reformas trabalhistas do período 1990-2000, tido como “década neoliberal” (Alves,
2002), o Brasil seguiu realizando outras reformas. O próprio governo Lula – o governo de um partido
dos trabalhadores – foi marcado por contradições a esse respeito: se, por um lado, teve como
promessas a valorização do salário mínimo, a redução da jornada de trabalho e o redesenho do
sistema sindical brasileiro (Krein; Santos; Nunes, 2012); por outro lado, também adotou políticas
flexibilizadoras, a exemplo do estímulo a contratações temporárias em programa de primeiro
emprego, a lei do Simples que flexibiliza regras do trabalho para micro e pequenas, dentre outras.
Contudo, a próxima grande e sistemática reforma trabalhista que seria enfrentada pelo Brasil se deu
com a Lei nº 13.467/2017 (Krein, 2018).
Aprovada muito rapidamente pelo Congresso Nacional, a Lei nº 13.467/2017 promoveu
alterações profundas no direito do trabalho brasileiro, autorizando expressamente a prevalência
do negociado sobre a lei, ampliando as possibilidades de flexibilização da jornada de trabalho,
tornando o imposto sindical (obrigatório até então) facultativo, criando limitações no acesso à Justiça,
permitindo a terceirização da atividade-fim das empresas, criando flexibilizações diversas no contrato
de trabalho, dentre outras. Assim como as anteriores, a reforma de 2017 também foi pautada pela
suposta necessidade de modernização da legislação do trabalho e busca pela criação de empregos.
Muitas das alterações trazidas foram controversas e geraram dúvidas quanto a sua constitucionalidade,
o que levou diferentes ações constitucionais a julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, que validou
grande parte das novidades trazidas pela Lei nº 13.467/2017 (Dutra; Machado, 2021).
A reforma de 2017 foi seguida por um período turbulento, com outras alterações também
flexibilizadoras do direito do trabalho. Destacam-se, nesse cenário, as diversas Medidas Provisórias
(MP) e Leis dedicadas ao período da pandemia de Covid-19, a exemplo da MP nº 927 e da Lei nº
14.020/2020, que autorizaram negociações individuais, o diferimento do pagamento do Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), a paralisação de ações fiscalizatórias, ampliação da jornada de
trabalho, redução do salário, dentre outras. Posteriormente à pandemia, houve também alterações,
ainda que mais pontuais, a exemplo da MP nº 1.116/2022, que visava flexibilizar as regras do contrato
de aprendizagem, e da Lei nº 14.647/2023, que afastou a caracterização do vínculo empregatício entre
cooperados e cooperativas e entre profissionais religiosos e entidades religiosas.
Em que pese o período de intensas mudanças legislativas, deixou-se de regular aspectos
importantes e categorias crescentes no mercado de trabalho brasileiro, com destaque para o
trabalho na gig economy, que foi rapidamente ampliado no país (Góes et al., 2023) e se espalhou