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FRAGA, Fellipe Vilas Bôas; VITA, Jonathan Barros; OLIVEIRA, Bruno Bastos de. Regulação,
desenvolvimento e concorrência: Análise das cláusulas de exclusividade nos contratos entre
empresas e plataformas digitais. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 10, n. 1, p. 140-
158, 2022. https://doi.org/10.52896/rdc.v10i1.993
A pandemia ocasionada pela disseminação do novo coronavírus (COVID-19) promoveu uma
série de restrições. O próprio conceito e entendimento de car em casa e respeitar a quarentena
para contribuir com o achatamento da curva de disseminação da COVID-19 já importa em restrições
quanto a locomoção por grandes distâncias (FRAGA; OLIVEIRA; ROSSIGNOLI, 2020, p. 281). Assim,
muitos segmentos do mercado sofreram modicações, algumas dessas modicações apresentado até
mesmo um signicativo crescimento nas atividades, como os casos de entrega domiciliar de comida
(delivery) adquiridas mediante acesso aos fornecedores por meio de aplicativos das plataformas
digitais.
Segundo a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes, o serviço de delivery passou de
um diferencial para uma necessidade do mercado, tendo sido o Brasil destaque no segmento na
América Latina, responsável, sozinho, por quase metade do mercado, chegando a 48,77%, apontando
as previsões que o setor poderá movimentar aproximadamente US$ 6,3 trilhões de dólares em todo
o mundo até o nal do ano de 2021 (MERCADO DE DELIVERY, 2021).
Nesse mercado dinâmico e competitivo, a disputa acabou no âmbito do Cade, tendo a
Rappi (RAPPI, 2021) entrado com representação contra a iFood (IFOOD, 2021), sob a alegação de
que a empresa líder no mercado brasileiro de serviços de delivery estaria rmando acordos de
exclusividade com restaurantes, exigindo não só altas multas em caso de quebra contratual, como
também contratos a longo prazo, a m de excluir concorrentes do jogo, que passariam a não ter
acesso a esses restaurantes (AGRA, 2020).
A base da imposição de tais medidas foi a Nota Técnica nº 4/2021/CGA1/SG/CADE, no
Procedimento Preparatório de Inquérito Administrativo nº 08700.004588/2020-47 (BRASIL, 2021),
levando-se em conta, em síntese, denúncia de infração contra a ordem econômica materializada por
cláusula de exclusividade, tendo como efeitos alegados o fechamento de mercado e o aumento de
barreiras à entrada, com recomendação de deferimento consoante o artigo 84, caput e § 1º da Lei nº
12.529/2011 (BRASIL, 2011)12 e artigo 211 (atualmente artigo 212) do Regimento Interno do Cade (BRASIL,
2019b)13.
Do relatório observa-se que a representação protocolada em 25 de setembro de 2020, pela
Rappi em desfavor da iFood argumenta o cometimento das infrações descritas no artigo 36, caput, I e
§3, III, IV e V da Lei nº 12.529/2011 (BRASIL, 2011) no mercado online de comida, alegando que a iFood
se valeria da condição de dominante no mercado de pedidos online de comida para adotar práticas
verticalmente restritivas, por meio da celebração massiva de contratos de exclusividade junto a
restaurantes parceiros e, com essa estratégia, criaria um forte incentivo à adesão dos restaurantes a
esse modelo de negócio mais restritivo (BRASIL, 2021).
12 Art. 84. Em qualquer fase do inquérito administrativo para apuração de infrações ou do processo administrativo
para imposição de sanções por infrações à ordem econômica, poderá o Conselheiro-Relator ou o Superintendente-Geral, por
iniciativa própria ou mediante provocação do Procurador-Chefe do Cade, adotar medida preventiva, quando houver indício
ou fundado receio de que o representado, direta ou indiretamente, cause ou possa causar ao mercado lesão irreparável ou
de difícil reparação, ou torne inecaz o resultado nal do processo. § 1º Na medida preventiva, determinar-se-á a imediata
cessação da prática e será ordenada, quando materialmente possível, a reversão à situação anterior, xando multa diária nos
termos do art. 39 desta Lei. (BRASIL, 2011).
13 Art. 212. Em qualquer fase do inquérito administrativo para apuração de infrações ou do processo administrativo
para imposição de sanções por infrações à ordem econômica, poderá o Conselheiro-Relator ou o Superintendente-Geral, por
iniciativa própria ou mediante provocação do Procurador-Chefe do Cade ou de legítimo interessado, adotar medida preventiva,
quando houver indício ou fundado receio de que o representado, direta ou indiretamente, cause ou possa causar ao mercado
lesão irreparável ou de difícil reparação, ou que torne inecaz o resultado nal do processo. (BRASIL, 2019).