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FERNANDES, Micaela. As respostas punitiva e reparatória previstas na Lei de Defesa da
Concorrência Brasileira ao ato ilícito concorrencial. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília,
v. 10, n. 2, p. 64-80, 2022
https://doi.org/10.5286/rdc.v10i2.981
ou implícito entre concorrentes (seja para a divisão ou o controle do lado da oferta de produtos ou
serviços, por exemplo, via combinação no preço de venda, produção ou volume de comercialização,
seja pelo lado da demanda) e com capacidade de forte violação da livre concorrência, a infração
gera, além de punição na seara administrativa, também na criminal, posto que a conduta se congura
crime em nosso ordenamento, conforme previsto no artigo 4º, II, da Lei 8.137/90, sujeita à pena de
reclusão de 2 a 5 anos.
Se o acordo entre concorrentes se der no curso de processo licitatório para contratação pelos
órgãos integrantes da Administração Pública direta, autárquica e fundacional dos entes federativos,
a conduta será tipicada como crime de frustração do caráter competitivo da licitação, prevista no
artigo 337-F do Código Penal, introduzido pela nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos,
sujeita à pena de reclusão de 4 a 8 anos, e multa.
A apuração do ilícito criminal é feita pelo Ministério Público e autoridades policiais,
podendo o Cade solicitar o concurso de sua atuação desde a investigação em sede administrativa,
seja esta instaurada de ofício ou mediante representação fundamentada de qualquer interessado
(artigo 66, §8º, LDC). Independentemente da possível participação do Ministério Público desde a
fase de investigação administrativa, ele será sempre comunicado das decisões tomadas em sede
administrativa pelo Tribunal do Cade, para medidas no âmbito de suas atribuições (artigo 9º, §2º,
LDC), inclusive em sede criminal, que são várias18.
Embora no projeto de lei que resultou na redação nal da LDC e que alterou a Lei 8.137/90
houvesse a previsão expressa sobre a competência da Justiça Federal para apurar e julgar crimes
contra a ordem econômica, o dispositivo especíco foi vetado19, dando ensejo a alguma controvérsia
sobre o juízo competente, se comum ou federal, para julgamento de casos de crime contra a ordem
econômica.
Conforme entendimento rmado no STJ20, o julgamento do cartel compete, em regra, à Justiça
Estadual, o que não afasta a competência da Justiça Federal, desde que se verique hipótese de
ofensa a bens, serviços ou interesses da União, suas autarquias ou empresas públicas (artigo 109,
IV, CR), ou desde que, pela magnitude da atuação do grupo econômico ou pelo tipo de atividade
desenvolvida, o ilícito tenha a propensão de abranger vários Estados da Federação, prejudicar setor
econômico estratégico para a economia nacional ou o fornecimento de serviços essenciais”21.
Na seara criminal, diferentemente da administrativa, não há controvérsia quanto à necessária
análise da culpabilidade do agente, sempre presente, diante da impossibilidade de imputação de
responsabilidade objetiva em ação penal, porquanto vedada no ordenamento jurídico brasileiro.22
18 O Ministério Público atua em todas as esferas de responsabilização. Na seara administrativa, um membro do MP
Federal é designado para emitir parecer nos processos para imposição de sanções por infrações, nos termos do artigo 20 da
LDC. Na seara criminal, cabe ao Ministério Público a persecução dos crimes contra à ordem econômica. Finalmente, na seara
civil, o MP tem legitimidade para a promoção de ações civis públicas, inclusive com intuito reparatório.
19 O dispositivo vetado da LDC tinha a seguinte redação: “Art. 120. A Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, passa
a vigorar acrescida do seguinte art. 16-A: ‘Art. 16-A. Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes contra a ordem
econômica previstos no caput e nos arts. 5º e 6º desta Lei.’” Razão do veto: “O dispositivo faz referência aos arts. 5º e 6º da Lei
nº 8.137, de 1990, que, no entanto, estão sendo expressamente revogados pelo art. 127 do próprio projeto de lei.”
20 STJ. HC 117169, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 16.03.2009.
21 Ainda sobre o tema da competência, o MPF editou em 2014 a Orientação nº 09, corroborando a competência federal
quanto a crime de formação de carteis interestaduais e internacionais. Documento disponível em http://www.mpf.mp.br/
atuacao-tematica/ccr2/orientacoes/documentos/orientacao-no-9.
22 O STF recentemente rearmou a impossibilidade de responsabilização objetiva em sede criminal, em sede de agravo