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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
Concorrência, Brasília, v. 10, n. 2, p. 137-162, 2022.
https://doi.org/10.5286/rdc.v10i2.999
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BARBOSA, Vitor Jardim Machado; BONO, Luisa Marcelino. Avaliação de Impacto de Política de
defesa da concorrência: Programa de Leniência da Comissão Europeia (DG-COMP) e do Cade.
Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, v. 10, n. 2, p. 117-136, 2022.
https://doi.org/10.5286/rdc.v10i2.981
A ARBITRAGEM NO
CONTROLE DE ESTRUTURAS
COMO MECANISMO
DE REFORÇO AO
MONITORAMENTO DO CADE:
CABIMENTO E VINCULAÇÃO
DA AUTARQUIA12
Arbitration in the merger control as a mechanism to
reinforce CADE's monitoring: appropriateness and
federal independent agency binding
Mariana Hofmann Fuckner3
Universidade Federal do Paraná (UFPR) - Paraná/PR, Brasil
RESUMO ESTRUTURADO
Contextualização: Desde 2014, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) tem se
utilizado de procedimento denominado arbitragem como mecanismo de reforço ao monitoramento
do cumprimento das condições assumidas pelas compromissárias em acordos em controle de
concentrão para a aprovação da operação.
Objetivo: O presente estudo busca analisar as características dos procedimentos arbitrais
estabelecidos nos acordos em controle de concentração no âmbito do controle estrutural realizado
pelo Cade, principalmente quanto à previsão de não vinculação da autarquia às decisões proferidas
pelo árbitro.
Método: O trabalho parte da análise dos acordos em que a arbitragem foi inserida como método de
reforço do monitoramento para questionar a viabilidade de se optar pela inserção do procedimento
arbitral previsto pela Lei nº 9.307/96, confrontando o conteúdo desses acordos com o entendimento
doutrinário acerca da matéria.
Editor responsável: Prof. Dr. Luis Henrique Bertolino Braido, Fundação Getúlio Vargas (FGV/RJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6085-1446.
Recebido em: 25/05/2022 Aceito em: 12/06/2022 Publicado em: 14/12/2022
2 AgradeçooProf.Dr.EduardoTalamini,queorientouaminhainiciaçãocientícasobreotema,desenvolvidana
Universidade Federal do Paraná em 2019, a qual deu origem ao presente artigo. A toda evidência, as impropriedades ou
incorrões encontradas neste escrito são de responsabilidade exclusiva da Autora.
3 Graduada em Direito pela Universidade Federal do Paraná. Integrante do Grupo de Pesquisa em Direito Societário
Aplicado da UFPR (DSA-UFPR). Integrante da Comissão de Recuperação Judicial e Falência e da Comissão de Direito
Cooperativo da OAB/PR. Associada do Instituto Prof. Assis Gonçalves de Direito Empresarial e Cooperativo. Advogada no Assis
Gonçalves, Kloss Neto e Advogados Associados. Curitiba, Paraná. E-mail: marianahf@agkn.com.br; Lattes: http://lattes.cnpq.
br/5091369146228042. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7232-7614.
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
Concorrência, Brasília, v. 10, n. 2, p. 137-162, 2022.
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Conclusões: Os resultados apontam que a decisão acerca do cumprimento das condições assumidas
nos acordos deve ser tomada no exercício da atividade administrativa pelo Cade, com fulcro no poder
de polícia concorrencial indelegável que lhe foi concedido por Lei. A existência de incompatibilidades
entre o exercício da atividade administrativa e a natureza jurisdicional da arbitragem também
contribui para a inadequação da previsão da arbitragem da Lei nº. 9.307/96 como mecanismo de
reforço ao monitoramento exercido pelo Cade.
Palavras-Chave: Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Controle de estruturas. Acordo
em controle de concentração. Fiscalização. Arbitragem.
STRUCTURED ABSTRACT
Context: Since 2014, the Administrative Council for Economic Defense (CADE) has used a procedure
called arbitration as a mechanism to reinforce the monitoring of compliance with the conditions
assumed by the compromisers in concentration control agreements for the approval of the operation.
Objective: The paper aims to analyze the characteristics of the arbitration procedures established
in the concentration control agreements within the scope of the merger control carried out by
Administrative Council for Economic Defense (CADE), mainly regarding the provision of non-binding
of the federal independent agency to the decisions rendered by the arbitrator.
Method: The study starts from the analysis of the agreements in which arbitration was inserted as a
method of reinforce monitoring and questions the feasibility of opting for the insertion of the Federal
Law n. 9.307/96 arbitration procedure, comparing the content of these agreements with the doctrinal
understanding of the matter.
Conclusions: The results indicate that the decision on compliance with the conditions assumed in
the agreements must be taken in the exercise of administrative activity by CADE, based on the non-
delegable law enforcement. The existence of incompatibilities between the exercise of administrative
activity and the jurisdictional nature of arbitration also contributes to the inadequacy of the
arbitration provision as a mechanism to reinforce the monitoring exercised by CADE.
KeyWords: Administrative Council for Economic Defense (CADE). Merge control. Concentrations control
agreements. Supervision. Arbitration.
Sumário: 1. Introdução; 2. O controle de estruturas; 3. O acordo em contro-
le de concentração; 4. O monitoramento realizado pela autarquia; 5. A ar-
bitragem como mecanismo de reforço ao monitoramento; 6. A experiência
prática do Cade; 6.1. Caso ICL/Bromisa; 6.2. Caso ALL/Rumo; 6.3. Caso Dow/
Dupont; 6.4. Caso Tam/Iberia/British Airways; 6.5. Caso Cetip/Bovespa; 6.6.
Caso AT&T/Warner; 7. A previsão de arbitragem nos acordos em controle de
concentrão: exercício de poder decisório indelegável pelo Cade no âmbito
de um processo administrativo; 7.1. A indelegabilidade do poder decisório
pelo Cade; 7.2. A incompatibilidade entre a arbitragem da Lei nº. 9.307/96 e a
atividade administrativa; 8. Conclusões; 9. Referências.
1. INTRODUÇÃO
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
Concorrência, Brasília, v. 10, n. 2, p. 137-162, 2022.
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O Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade, na qualidade de autarquia
competente para decidir sobre as operações de concentração enquadradas nos critérios previstos
no art. 88 da Lei nº 12.529/11 (BRASIL, 2011), pode, em colaborão com as empresas interessadas,
celebrar acordos em controle de concentração, por meio dos quais são estabelecidas condicionantes
cujo cumprimento é essencial para a aprovação do ato de concentração.
Em razão das diculdades atinentes ao monitoramento da efetivação das condições
estabelecidas,oCadeencontrounaarbitragemummecanismodereforçoàscalizaçãodaautarquia
no que tange ao cumprimento (ou não) dos termos assumidos pelas compromissárias nos acordos
em controle de concentração.
Num primeiro momento (de 2014 a 2017), os três acordos em controle de concentração que
inauguraramachamadaarbitragemcomomecanismodescalizaçãodaefetivaçãodoscompromissos
previram um procedimento sem natureza de jurisdição, de caráter consultivo, como ato de apoio à
decisão do Cade.
A partir do caso Cetip/Bovespa, aprovado em 2017, a arbitragem ganhou efetivamente
os contornos da Lei nº. 9.307/96 (BRASIL, 1996), pois a decisão proferida pelo tribunal arbitral ou
pelo árbitro passou a ser irrecorrível e vinculante às partes, ao mesmo tempo em que se adotou o
modelo de arbitragem institucional. O cenário, então, passa a ser o de um procedimento de natureza
jurisdicional no escopo do exercício da atividade administrativa do Cade.
Não obstante a alteração das características do procedimento chamado de arbitral, fora
mantida a previsão, em todos os acordos analisados, de não vinculação da autarquia ao conteúdo da
decisão arbitral.
Contudo, como se verá, a decisão acerca da atuação discriminatória das compromissárias
em prejuízo de concorrentes, transferida para o tribunal arbitral por meio de cláusulas inseridas no
acordo que prevê como remédio comportamental a vedação de práticas anticompetitivas, decorre
do exercício da atividade administrativa que tem como origem o poder de polícia concorrencial
atribuído, por Lei, ao Cade – que não pode delegá-lo.
Sendo esse o cenário, aliado às incompatibilidades procedimentais existentes entre
arbitragem de natureza jurisdicional e a atividade administrativa, questiona-se se é cabível a previsão
do procedimento arbitral no âmbito dos acordos em controle de concentração, especialmente com
ascaracterísticasquelhesãoconferidaspelaLeinº.9.307/96(BRASIL,1996).Aonal,pretende-se
demonstrar que, como é do Cade a competência para decisão sobre o cumprimento dos termos
do acordo, não há que se falar em vinculação ou desvinculação da autarquia ao pronunciamento
arbitral, mas sim de exercício do poder decisório pelo próprio CADE, a quem incumbe, de forma
indelegável, a deliberão sobre o cumprimento ou não dos termos do acordo pelas empresas em
concentrão.
2. O CONTROLE DE ESTRUTURAS
Ocontroledeestruturasdene-secomoaatuaçãopreventivadoCadecomanalidadede
proteger o mercado e os consumidores dos abusos que podem decorrer do ato de concentração
realizado entre duas ou mais sociedades (HAJAR, 2018, p. 36).
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
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A completa compreensão dos objetivos do controle de estruturas, por sua vez, exige que se
dê um passo atrás para a análise do que a Lei nº. 12.529/11 entende como ato de concentração e quais
as consequências que dele podem decorrer.
Dene-seatodeconcentraçãocomo“aoperaçãopormeiodaqualdoisoumaisagentes
econômicosjuntamseuspatrimônios,podendoatéunicarsuadireção,comointuitoderacionalizar
o emprego dos fatores de produção, reduzir custos e aumentar a produtividade” (VAZ, 2001, p. 303). A
Lei nº. 12.529/11 optou por enumerar o que deve ser entendido como ato de concentração econômica
no art. 90 (FORGIONI, 2016, p. 417).4
Nesse sentido, Forgioni (2016, p. 420) explica que as operões de concentração podem
tender ao arrefecimento da concorrência entre os agentes econômicos, buscando atingir ou reforçar
uma posição dominante no mercado – o que é prejudicial à ordem econômica. Mas não só: por meio
do ato de concentração, é possível viabilizar economias de escala, com melhor aproveitamento dos
recursos disponíveis, como sistemas de distribuição (FORGIONI, 2016, p. 421). Essas operões detêm
o condão, também, de permitir a entrada do agente comprador em um novo mercado, funcionar
como meio de preservar as atividades e possibilitar ganhos ou economias tributárias (FORGIONI,
2016, p. 422).
Nota-se, dessa forma, que o processo de concentração não se encontra necessariamente
associado à ocorrência de prejuízos e ao uso abusivo do poder econômico pelo agente (FRAZÃO,
2017, p. 111). Ao contrário, é capaz de levar a maior grau de eciência, propiciando inovação,
desenvolvimento tecnológico e benefícios para os consumidores. A concentração de capitais pode
aumentar economias de escala e propiciar o aproveitamento de sinergias em benefício da sociedade”
(FORGIONI, 2016, p. 424).
Entretanto, utilizando-se o poder econômico de forma abusiva, a concentração de fato pode
atentar contra o funcionamento normal dos mercados (FORGIONI, 2016, p. 426). O agente passa a se
comportar com independência e indiferença em relação aos demais agentes econômicos (FORGIONI,
2016, p. 426), implicando a posição dominante na sujeição de mercados e de consumidores (FORGIONI,
2016, p. 271).
Não por outra razão, parte da doutrina entende a concentração como um efeito autodestrutível
do mercado, que é apto a ocasionar crises no sistema econômico (FORGIONI, 2016, p. 414). Diante
dessepossívelcenário,aoórgãodedefesadaconcorrênciacabeanalisaraeciênciaeosprejuízos
decorrentes da operação de concentração (SILVEIRA, 2021, p. 9) previamente à sua conclusão (CASTRO,
2014, p. 171).
Nesse sentido, Salomão Filho (2002, p. 359) destaca que a existência de um controle estrutural
decorre da preferência por uma atuação preventiva em comparação à atuação sancionatória,
principalmente diante da possível derivação de importantes efeitos macroeconômicos. Assim,
realizada a análise da operação pelo Cade, a concentração pode ser autorizada, desde que os
benefícios trazidos superem os prejuízos em termos de concorrência (FORGIONI, 2016, p. 438).
4 Art. 90. Para os efeitos do art. 88 desta Lei, realiza-se um ato de concentrão quando: I - 2 (duas) ou mais empresas
anteriormente independentes se fundem - 1 (uma) ou mais empresas adquirem, direta ou indiretamente, por compra ou
permuta de ações, quotas, títulos ou valores mobiliários conversíveis em ações, ou ativos, tangíveis ou intangíveis, por via
contratual ou por qualquer outro meio ou forma, o controle ou partes de uma ou outras empresas; III - 1 (uma) ou mais
empresas incorporam outra ou outras empresas; ou IV - 2 (duas) ou mais empresas celebram contrato associativo, consórcio
ou joint venture (BRASIL, 2011).
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ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
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O procedimento de concentrão, para ser submetido à análise do Cade, deve preencher
alguns requisitos cumulativos, constantes no art. 88 e 90 da Lei nº. 12.529/11,5 exigindo-se também
a noticação prévia da autarquia (HAJAR, 2018, p. 37), sendo que a concentração não pode ser
consumada antes da sua apreciação (FORGIONI, 2016, p. 440).
3. O ACORDO EM CONTROLE DE CONCENTRAÇÃO
No contexto do controle estrutural, destinado à análise prévia do ato de concentração, situa-
se o acordo em controle de concentração, mecanismo que pode ser celebrado entre o Cade e as
partes para viabilizar a aprovação da operação econômica (FORGIONI, 2016, p. 422).
No exame da concentração econômica, o Cade pode decidir por aprovar, reprovar ou aprovar
com restrições determinada operação. Nesse último caso, são estabelecidas condições para a
aprovação, mediante a utilização de cláusulas que possibilitam a eliminação dos efeitos nocivos à
ordemeconômica(FORGIONI,2016,p.422).Taiscondiçõespodemserxadasunilateralmenteoude
modo pró-consensual, por meio da celebração de acordos entre o Cade e a empresa em concentrão
(MARRARA, 2020, p. 200).
A vantagem da estipulação consensual de condições reside no fato de que o agente econômico
detém expertise única acerca de sua dinâmica de funcionamento (MARRARA, 2020, p. 201). Sendo
assim,aparticipaçãodorequerentedaconcentraçãogaranteaqualidade,aeciênciaeaefetivdade
docontrolefeitopelaautarquia,quepossuiexibilidadedecisóriaparaexercer“poderesrestritivos
dentro do controle de concentrações como técnica de prevenção de danos à concorrência em sentido
difuso” (MARRARA, 2020, p. 201).
Portanto, o acordo em controle de concentração caracteriza-se como um instrumento
medianteoqualsãoestabelecidascondicionantesàaprovaçãodenitivadaoperaçãopeloCade,
exigindo-se seu cumprimento para que seja autorizado o ato (MARRARA, 2020, p. 202).
Em síntese, a requerente assume, perante a administração, a obrigação de comportar-se
nos estreitos limites das condições impostas para a aprovação do ato (FORGIONI, 2016, p. 442). À
administração o acordo é vantajoso ao possibilitar que a concentração seja autorizada garantindo-
seoatingimentodeeciênciaspretendidas(FORGIONI,2016,p.442),bemcomoevitandoprejuízosà
concorrência, aos consumidores e ao mercado como um todo.
4. O MONITORAMENTO REALIZADO PELA AUTARQUIA
Um dos pontos de maior preocupação associado à celebração dos acordos em controle de
concentrão reside na scalização do cumprimento das condições estipuladas, principalmente
dos remédios comportamentais, cujos custos de monitoramento são mais elevados diante das
diculdadesrelacionadasàsuaimplementação(RIBEIRO;FELIPPE,2021,p.7).
5 Art. 88. Serão submetidos ao Cade pelas partes envolvidas na operação os atos de concentração econômica em que,
cumulativamente: I - pelo menos um dos grupos envolvidos na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento
bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 400.000.000,00
(quatrocentos milhões de reais); e II - pelo menos um outro grupo envolvido na operação tenha registrado, no último balanço,
faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$
30.000.000,00 (trinta milhões de reais) (BRASIL, 2011).
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
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Nessesentido,Forgioniexplicaque“ascalizaçãodocumprimentodessescompromissos
por parte das autoridades antitruste tem se mostrado defeituosa, de forma que as empresas acabam
desviando-se dos termos acordados” (FORGIONI, 2016, p. 443).
A legislação atribuiu à Superintendência Geral o poder de realizar esse monitoramento
(art. 52 da Lei nº 12.529/11),6sendocomumqueascalizaçãosejaefetivada,noâmbitodoCADE,
unicamente através da análise formal de relatórios apresentados pelas próprias empresas em
concentrão (VERÍSSIMO, 2017, p. 334). Esse contexto decorre, entre outros fatores, da reduzida
estrutura da autoridade concorrencial em comparação à complexidade dos mercados sobre os quais
se faz necessário o monitoramento (VERÍSSIMO, 2017, p. 334).
Emmuitoscasos,omododerealizaçãodascalizaçãodosremédiosantitrusteaplicados
sequer é mencionado nas decisões da autarquia, do que resulta a mitigação do enforcement desses
pronunciamentoseainviabilidade–oudiculdade–deaplicaçãoderemédioscomportamentais
(VERÍSSIMO, 2017, p. 334).
Tendoisso,emvista,oCade“acabalimitandoaspossibilidadesdeimposiçãoounegociação
de remédios, de modo que as autoridades optam frequentemente pelas medidas mais tradicionais
(VERÍSSIMO, 2017, p. 334).
Adoutrinatementendido,poroutrolado,quehádireitosubjetivodeterceirosàscalização
do acordo, o que signica que os cidadãos, tanto quanto o Ministério Público e as agências
reguladoras, estão autorizados a contatar o Cade para informar o descumprimento dos termos
pactuados (MARRARA, 2020, p. 206). É do interesse da coletividade, portanto, para além dos envolvidos
naoperaçãoedoCADE,queascondiçõesassumidasnoacordosejamcumpridas,amdegarantira
produção de efeitos positivos decorrentes do ato de concentração.
A extensão a outros atores das atribuições de efetuar esse monitoramento pode representar
um importante mecanismo para assegurar a preservação da concorrência, elevando a efetividade
do instrumento pró-consensual celebrado entre a administrão e as empresas em concentração
(MARRARA, 2020, p. 206).
Sendo assim, diante da ineciência da scalização realizada de forma exclusiva pela
autoridade concorrencial, abre-se espaço para que sejam estipulados mecanismos outros que
possam colaborar para o bom funcionamento desse sistema de controle prévio do CADE, em que
a operação é autorizada desde que preenchidas as condições que possibilitem a sobreposição da
eciênciadaoperaçãoaosprejuízosdeladecorrentes.
5. A ARBITRAGEM COMO MECANISMO DE REFORÇO AO MONITORAMENTO
É dentro dessa lógica de procura de novos atores para reforçar o monitoramento originalmente
incumbido ao Cade que se enquadra a arbitragem.
Nesse sentido, a OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (2012,
p. 13) produziu relevante estudo acerca do crescimento da utilização da arbitragem como forma de
reduzir os custos de monitoramento e de implementação dos remédios impostos para a aprovação
6 Art.52.OcumprimentodasdecisõesdoTribunalede compromissoseacordosrmadosnos termosdestaLei
poderá,acritériodoTribunal,serscalizadopelaSuperintendência-Geral,comorespectivoencaminhamentodosautos,após
adecisãonaldoTribunal(BRASIL,2011).
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
Concorrência, Brasília, v. 10, n. 2, p. 137-162, 2022.
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dos atos de concentração.
NoBrasil,adoutrinaapontaqueoCadetemprocuradoseutilizardemecanismosmaisecientes
para garantir o cumprimento material de suas decisões, sendo a arbitragem justamente uma forma
de reduzir os custos de monitoramento da autarquia (CAVALCANTI, 2015, p. 31) A autarquia já se
manifestousobreosbenefíciosdautilizaçãodaarbitragem,decorrentesdofatodeque“discussões
complexas relativas aos motivos que levaram à recusa de negociação ou à inadequação dos critérios
denegociaçãocarãoacargodoárbitro,cujaescolhadeveráseraprovadapeloCade”(BRASIL,2014)
Osocorroàarbitragemjusticou-senumcenáriodeeventualausênciaouinsuciênciada
açãodaautarquia(BRASIL,2017c),relacionadoàdeciênciaestruturalpararealizaraintegralidade
do monitoramento dos termos dos acordos em controle de concentração.
6. A EXPERIÊNCIA PRÁTICA DO CADE
Os acordos em controle de concentração abaixo analisados, ao mesmo tempo em que
estabelecem como remédio comportamental a adoção de medidas de não discriminação (RIBEIRO;
FELIPPE, 2021, p. 7), autorizam que o concorrente atingido por práticas anticoncorrenciais acione o
mecanismo chamado pelo Cade de arbitragem.
Nostrêsprimeiroscasos,oobjetodadecisão“arbitral”7 era mais restrito, de forma a abarcar
apenas a constatação objetiva de adoção ou não de conduta contrária à condição estabelecida no
acordo. A partir do caso Cetip/Bovespa, a arbitragem passou a poder analisar qualquer aspecto
atinente às condições de contratação entre os particulares.8
Ademais,dos julgadosdo Cadeverica-sequeaqueles nomeadosnoprocedimentodito
arbitral têm exercido atribuições ora consultivas ora decisórias. Em alguns casos, são chamados a
opinar ou a atestar o descumprimento de determinado remédio antitruste e, em outros, subordinam
as empresas em concentração às suas decisões acerca da implementação dos termos do acordo
(VERÍSSIMO, 2017, p. 335).
Independentemente da concordância com a terminologia utilizada para descrever o
pronunciamento opinativo como sendo arbitragem, a análise tópica dos casos em que o Cade
inseriu o procedimento chamado de arbitragem como mecanismo reforço de monitoramento serve
à demonstração da evolução da estruturação do instituto pela autarquia, adequando-o, cada vez
mais, ao procedimento arbitral previsto na Lei nº. 9.307/96 e, como consequência, inadequando-se,
na mesma medida, à matéria de direito público sobre a qual se debruça.
6.1. Caso ICL/Bromisa
7 Aquitalvezsejarelevantefazerumadistinção,quesetornarámaisclaranonaldoestudo:oCadequalicacomo
arbitragemoprocedimentoutilizadoparansdemonitoramentodoscompromissosassumidosnosacordosemcontrole
de concentração desde o caso ICL/Bromisa, de 2014, até o caso AT&T/Warner, de 2018, embora o procedimento chamado de
arbitral seja estruturado de maneira diferente nos os acordos em controle de concentração. Nos primeiros casos, não se trata
de arbitragem propriamente dita, tendo, com o passar do tempo, aproximando-se o procedimento da arbitragem prevista na
Lei nº 9.307/96.
8 Não obstante o objeto da decisão arbitral verse sobre a relação estabelecida entre particulares (empresas em
concentração e concorrentes), como o que se pretende constatar é a ocorrência ou não de prática que contraria a condição
imposta para aprovação da decisão, o pronunciamento do árbitro tem como conteúdo, em verdade, o cumprimento ou não da
obrigação assumida pelas compromissárias perante o Cade, como se verá melhor a seguir.
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
Concorrência, Brasília, v. 10, n. 2, p. 137-162, 2022.
https://doi.org/10.5286/rdc.v10i2.999
A operação de concentração realizou-se mediante a constituição de uma joint venture entre a
Fosfobrasil S/A, o Grupo Israel Corporation e o Grupo Vale, envolvendo o mercado de ácido fosfórico
de grau alimentício. Representou a primeira experiência do Cade na utilização do procedimento
denominado arbitragem como mecanismo de reforço ao monitoramento da implementação das
condições impostas à aprovação do ato de concentração (HAJAR, 2018, p. 24).
A operação foi aprovada, em 2014, com restrições, estipulando-se como remédio
comportamental a obrigação da Fosfobrasil de oferecer contratos de fornecimento de longo prazo
de ácido fosfórico aos produtores independentes de sais de fosfato de grau alimentício localizados
no Brasil por um período de até oito anos (BRASIL, 2014).9 Para completar, o ACC consignou que
o preço cobrado pela Fosfobrasil não poderia ser superior ao estipulado no acordo que, em suas
cláusulas2.1.2a2.1.4(BRASIL,2014),estabeleucritériosdexaçãodopreçonoprimeirotrimestree
nos trimestres subsequentes, exigindo-se a observância das regras usuais de mercado e da boa-fé
(BRASIL, 2014).10
Diante disso, a ICL Brasil comprometeu-se a fazer com que a Fosfobrasil não se recusasse a
vender o PPA de grau alimentício para qualquer produtor independente de sais de fosfato localizado
no Brasil, respeitando as condições não discriminatórias até então praticadas (BRASIL, 2014).11 As
condiçõesnãodiscriminatórias,porsuavez,foramdenidascomoaquelasnegociadasconformeos
parametrosdomercadoedaboa-fé,“nãopodendooprocobradodeumnovoclientesersuperior
ao preço máximo que a ICL Brasil pode oferecer aos clientes atuais na forma das condições descritas
nas cláusulas 2.1.1. a 2.1.4” (BRASIL, 2014).12
Para o monitoramento das obrigações assumidas, previu-se um procedimento chamado de
arbitragem,destinadoaanalisaraquestãodarecusanãojusticadadaFosfobrasilnofornecimento
de PPA de grau alimentício a um produtor independente de sais de fosfato localizado no Brasil
(BRASIL, 2014).13
Posteriormente à manifestação da ICL Brasil, o Cade decidiria por instaurar ou não o processo
de“arbitragem”paradeterminarsehouvejusticativaobjetivanarecusa(BRASIL,2014).14 Aberto
9 2.1. A ICL Brasil compromete-se a, em seguida à consumação da Operação, fazer com que a Fosbrasil ofereça contratos
de fornecimento de ao menos 1 (um) ano de duração e até 8 (oito) anos de duração, conforme o interesse do adquirente, para
a venda de PPA de grau alimentício a todos os produtores independentes de sais de fosfato de grau alimentício localizados no
Brasil comprado pelo menos 100 T/P2O5 de PPA de grau alimentício que tenham da Fosbrasil considerando-se o volume médio
anual de compra nos anos de 2012, 2013 e 2014.
10 2.1.1. O preço cobrado na venda de PPA de grau alimentício a produtores de sais de fosfato de grau alimentício loca-
lizadosnoBrasilseráxadolivrementepelaspartescontratantes,deacordocomaboa-féeascondiçõesusuaisdemercado,
nãopodendosersuperioraovalorresultantedoscritériosdenidosnascláusulas2.1.2a2.1.4abaixo.
11 2.2 A ICL Brasil compromete-se a fazer com que a Fosbrasil não se recuse a vender PPA de grau alimentício para
qualquer (atual ou futuro) produtor independente de sais de fosfato de grau alimentício localizado no Brasil, respeitando as
mesmascondiçõesnão-discriminatóriasatualmentepraticadas,amenosqueexistaumajusticativaobjetiva.
12 2.2.1. Serão consideradas condições não discriminatórias, nos termos da Cláusula 2.2, as negociações realizadas de
acordo com as condições boa-fé, não podendo o preço cobrado de um novo cliente ser superior ao pro máximo que a ICL
Brasil pode oferecer aos então clientes atuais na forma das condições descritas nas cláusulas 2.1.1 a 2.1.4.
13 3.6. No caso de uma alegada recusa pela Fosfobrasil no fornecimento de PPA de grau alimentício a um produtor
independente de sais de fosfato de grau alimentício localizado no Brasil que tenha submetido pedido de boa-fé à Fosfobrasil,
ecasoesseprodutoraleguequearecusadaFosfobrasilnãotevejusticativaobjetiva,oCadepoderá,seapropriado,solicitar
à ICL Brasil que dê início a processo de arbitragem para dirimir a questão, de acordo com as práticas usuais de negócio.
14 3.6.1.AICLBrasildeveteraoportunidadedemanifestar-sesobrequalqueralegadarecusasemjusticativaobjetiva,
pela Fosbrasil, de fornecer PPA de grau alimentício a um produtor independente de sais de fosfato de grau alimentício localizado
no Brasil que seja submetida ao Cade, previamente à decisão do Cade de instaurar ou não um processo de arbitragem para
determinarsehouveumajusticativaobjetiva,eoCadedeveconsiderarosargumentosapresentadospelaICLBrasil.
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
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oprocedimento,aquelesnomeadosnoprocedimento(chamadosimpropriamentede“árbitros”)
emitiriam opinião, a ser submetida ao Cade para referendo e posterior decisão a respeito, limitada
adeterminar“seaFosfobrasilteveumajusticativaobjetivaparaarecusadefornecerPPAdegrau
alimentício a um produtor independente de sais de fosfato de grau alimentício no Brasil” (BRASIL,
2014).15
Contudo, com o nome de arbitragem, o Cade pareceu estipular, para esse ato de concentração,
um mecanismo de controle privado de outra natureza. O caráter apenas opinativo do procedimento
não se coaduna com o instituto da arbitragem. A atuação dos árbitros é caracterizada por um perfeito
equivalente à jurisdição estatal cognitiva, cabendo ao tribunal atuar as normas incidentes no caso
concreto (TALAMINI, 2015, p. 289), de forma que a decisão arbitral, desde quando é proferida, vincula
as partes envolvidas, prescindindo inclusive de homologação judicial (FIGUEIRA JÚNIOR, 2019, p. 118).
Tanto é assim que em procedimento arbitral não vinculante – que, em respeito à autonomia
das partes, pode ser escolhido, ainda que implique a desnaturão da arbitragem de natureza
jurisdicional –, a conclusão do tribunal arbitral não é sentença, caracterizando-se, em verdade, como
laudo ou parecer contendo opinião acerca do possível deslinde da causa (FIGUEIRA JÚNIOR, 2019, p.
74).
Poder-se-ia argumentar que às partes cabe, quando do seu interesse, restringir o poder dos
árbitros, autorizando-os, por exemplo, a apurar somente um determinado fato (como nesse caso
daICL/Bromisafaz-sequantoàjusticativaderecusaaofornecimentodoPPA)–oqueéválido
(CARMONA, 2009, p. 289). Contudo, mesmo nessas hipóteses, a decisão dos árbitros teria força
vinculante no que tange às conclusões de fato por ele estabelecidas, o que se distingue do resultado
de uma perícia ou parecer, que não vinculam o julgador (CARMONA, 2009, p. 289).
Assim, não seria possível atribuir a esse procedimento o nome de arbitragem, sem ressalvar
a sua natureza não vinculante e não jurisidicional.
Existem consequências jurídicas de relevância para as partes, para o árbitro e para o Cade,
na condição de administração pública indireta, em se considerar o referido procedimento como
de arbitragem jurisdicional. A título exemplicativo, em se tratando de procedimento arbitral
propriamente dito, a parte que recebeu a sentença arbitral favorável poderia buscar a sua execução
perante o Poder Judiciário, ainda que o Cade decidisse em sentido contrário ao parecer, o que não
parece possível no caso do procedimento adotado no ato de concentração ICL/Bromisa, pois esse
não dispõe da natureza vinculante que é conferida à arbitragem pela Lei nº. 9.307/96 (BRASIL, 1996).
6.2. Caso ALL/Rumo
Esse ato de concentração consistiu na incorporação das ações da América Latina Logística
S/A(ALL)pelaRumoLogísticaOperadoraMultimodalS/A.OCadeidenticouumpossívelproblema
consistente no fato de que a nova companhia, além de ser controlada por um player que se utiliza
da ferrovia para transporte de carga própria (Rumo), passaria a deter o controle de toda a cadeia
logística de exportação de grãos vegetais pelo Porto de Santos (BRASIL, 2015).
15 3.6.2. A opinião exarada pelo(s) árbitro(s) — que será apontado pela ICL Brasil e referendado pelo Cade — será então
submetida ao Cade para que esse tome uma decisão fundamentada. A opinião do(s) árbitro(s) será limitada a determinar se
aFosbrasilteveumajusticativaobjetivaparaarecusadefornecerPPAdegraualimentícioaumprodutorindependentede
sais de fosfato de grau alimentício localizado no Brasil.
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Sendo assim, a nova companhia poderia negociar condições mais favoráveis às empresas
de seu próprio grupo em detrimento de outros concorrentes dos diversos mercados afetados pela
operação e dos usuários em geral, privilegiando sua própria carga em um cenário de oferta de
serviçoinsuciente,bemcomodesfavorecendoacargadeconcorrentesparafortalecersuaposição
demercado(BRASIL,2015).Comoconsequência,“aempresateriaevidentecapacidadedeadotar
condutas que coloquem em desvantagem rivais atuantes nas mais diversas etapas dessa cadeia”
(BRASIL, 2015).
Como condição de aprovação da operão, portanto, estabeleceu-se que a nova companhia
deveriaobservarosparâmetrosobjetivosdeprecicaçãodosserviçosprestadosaosconcorrentes,16
representadosporumconjuntodevariáveisobjetoderelaçãoxaepré-ordenadaentresi(BRASIL,
2015).17
Ao mesmo tempo, exigiu-se que a nova companhia assegurasse aos usuários a contratação
de transporte ferroviário, de forma isolada ou conjunta com outros serviços, por preços compatíveis
com o tipo de contratação,18cujaescolhadeveriacaracargodousuário(BRASIL,2015).19
Quanto ao procedimento chamado de arbitragem, previu-se que, caso algum usuário se
sentisse discriminado na contratação ou na prestação de quaisquer serviços pela nova companhia,
deveria se reportar ao supervisor, indicando os fatos que lhe fazem sentir a discriminação (BRASIL,
2015).20 21 Se o usuário entendesse que a resposta fornecida pelo supervisor foi insatisfatória, poderia
acionaroprocedimento“arbitral”privado(BRASIL,2015),22noqualapenasdeveserconstatada“se
a contratação de prestação de serviço de transporte ferroviário ocorreu de forma discriminatória,
considerando-se a contratação e a prestação do serviço com partes relacionadas” (BRASIL, 2015).23
As decisões ditas arbitrais deveriam ser disponibilizadas ao Cade no relatório da auditória
16 2.7. Sem prejuízo das disposições regulatórias, e de critérios mais vantajosos negociados pelos Usuários e já em
curso,aNOVACOMPANHIAdeveráobservarparâmetrosobjetivosparaaprecicaçãodosserviçosprestadosaosConcorrentes.
17 2.8.Osparâmetrosobjetivosserãorepresentadosporumconjuntodevariáveisqueguardarãoumarelaçãoxaepré-
ordenada entre si. § 1º. Fica resguardada a liberdade tarifária com base nos preceitos regulatórios aplicados à espécie. § 2º Os
valoreseainuência(o“peso”)decadavariávelnopreçonaldeverãoseraplicadosaosConcorrentesdeformaisonômica.§
3ºTodososcontratosrmadosdevempermitiradecomposiçãodospreçospraticados,comidenticaçãodasparticularidades
quejustiquemumtratamentodiferenciado.§4ºAsparticularidadesdescritasno§3ºdeverãoserquanticadasequalicadas
de forma a ser possível aferir a razoabilidade dessa diferenciação.
18 2.11. Sem prejuízo da observação do item 2.9, a NOVA COMPANHIA assegurará sempre aos Usuários a contratação
de transporte ferroviário, de forma isolada ou conjunta a outros serviços, sempre por preços compatíveis com o tipo de
contratação.
19 §1º A escolhapelotipo decontratação(isolada ouconjunta)caráacritério do Usuário,nãopodendo haver
precicaçãodeumpacotedeserviçoslogísticosemvalorinferioraopreçodeumserviçoisoladoqueestejaneleincluído.
20 2.30. Sem prejuízo das competências regulatórias da ANTT, caso algum Usuário se sinta discriminado na contratação
ou na prestação de quaisquer serviços pela NOVA COMPANHIA, este poderá reportar formalmente ao Supervisor, indicando os
fatos que lhe fazem supor a discriminação.
21 Éderessaltarque,emrelaçãoaoconteúdodoobjetosubmetidoà“arbitragem”,algunsdosdesentendimentosentre
as empresas decorrentes do ato de concentração podem ser resolvidos pela mediação, importante meio de autocomposição
capazdedirimircontrovérsiasqueenvolvamnegociaçãodesoluçõesparaempresasamdesolucionarosseuspróprios
conitos.Essemétodonão podeservirdesucedâneoàdecisãodo Cadeem matériade cumprimentode compromissos
celebrados em acordos em controle de concentração, mas pode ser importante forma de resolução de problemas negociais
surgidos entre as empresas.
22 2.32. Caso o Usuário entenda que a resposta apresentada pelo Supervisor é insatisfatória, o Usuário poderá iniciar
procedimento arbitral privado.
23 § 2º A decisão do Tribunal Arbitral será de constatação se a contratação e prestação do serviço de transporte
ferroviário ocorreu de forma discriminatória, considerando-se a contratação e a prestação dos serviços com Partes
Relacionadas.
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externa independente (BRASIL, 2015)24 e a elas o Cade não se vincularia quando da formação de
seu entendimento, bem como não estaria obrigado a se manifestar ou tomar providências a cada
pronunciamento“arbitral”(BRASIL,2015).25
Aprópriaautarquiareconheceu,emmomentoposterior,que,damesmaformadovericado
no caso da ICL/Bromisa, a dita arbitragem foi aqui prevista como um mecanismo de resolução de
controvérsias que serviria de apoio a uma decisão da autoridade antitruste (BRASIL, 2015).
Diante disso, aplicam-se os mesmos comentários realizados no item anterior, reforçando
a conclusão de que esse modelo de procedimento não se amolda a uma arbitragem de natureza
jurisdicional e, portanto, a uma arbitragem propriamente dita.
Importante consignar que, sobre esse acordo em controle de concentração, a Procuradoria
Federal Especializada do Cade foi acionada por terceiro acerca de um suposto descumprimento
dos termos pactuados (VERÍSSIMO, 2017, p. 339). Nessa oportunidade, a autarquia manifestou-se
estabelecendo um interessante liame entre as questões privadas existentes entre os concorrentes e
a atuação do Cade, destacando que:
A autoridade antitruste a princípio não se ocupará de questões privadas entre
concorrentes, atendo-se apenas aos termos do ACC quando da análise dos
aspectos concorrencialmente sensíveis envolvidos na dinâmica do mercado
pós celebração do acordo, sendo que apenas em caso de uma eventual
circunstância que possa comprometer sua ecácia (de maneira concreta) e,
como no caso, eventualmente atestada pelo juízo arbitral, passaria a agir
(VERÍSSIMO, 2017, p. 339).
Assim, eventual manifestação da autarquia apenas decorreria da constatação de uma
circunstância capaz de atentar contra a ecácia do acordo, previamente denida pelo que fora
chamado de juízo arbitral.
6.3. Caso Dow/Dupont
A fusão entre a Dow Chemical Company e a E.I Du Pont de Nemours and Company exigiu
das companhias envolvidas uma série de desinvestimentos de ativos relacionados ao negócio de
sementes de milho (HAJAR, 2018, p. 59).
Entretanto,previu,comomecanismodereforçodomonitoramento,aguradeumtrustee,
terceiro imparcial incumbido do dever de supervisionar o cumprimento das condições e das
obrigações contidas no acordo (VERÍSSIMO, 2017, p. 341).
Como não existiu previsão de arbitragem, esse caso dispensa maior interesse ao presente
estudo.
6.4. Caso Tam/Iberia/British Airways
24 §6ºAsdecisõesarbitraisserãofornecidasaoCadenorelatóriodeauditoriaindicadonoitem“I”abaixo.
25 2.33. O Cade não se vincula a qualquer deliberação arbitral para a formação das suas decisões, e nem se obriga a se
manifestar ou a tomar providências a cada decisão arbitral prolatada.
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A TAM e os grupos LATAM e IAG celebraram um acordo de negócio conjunto, também denominado
de joint business agreement, envolvendo o mercado de transporte aéreo de passageiros e cargas nas
rotas entre Europa e América do Sul (VERÍSSIMO, 2017, p. 342).
Notou-se que a partir da efetivação do ato de concentração seria consideravelmente baixa
a probabilidade de novas entradas nas rotas diretas de São Paulo a Londres e, caso acontecesse,
dicilmenteasofertasseriamsucientesetempestivas(BRASIL,2017a).
Dado esse cenário, o ACC previu a obrigação de celebração de um SPA (Special Prorate
Agreement), no qual o concorrente entrante teria direito a escolher algumas rotas a partir de Londres
eoutrasapartirdeGuarulhos,amdecaptaracapacidadedepassageirosnecessáriaparaefetuar
a viagem entre São Paulo e Londres (BRASIL, 2017a).
Assim, a pedido de um novo operador de serviços aéreos sem escala, a British Airways e a Latam
deveriam celebrar um Acordo Especial Pro Rata (SPA) com essa companhia área para o tráfego de uma
viagem que tenha origem/destino real na Europa e origem/destino real no Brasil (BRASIL, 2017a).26 As
taxas aplicadas a essas rotas deveriam ser pelo menos tão favoráveis quanto os termos acordados
pela compromissária relevante (British Airways) no acordo especial existente com qualquer outra
companhia aérea para a mesma rota de aliementação e na mesma classe tarifária (BRASIL, 2017a),27
devendo também ser assegurados os tempos mínimos de conexão baseados na prática habitual no
aeroporto e no terminal em questão (BRASIL, 2017a).28
Se o operador de serviços aéreos entender que a classe tarifária oferecida pela compromissária
relevante não obdece os termos do ACC e se as partes não conseguirem chegar a uma solução
consensual, o operador de serviços aéreos solicitante poderia requerer que o Cade dê inicio a um
procedimento também chamado arbitral (BRASIL, 2017a).29
Antes da decisão sobre a instauração ou não do procedimento, a compromissária relevante
teria direito a se manifestar. Munido das informações necessárias, ao Cade caberia a decisão acerca
26 III.1. A pedido de um Novo Operador de Serviços Aéreos Sem Escala, a British Airways e LATAM deverão entrar em um
Acordo Especial Pro Rata (SPA) com tal companhia aérea (Operador de Serviços Aéreos Solicitante) para o tráfego com uma
origem/destino real na Europa e uma origem/destino real no Brasil, desde que parte da viagem envolva o Par de Cidades
IdenticadonoqualoServiçoAéreoCompetitivoSemEscalaséoferecido.ApedidodoOperadordeServiçosAéreosSolicitante,
o Acordo Especial Pro Rata (SPA) deve se aplicar a todos os serviços aéreos do Operador de Serviços Aéreos Solicitante no Par
deCidadesIdenticadonoqualoServiçoAéreoCompetitivoSemEscalaséoferecido
27 III.5. Sujeito às disposições do restante desta Cláusula III, o Acordo Especial Pro Rata (SPA) deve: obedecer os termos
(taxasaplicadasàsrotasespecícasdoAcordoEspecialProRata(SPA)etaxasdeserviçodeinterline,apenas)quesãopelo
menos tão favoráveis quanto os termos acordados pela Compromissária relevante nos termos de um acordo especial pro rata
existente com qualquer outra companhia aérea para a mesma rota de alimentação (feed route) e na mesma classe tarifária
(que não seja objeto de termos de codeshare contidos em acordos especiais pro rata já existentes ou quaisquer termos
excluídos em virtude da Cláusula III.6). Para que não restem dúvidas, sujeito à Cláusula III.6, os termos do Acordo Especial
Pro Rata (SPA) a ser celebrado pela British Airways com o Operador de Serviços Aéreos Solicitante em Londres Heathrow não
deverão de nenhuma forma ser menos favoráveis que os acordados pela British Airways no âmbito dos acordos especiais pro
ratarmadosconformeaDecisãodaComissãoEuropeiade14.07.2010(CasoCOMP/39.596)nemqueoacordoespecialprorata
que atualmente possui com a Avianca para a mesma rota de alimentação (feed route) e na mesma classe tarifária (excluídos
quaisquer termos de codeshare). Se a Compromissária relevante não possuir uma tarifa equivalente com qualquer outra
companhia aérea, a tarifa deve ser determinada de acordo com a Cláusula III.7.
28 c. assegurar tempos mínimos de conexão baseados na prática habitual no aeroporto e no terminal em questão, e
que sejam razoáveis.
29 III.11.1. Caso o Operador de Serviços Aéreos Solicitante entenda que a classe tarifária oferecida pela Compromissária
relevante não cumpre com estes Compromissos e as partes não consigam chegar a um acordo, o Operador de Serviços Aéreos
Solicitante poderá solicitar ao Cade que dê início a um procedimento arbitral para dirimir a controvérsia.
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
Concorrência, Brasília, v. 10, n. 2, p. 137-162, 2022.
https://doi.org/10.5286/rdc.v10i2.999
doinícioda“arbitragem”(BRASIL,2017a),30 que possuiria objeto restrito à compatibilidade das classes
tarifárias oferecidas pelas compromissárias aos operadores de serviços aéreos.
Instaurado o procedimento, um trustee, agindo como árbitro”, emitirira sua decisão
determinando para quais classes tarifárias deveria ser aplicado o Acordo Especial Pro Rata (SPA).
Essa decisão seria submetida ao Cade (BRASIL, 2017a),31 que a ela não se vincularia para a formação
de seu entendimento, e nem estaria obrigado a se manifestar ou a tomar providências a cada
pronuncimaneto dito arbitral (BRASIL, 2017a).32 A conclusão do Acordo Especial Pro Rata (SPA) estaria
sujeitaàaprovaçãodoCade,aconselhadopelotrustee,especicamentequantoàvericaçãoda
razoabilidade de seus termos (BRASIL, 2017a).33
6.5. Caso Cetip/Bovespa
O acordo em controle de contração celebrado quando da fusão da BM&F Bovespa e da Cetip
Mercados Organizados representou alteração signicativa nas características dos procedimentos
ditos arbitrais até então adotados pelo Cade.
As compromissárias assumiram no acordo em controle de concentração o dever de garantir
tratamento isonômico entre todos os participantes da central depositária, obrigando-se a detalhar
os aumentos de quaisquer custos operacionais ou transacionais inerentes à mecânica da prestação
de serviços da CSD em relação a valores mobiliários de renda variável (BRASIL, 2017b). Além disso,
comprometeram-se a oferecer a prestação de serviços CSD em condições justas, transparentes e não
discriminatórias, o que incluia os termos e as condições contratuais de acesso a sua infraestrutura
(BRASIL, 2017b).34
Nessa oportunidade, pela primeira vez, o chamado tribunal arbitral (agora de maneira
apropriada) passou a deter poderes amplos para decidir sobre quaisquer aspectos relativos ao
preço e/ou ao escopo das regras de acesso à prestação de serviços CSD (Central Depositária de
Ativos) (BRASIL, 2017b),35 não limitando sua atuação a constatar a ocorrência de discriminação ou de
violação dos termos do acordo pela empresa em concentrão.36
30 III.11.2. Antes que o Cade autorize a instauração do processo arbitral, a Compromissária relevante deve ter o direito
de apresentar a situação e contexto da negociação ao Cade e as razões pelas quais as partes ainda não chegaram a um acordo.
Com base nesta informação, o Cade poderá decidir de instaurar ou não um processo de arbitragem.
31 III.11.4. Instaurado o processo de arbitragem, o Trustee agindo como árbitro emitirá sua decisão determinando a(s)
classes(s) tarifária(s) para à(s) qual(is) se aplicará(ão) o Acordo Especial Pro Rata (SPA). A decisão adotada pelo Trustee será
submetida ao Cade.
32 III.11.6. O Cade não se vincula a qualquer deliberação arbitral para a formação das suas decisões, e nem se obriga a
se manifestar ou a tomar providências a cada decisão arbitral prolatada.
33 III.12. A conclusão do Acordo Especial Pro Rata (SPA) estará sujeita à aprovação do Cade, aconselhado pelo Trustee,
especicamentequantoàvericaçãoseosseustermossãorazoáveis.
34 2.8. As Compromissárias se comprometem a oferecer a Prestação de Serviços CSD em condições justas, transparentes
e não-discriminatórias, o que inclui os termos e as condições contratuais de acesso a sua infraestrutura.
35 2.9.ParaefeitosdesseACC“PrestaçãodeServiçosdeCSD”signicaaprestaçãodeserviços,pelacentraldepositária
da BVMF, de transferência de valores mobiliários objeto de operões compensadas e liquidadas por intermédio de outra IMF,
bem como as funcionalidades acessórias para a prestação do serviço principal. 2.11. Em caso de fracasso nas negociações, a
parteinteressadapoderáacionaromecanismodearbitragemprevistonestacláusula,paransdesoluçãodecontrovérsias
(“Arbitragem”).
36 Observa-se que as considerações abaixo formuladas (sobre a competência do Cade para decisão acerca do
cumprimento dos termos do acordo e sobre a incompatibilidade da arbitragem e da atividade administrativa) não seriam
aplicáveisaoutrosobjetosdedecisãosujeitosaotribunalarbitralquenãoavericaçãodocomportamentodiscriminatório
das compromissárias em prejuízo dos concorrentes. Faz-se necessária essa observação nesse ponto porque, a partir daqui, o
tribunal passa a deter amplo poder decisório.
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Emsendovericadoofracassodasnegociaçõesematé120diascomqualquerinteressado
na contratação da prestação de serviços CSD (BRASIL, 2017b),37 poderia o interessado acionar a
arbitragem (BRASIL, 2017b),38 a ser conduzida por tribunal arbitral composto por três árbitros, que
observaria, no que for aplicável, o procedimetno previsto no regimento do Centro de Arbitragem e
Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (BRASIL, 2017b).39
Nota-se que, pela primeira vez, também constou a previsão de arbitragem institucional, que,
diferente da arbitragem ad hoc,reportaaspartesaoregulamentodeumórgãoarbitral,“incorporando
tais regras à convenção arbitral” (BRASIL, 2017b).40
Além disso, restou expressamente determinado que a decisão do tribunal era irrecorrível
e vinculante para as empresas em concentração (BRASIL, 2017b).41 Contudo, no mesmo sentido do
que constou nos acordos em controle de concentração precedentes, o Cade permanece a ela não
vinculado (BRASIL, 2017b).42
Tendo em vista essas peculiariedades, alguns comentários fazem-se necessários.
Como o procedimento arbitral deve observar os termos do regulamento do Centro de Arbitragem
e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá, cabe a cada parte indicar um árbitro para compor
o tribunal, sendo que os indicados escolherão, em conjunto, o Presidente (BRASIL, 2017b).43
No entanto, os indicados devem integrar o quadro de árbitros da referida Câmara, o
que implica, necessariamente, a delegação da atividade decisória a particulares.44 Ainda que o
Regulamentodisponhadapossibilidadedequesejamnomeadosprossionaisnãointegrantesdo
CorpodeÁrbitros,casosemqueseexigeaaprovaçãodoprossionalpeloPresidentedaCâmara,45
normalmente se utilizam os árbitros que compõem a instituição.
Essa transferência do poder decisório aos árbitros, os quais, até então vinham exercendo
atividade consultiva no âmbito dos acordos em controle de concentração, é relevante no cenário
37 2.10. As Compromissárias se comprometem a empreender período de negociação de até 120 (cento e vinte) dias com
qualquer interessado na contratação da Prestação de Serviços CSD.
38 2.11. Em caso de fracasso nas negociações, a parte interessada poderá acionar o mecanismo de arbitragem previsto
nestacláusula,paransdesoluçãodecontrovérsias(“Arbitragem”).
39 2.12. A Arbitragem será conduzida por tribunal arbitral composto por 3 (três) árbitros (“Tribunal Arbitral”) e
será realizada na Cidade de São Paulo, Estado de São Paulo, observando, no que for aplicável, o procedimento previsto
no Regulamento do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CAM-CCBC). Nos termos do
mencionado Regulamento, cada parte indicará um árbitro para compor o Tribunal Arbitral, os quais indicarão, em conjunto,
umterceiroárbitroquegurarácomoPresidentedoTribunalArbitral.
40 2.10. As Compromissárias se comprometem a empreender período de negociação de até 120 (cento e vinte) dias com
qualquer interessado na contratação da Prestação de Serviços CSD.
41 2.15. A decisão do Tribunal Arbitral é irrecorrível e terá caráter vinculante para as Compromissárias, observado o
disposto na regulamentação aplicável.
42 2.17. O Cade não se vincula a qualquer deliberão arbitral para a formação de suas decisões, tampouco se obriga a
se manifestar ou a tomar qualquer providência em relação às decisões arbitrais proferidas.
43 2.12. A Arbitragem será conduzida por tribunal arbitral composto por 3 (três) árbitros (“Tribunal Arbitral”) e
será realizada na Cidade de São Paulo, Estado de São Paulo, observando, no que for aplicável, o procedimento previsto
no Regulamento do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CAM-CCBC). Nos termos do
mencionado Regulamento, cada parte indicará um árbitro para compor o Tribunal Arbitral, os quais indicarão, em conjunto,
umterceiroárbitroquegurarácomoPresidentedoTribunalArbitral.
44 5.1. Poderão ser nomeados árbitros os membros do Corpo de Árbitros e/ou outros indicados pelas partes,
observando sempre o disposto no artigo 4.4.1 deste Regulamento, o Código de Ética do CAM-CCBC, bem como os requisitos de
independência, imparcialidade e disponibilidade.
45 4.4.1. As partes poderão indicar livremente os árbitros que comporão o Tribunal Arbitral. Contudo, caso a indicação
sejadeprossionalquenãointegreoCorpode Árbitros,deveráelaseracompanhadadorespectivocurrículo,queserá
submetido à aprovação do Presidente do CAM-CCBC.
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que será apresentado no ponto seguinte, em que se propõe pensar o procedimento aqui chamado
de arbitragem como de competência do Cade em razão do poder de polícia concorrencial que lhe foi
atribuído, a ser exercido no escopo de um processo administrativo. Como consequência, sendo esse
o ponto de vista de que se parte, o poder decisório não poderia ser transferido a particulares.
Nos casos anteriores, tecemos comentários sobre a desnaturação da arbitragem como
jurisidição em razão da previsão de que a manifestação do árbitro teria caráter opinativo, servindo
de subsídio para que o Cade tomasse sua decisão acerca do descumprimento ou não do compromisso
assumido pelas compromissárias. A partir do caso Cetip/Bovespa, vê-se a expressa vinculação das
partes ao conteúdo da decisão arbitral, o que aproxima o procedimento previsto no ACC da arbitragem
propriamente dita.
Entretanto, à medida em que o procedimento contido nos acordos em controle de concentração
se assemelha à arbitragem regida pela Lei nº 9.307/96, torna-se mais questionável inseri-lo no
escopodeumacordoemcontroledeconcentração.Entendendoqueospoderesdescalizaçãoe
de decisão sobre o cumprimento dos ACC pelas compromissárias devem ser exercidos mediante
atividade administrativa da autarquia, o que aqui se denomina de arbitragem culmina na delegação
a particulares de poderes indelegáveis pelo Cade. Assim, ao aproximar a arbitragem do sentido que
lhe conferiu a Lei nº 9.307/96, o procedimento torna-se mais impróprio para integrar o âmbito do
monitoramentoedascalizaçãodosacordosemcontroledeconcentração.
6.6. Caso AT&T/Warner
Nesse caso, como obrigação assumida perante o Cade, a AT&T comprometeu-se a fazer com
que as programadoras de canais TW oferecessem, a todas as empacotadoras e prestadoras de TV
porassinaturanãoaliadas,oscanaisdeprogramaçãolicenciadospelasprogramadorasdecanais
TW à Sky Brasil, para distribuição por meio de seu serviço de TV por assinatura, mediante condições
não discriminatórias (BRASIL, 2017c),46 ao menos tão favoráveis quanto àquelas oferecidos pelas
programadoras de canais TW à Sky Brasil (BRASIL, 2017c).47
Ao mesmo tempo, no licenciamento de canais de programação para o empacotamento
e distribuição no serviço de TV por assinatura, a Sky Brasil comprometeu-se a não se recusar a
trasmitir,ouimportermosdiscriminatóriosparatransmitir,oscanaisdeprogramaçãonãoaliadasà
AT&T (BRASIL, 2017c).48
No que tange aos mecanismo de monitoramento, constou no ACC a possibilidade de que
qualquerprogramadoradecanaisouprestadoradeTVporassinaturanãoliadaàAT&TouàSky
poderia acionar a arbitragem para resolver conitos relacionados às condições comerciais de
46 3.4. A AT&T compromete-se a fazer com que as Programadoras de Canais TW ofereçam a todas Empacotadoras e
PrestadorasdeTVporAssinaturanão-AliadastodosCanaisdeProgramaçãolicenciadospelasProgramadorasdeCanaisTW
à Sky Brasil, para distribuição por meio de seu Serviço de TV por Assinatura, mediante condições não-discriminatórias. Esta
oferta deve observar as seguintes condições: [...].
47 3.4. a) Termos não-discriminarios devem ser entendidos como preços, termos e condições que, observados em
conjunto, são considerados ao menos tão favoráveis quanto aqueles oferecidos pelas Programadoras de Canais TW à Sky
Brasil.
48 3.7. No licenciamento de Canais de Programação para o empacotamento e distribuão no Serviço de TV por
Assinatura, a Sky Brasil não se recusará a transmitir, ou impor termos para transmitir (inclusive no tocante a preço, termos
ou outras condições), que possam ser considerados discriminarios em relação às provedoras de Canais de Programação
não-AliadasàAT&T,secomparadoscomaquelesaplicáveisàsProgramadorasdeCanaisTW.
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contratação (BRASIL, 2017c).49
Também aqui o Cade optou pela ampla subordinação temática da matéria ao tribunal arbitral,
podendoseracionadoomecanismopara“resolverconitosrelacionadosàscondiçõescomerciais
de contratação, na forma deste Acordo” (BRASIL, 2017c).
De forma semelhante ao procedimento no caso Cetip/Bovespa, a arbitragem seria conduzida
pelo Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (BRASIL, 2017c),50
devendo os árbitros emitir sentença baseada apenas em documentos (BRASIL, 2017c).51
Tanto quanto nos demais casos, previu-se que o Cade não se vincularia a qualquer deliberação
arbitral para a formação de suas decisões, tampouco estaria obrigado a se manifestar ou a tomar
providências em relação às decisões arbitrais (BRASIL, 2017c).52
Ajusticativaoferecidapelaautarquiaparaaescolhadoprocedimentoarbitralencontra-sena
pretensãodeseevitaroestabelecimentodeumparâmetroxodecontrataçãoentreaspartes,“em
caso de recusa das Compromissárias em negociar condições comerciais adequadas para os agentes
econômicos não integrados” (BRASIL, 2017c).
7. A PREVISÃO DE ARBITRAGEM NOS ACORDOS EM CONTROLE DE
CONCENTRAÇÃO: EXERCÍCIO DE PODER DECISÓRIO INDELEGÁVEL PELO
CADE NO ÂMBITO DE UM PROCESSO ADMINISTRATIVO
Até aqui se observou a maneira pela qual os acordos em controle de concentração estruturaram
o procedimento chamado de arbitragem (embora nem sempre esse fosse estabelecimento de
modoarespeitaroprevistonaLeinº9.307/96),visandoàscalizarocumprimentodasobrigações
assumidas pelas compromissárias perante o Cade. Também, notou-se a progressiva incorporação
das características da arbitragem regulamentada pela Lei nº 9.307/96 ao procedimento adotado nos
acordos.
Nos três primeiros casos que continham a previsão de arbitragem, a decisão dos árbitros
apresentava caráter apenas consultivo, sem que seu conteúdo vinculasse as partes. A partir do caso
Cetip-Bovespa, notou-se uma mudança na estruturação do procedimento, que teve seu objeto de
decisão alargado e que passou a ser vinculante às partes. Ademais, estabeleceu-se a arbitragem
institucional, cuja decisão era expressamente irrecorrível.
No entanto, persistiu, em todos os casos aqui referidos, a previsão de que a autarquia não
se vincularia a qualquer decisão daqueles nomeados para conduzir o procedimento arbitral (sejam
árbitros propriamente ditos ou experts, consultores, etc.), nem mesmo estando obrigada a tomar
49 6.1.QualquerprogramadoradeCanaisdeProgramaçãoouPrestadoradeTVporAssinaturaoaliadaàAT&T
ouàSKYpoderáacionaromecanismodearbitragempararesolverconitosrelacionadosàscondiçõescomerciaisde
contratão,naformadesteAcordo(“Arbitragem”).
50 6.6. Os árbitros emitirão sentença baseada apenas em documentos, estando as partes autorizadas a apresentar
qualquer documento/prova para embasar sua posição, mas não haverá audiências com especialistas e testemunhas. Após a
instituição da arbitragem, haverá duas manifestações de cada parte, sendo a primeira acompanhada de todos os documentos
e provas, com exceção de documentos e provas eventualmente acostadas à segunda manifestação, com o objetivo de refutar
os documentos e provas apresentados pela outra parte. O árbitro poderá autorizar a apresentação de outros documentos,
provas e manifestações em circunstâncias excepcionais, na extensão necessária à garantia do contraditório e ampla defesa.
51 Idem.
52 6.9. O Cade não se vincula a qualquer deliberação arbitral para a formação de suas decisões, tampouco se obriga a
se manifestar ou a tomar qualquer providência em relação às decisões arbitrais proferidas.
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providências em razão dos pronunciamentos emitidos por eles.
Como adiantado no item anterior, entende-se que, quanto mais a previsão da arbitragem
incorporar as características que a especicam como atividade jurisdicional, mais emerge a
inadequaçãodesecolocaraarbitragemenquantojurisidiçãocomomecanismodescalizaçãodos
cumprimento dos termos dos acordos em controle de concentração.
Para analisar corretamete a previsão de não vinculação do Cade ao conteúdo da decisão
arbitral, pretende-se apresentar alguns questionamentos acerca da viabilidade da utilização da
arbitragem da Lei nº 9.307/96 no monitoramento dos acordos.
7.1. A indelegabilidade do poder decisório pelo Cade
O acordo em controle de concentração insere-se no escopo de um caminho pró-consensual de
negociaçãoentreasempresasemconcentraçãoeoCade,desenvolvidocomanalidadedegarantir
maiorqualidade,ecáciaeefetividadedocontroledeconcentrações(MARRARA,2020,p.201).
Na condição de modalidade de acordo administrativo, o ACC displina relações entre a
administração pública e os particulares, visando ao desenvolvimento da atividade administrativa
mediante adoação de um regime de cooperação e coolaboração entre os envolvidos (OLIVEIRA, 2020,
p. 105). No mais, caracteriza-se por ser um provimento administrativo, cuja função é assegurar a
obtençãodeeciênciassucientesparaaaprovaçãodaoperação(BACHA,2017,p.436).
Observa-se que a Lei nº. 12.529/11, em seu art. 13, V, atribui competência à Superintendência-
Geralpara“instaurare instruir[...] processoadministrativoparaanálisede atodeconcentração
econômica”. Sendo a operação de concentração desenvolvida no bojo de um processo administrativo,
o acordo em controle de concentração é apensado a esse processo (art. 125, §1º, RICADE).53
Pormeiodoacordo,estabelecem-secondicionantesquedevemacompanharadecisãonaldo
Cade de autorizar a realização de uma operação de concentração econômica (MARRARA, 2020, p. 205).
O acordo, assim, integra a decisão de aprovação da operação, acoplando-se ao ato administrativo
naldoCade,sendo-lheharmônicoeretirandodeleasuavalidade(MARRARA,2020,p.202).
Sendo esse o cenário, parece claro que a toda a negociação entre Cade e empresas em
concentrão, atinente às condições e obrigões a serem implementadas no acordo, insere-se no
escopo de um processo administrativo, cuja dirão incumbe à autarquia federal responsável pela
defesa da concorrência.
Diante disso, a análise da celebração ou não do acordo – e de quais seriam os seus termos
– é de competência do Cade, no exercício de sua atividade administrativa, pois cabe à autarquia a
decisão acerca da aprovação da operação de concentração, a ser proferida no bojo de um processo
administrativoespecialmenteinstauradoparaessem(RIBEIRO;FELIPPE,2021,p.5).
Ascalizaçãodocumprimentodostermosdoacordoemcontroledeconcentração,quecompete
aoCade,especicamenteàSuperintendência-Geral(art.52,caput,Leinº.12.529/11)(MARRARA,2020,
p. 206), também é realizada por meio de processo administrativo, com fulcro nos poderes-deveres da
autarquia,osquaisdevemserexercidosematençãoaoatendimentodointeressepúblicojusticador
53 § 1º O ACC será autuado em apartado e apensado ao processo administrativo para análise de ato de concentração
econômica.
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da garantia da livre concorrência.
Nesse sentido, a Resolução nº 06/2013 do Cade previu que os autos dos processos adminis-
trativos serão encaminhados para a Procuradora Federal Especializada junto ao Cade para manifes-
tação sobre o cumprimento dos acordos adotados pelo Tribunal (art. 1º, caput). 54 Posteriormente
à emissão do parecer, os autos destinam-se à Superintendência Geral para manifestação (art. 2º),55
com subsequente remessa ao Tribunal, que decidirá sobre o cumprimento do acordo (art. 3º),56 com
fulcro na competência que lhe foi atribuída pelo art 9º, XIX, da Lei nº. 12.529/11.57
Deve-seteremmente,portanto,queasatribuiçõesrelacionadasaomonitoramentoeàscali-
zação do cumprimento das obrigações previstas nos acordos em controle de concentração desenvol-
vem-se em um processo administrativo no âmbito do Cade e enquadram-se no escopo do exercício
da atividade administrativa pela autarquia.
Como consequência, para averiguar a viabilidade da previsão da arbitragem da Lei nº. 9.307/96
como mecanismo de monitoramento dos termos do acordo, vale questionar o seu cabimento dentro
desse contexto.
Em primeiro lugar, destaca-se que, ao exercer o controle preventivo concreto, examinando os
efeitos das operões que geram concentração de mercado, a autarquia atua de forma a restringir a
liberdadeeconômicadosenvolvidos,baseando-se“nopoderdepolíciaconcorrencialconferidoao
Cade e que se materializa em atos administrativos de autorização total ou parcial, condicionada ou
incondicionada”(MARRARA,2020,p.199).Assim,tantoacelebraçãoquantoaposteriorscalização
do acordo em controle de concentração, porque restritivas da liberdade dos particulares mediante
açãopreventivaescalizadora(MELLO,1996,p.494),sãorealizadasnoexercíciodopoderdepolícia
que incumbe ao Cade.
Eessaconstataçãojáésucienteparaimpedirqueaatividadedecisóriaedecoerçãoseja
transferida a particulares (por exemplo à CAM-CCBC).
Isso porque as funções essenciais do Estado que envolvem certa margem de exercício de
poder decisório e o poder de coerção não podem ser realizadas por particulares (MARQUES NETO,
2000, p. 67), constituindo-se limites intransponíveis para a delegação da atividade de polícia pela
administração pública (KLEIN, 2014, p. 234). Em razão da existência de um poder-dever, inerente à
autoridadepública,paraconsecuçãodanalidadepública,aatividadededecisãoedecoerçãoé
irrenunciável (MARRARA, 2020, p. 70).
Ademais, conforme exposto por Justen Filho (2016), as atividades da autarquia são próprias
e inerentes ao Estado, pelo que não podem ser desempenhadas sob regime de direito privado. A
criação da autarquia deriva justamente de um processo de descentralização do poder estatal, que as
exercia por meio de seu aparato de organização (JUSTEN FILHO, 2016).
54 Art.1ºOsautosdosprocedimentosadministrativosprevistosnaLeinº12.529/2011,apósdecisãonaldoTribunal
Administrativo de Defesa Econômica, serão encaminhados para a Procuradoria Federal Especializada junto ao Cade, para
manifestação sobre o cumprimento das decisões, dos compromissos e dos acordos adotados pelo Tribunal.
55 Art. 2º Após a manifestação da Procuradoria, os autos serão encaminhados à Superintendência Geral, para a
manifestação prevista no artigo 52, § 2º, da Lei nº 12.529/2011, cuja motivação poderá consistir em declaração de concordância
com os fundamentos expostos em pronunciamento anterior, na forma do artigo 50, § 1º, da Lei nº 9.784/1999.
56 Art. 3º Após a manifestação da Superintendência Geral, os autos serão encaminhados ao Tribunal, que decidirá
sobre o cumprimento da decisão, compromisso ou acordo, nos termos do artigo 9º, XIX, da Lei nº 12.529/2011.
57 Art. 9º Compete ao Plenário do Tribunal, dentre outras atribuições previstas nesta Lei: XIX - decidir pelo cumprimento
das decisões, compromissos e acordos.
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Essas prerrogativas intransferíveis do Poder Público estão contidas em Lei, de forma que, como
“oexercíciodasatividadesinerentesàautoridadepúblicasóexisteporqueaLeioutorgouaoórgão
ou agente público a competência para efetivá-lo, não o seria por meio do contrato que ser-lhe-ia
retirada tal competência” (MARQUES NETO, 2000, p. 70).
Observa-seque,noquetangeespecicamenteàsatividadesdoCade,aLeinº.12.529/11ex-
pressamenteatribuiàSuperintendência-Geralacompetênciaparascalizarosacordosrmadosno
âmbito da autarquia (art. 52). Ainda, o art. 9º, XIX, da Lei nº. 12.529/11 atribui ao plenário do Tribunal
competência para decidir sobre o cumprimento dos acordos celebrados com a autarquia (BRASIL,
2011).
Em atenção a esse reserva legal, nota-se que o acordo em controle de concentração não pode
dispor em sentido contrário ao previsto na Lei, permitindo com que a câmara arbitral decida sobre
qualquer aspecto atinente às condições impostas pela autarquia para aprovação da operão, exer-
cendo irregularmente competência que não pode ser a ela transferida.
Asdecisãossobre“aPrestaçãodeServiçosCSDemcondiçõesjustas,transparentesenão-
discriminatórias”(BRASIL,2017b)esobreas“condiçõescomerciaisdecontratação”(BRASIL,2017c),
objeto dos casos Cetip/Bovespa e AT&T/Warner respectivamente, porque inseridas no escopo do
monitoramento do cumprimento dos termos do acordo, somente cabem ao Cade. Ou seja, dentro de
seupoderdescalização,édaautarquiaacompetênciaparadecisão.
E esse poder decisório, como visto, deve ser exercido somente pela autarquia, impedida sua
transferência a particulares.
Nemmesmosepensarmosemtermosdecompetênciadescalizaçãodaexecuçãocontratual
haveria autorização para a delegação do poder decisório aos particulares. Ainda que se entenda
que a atuação do Cade dentro dos termos do contrato, por atingir somente o particular que mantém
vínculo contratual com o Estado, não versaria sobre poder de polícia (MARQUES NETO, 2000, p. 79), a
competência decisória, prevista em Lei, não poderia ser transferida pela via contratual.
Assim, seja qual for o ponto de partida para a análise da competência decisória do Cade
(poderde polícia ouscalizaçãodaexecuçãocontratual), deve-seconcluirpela impossibilidade
de transferir a particulares a atribuição de decidir pela ocorrência ou não de descumprimento de
obrigações assumidas no acordo.
Além disso, poderia ser acrescentada à discussão a questão acerca das consequências da
vericaçãodedescumprimento,pelo“juízoarbitral,deumadascondiçõesassumidaspelasempresas
em concentrão.
Uma vez concedida a autorização da operação, essa torna-se vinculante para a autoridade
antitruste,deformaquesomentepodehaverarevogaçãodaautorizaçãoseforvericadaumadas
hipóteses mencionadas no art. 91 da Lei nº. 12.529/11 (FORGIONI, 2016, p. 441),58 entre as quais se
encontra o descumprimento de quaisquer das obrigões assumidas.
A Lei também prevê a competência exclusiva do Tribunal, de ofício ou mediante provocação
da Superintendência-Geral, para a revisão da aprovação, o que impede a delegação para particulares
58 Art. 91. A aprovação de que trata o art. 88 desta Lei poderá ser revista pelo Tribunal, de ofício ou mediante provocação
da Superintendência-Geral, se a decisão for baseada em informações falsas ou enganosas prestadas pelo interessado, se
ocorrer o descumprimento de quaisquer das obrigações assumidas ou não forem alcançados os benefícios visados (BRASIL,
2011).
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(art. 91, caput).
Portanto, aprovada a operação, ainda que com restrições, essa passa a produzir os seus efeitos.
Com a constatação do inadimplemento dos compromissos previstos no acordo pelas empresas em
concentrão, abre-se espaço para discussão, pela autarquia, de eventual revogação da aprovação
antes concedida, para além de outras consequências que podem ser previstas nos respectivos
acordos em controle de concentração.59
Como a revogação de ato administrativo é medida privativa da própria administração, veda-
se à solução arbitral a emissão de pronunciamento com essa determinação, tendo em vista que a
revogação não pode ser objeto de decisão jurisdicional (NOHARA, 2020, p. 230).
Mais do que isso, tomada a decisão pelo Cade relativamente à aprovação da decisão com o
estabelecimentodecondicionantese/ou àvericaçãodeeventualdescumprimentode umadas
condições assumidas pelas compromissárias no caso concreto, o seguir do procedimento exigiria
apenas o cumprimento do pronunciamento da autarquia. Portanto, não seria possível submeter
aquilo que já fora decidido pelo Cade a outro juízo decisório – o arbitral, no caso –, sob pena de
retiraraforçanormativadasdecisõesdaautarquia,subtraindoaquiloqueforaobjetoda“fasede
conhecimento” (como se a execução que lhe segue se assemelhasse à execução no processo civil) e
dedesvirtuarasorientaçõesjádenidaspeloCade,asquaisaosparticularescabeapenasexecutar.
Posterior submissão ao juízo arbitral poderia, também, fazer com que o Cade, com o tempo,
tendessearelegaraoárbitroouaotribunalarbitralaspectosrelativosàscalizaçãodosacordosem
controle de concentração, o que, sem dúvidas, representaria uma delegão – ainda que indireta –
do poder de polícia que pertence unicamente à autarquia, além de reduzir o grau de vinculação dos
particulares às decisões do Cade.
Afora a atividade decisória e o poder de coerção, outras atribuições acessórias a elas,
preparatórias, instrumentrais, incrementais ou de suporte, podem ser realizadas por particulares
(MARQUES NETO, 2000, p. 70).
Klein (2014, p. 208) menciona que, em princípio, a atribuição a entidades privadas de atividades
preparatórias de decisão administrativa dependeria de expressa autorização legal. Contudo, pode ser
interessante a colaboração da administração pública com entidades privadas para o desenvolvimento
deatribuiçõesespecícas,comoaelaboraçãodeparecereselaudostécnicos,oquenãoseriavedado,
considerando-se inclusive que a administração pode não dispor de condições materiais e técnicas
sucientesparaodesempenhodiretodessasatividades(KLEIN,2014,p.209).
Nesse sentido, o §1º do art. 52 da Lei nº. 12.529/11 prevê que, na fase de scalização do
cumprimento dos compromissos, a Superintendência pode se valer de todos os poderes instrutórios
que lhe são assegurados na Lei.60
Ao mesmo tempo, o § 7º do art. 125 do Regimento Interno do Cade dispõe que a autarquia
59 Ex.: no caso ACL/Bromisa, o Cade se reservou ao direito de rever a aprovação da operação diante do descumprimento
da obrigação de não adotar condutas discriminatórias pelas compromissárias (cláusula 3.2); ao mesmo tempo, na hipótese
de recusa ou atraso no fornecimento das informações ao Cade, as compromissárias sujeitam-se à multa diária (cláusula
3.3). Também, no caso Ceitp/Bovespa, no ACC constou previsão de multa diária para o descumprimento dos compromissos
assumidos (cláusula 6.1).
60 §1ºNafasedescalizaçãodaexecuçãodasdecisõesdoTribunal,bemcomodocumprimentodecompromissose
acordosrmadosnostermosdestaLei,poderáaSuperintendência-Geralvaler-sedetodosospoderesinstrutóriosquelhe
são assegurados nesta Lei (BRASIL, 2011).
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
Concorrência, Brasília, v. 10, n. 2, p. 137-162, 2022.
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poderá, a seu juízo de conveniência e oportunidade, determinar que atividades relacionadas ao
cumprimento do ACC sejam realizadas por emprestas de consultoria ou de auditoria, ou outra
instituição independente, às expensas das compromissárias.61
Sendo esse o cenário, entende-se que seria possível a utilização da arbitragem” (não
vinculante) nos moldes estruturados nos casos ICL/Bromisa, ALL/Rumo e Tam/Iberia/British Airways,
em que a função do particular restringia-se à formação de opinião técnica sobre a questão a ele
submetida, para embasar a posterior decisão ser tomada pelo Cade. Aqui, por óbvio, a participação
de particulares seria anterior à tomada de decisão pela autarquia acerca do cumprimento ou não
dos termos do acordo – e não representaria novo juízo decisório quanto ao adimplemento dos
compromissos assumidos pelos particulares.
Isso porque a emissão de parecer consultivo acerca do cumprimento dos termos do acordo
enquadra-se como atividade relacionada ao cumprimento do ACC. Também, a Superintendência
poderia livremente exercer essa atribuição, dado tratar-se do exercício do poder instrutório – e não
decisório.
Outrajusticativaencontra-senadiculdadedeoCaderealizarinteiramenteasatividades
destinadas ao monitoramento do cumprimento dos acordos. Como já apontado, a necessidade de
participaçãodosparticularesnascalizaçãodasempresasemconcentraçãodecorre,entreoutros
fatores, da reduzida estrutura da autoridade concorrencial em comparação à complexidade dos
mercados sobre os quais incide o monitoramento (VERÍSSIMO, 2017, p. 334).
Portanto, na condição de atribuição acessória e preparatória da decisão sobre o cumprimento
ou não da condicionante imposta – a qual pertence unicamente ao Cade –, a formulação de parecer
ouarealizaçãodeanálisepréviaparaomdeaferiroadimplementodaobrigaçãopelasempresasem
concentrão pode perfeitamente ser realizada por particulares, sem que isso implique a abdicação
do poder conferido pela sociedade à administração pública (MARQUES NETO, 2000, p. 76).
Foi por essa razão que alegamos que, quanto mais a previsão de arbitragem nos acordos
em controle de concentração se aproximava da arbitragem prevista na Lei nº. 9.307/96 – porque
vinculante às partes, irrecorível e institucional –, mais se demonstrava inadequada a utilização desse
procedimento no contexto dos ACC.
A decisão acerca do cumprimento dos termos do acordo é de competência indelegável do
Cade, a ser proferida no âmbito de um processo administrativo, instituído no exercício da atividade
administrativaessencialdoCadeelegalmenteatribuídaàautarquia.Essaéalógicaquejustica
defenderquea“arbitragem”dosprimeirosACC–aquilidacomoaatribuiçãoaoparticulardatarefa
de eleborar parecer consultivo de apoio à decisão do Cade – é a única estrutura possível de ser
inserida como instrumento de monitoramento do cumprimento dos acordos.
Diante de todo o exposto, a autarquia estaria obrigatoriamente vinculada à decisão que
constata o cumprimento ou o descumprimento de uma das condições impostas no ACC, pois é a
única com competência para proferi-la.
7.2. A incompatibilidade entre a arbitragem da Lei nº. 9.307/96 e a atividade
administrativa
61 § 7º O Cade, a seu juízo de conveniência e oportunidade, poderá determinar que atividades relacionadas ao
cumprimento do ACC sejam realizadas por empresas de consultoria ou de auditoria, ou outra instituição independente, às
expensas da(s) compromissária(s) (BRASIL, 2021).
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
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Do ponto de vista do procedimento, observa-se que existem diferenças inconciliáveis entre
aarbitragemcomojurisdiçãoeaatividadeadministrativaexercidanascalizaçãodocumprimento
dos acordos em controle de concentração.
A arbitragem prevista na Lei nº. 9.307/96 possui como fundamento a autonomia da vontade,
impondo que as partes elejam de forma consensual a arbitragem como método de resolução da
controvérsia (AMARAL, 2014, p. 122).62Éessalivremanifestaçãodevontadequeteráoefeitode
afastar a possibilidade de a disputa ser resolvida pelo Poder Judiciário” (AMARAL, 2014, p. 122).
Comoconsequência,“nafaltadedisposiçõesquearmemexpressamenteestasrestriçõesde
acesso ao Judiciário [...] não poderá o intérprete, ainda mais em contraposição com a Constituição
Federal, presumi-las (art. 5º, XXXV, CF)” (ARAGÃO, 2004, p. 130). No mais, essa autonomia também se
reetenapossibilidadedeescolhadeleiaplicável,deidioma,deprazos,etc(ARAGÃO,2004,p.130).
No caso do procedimento previsto nos acordos em controle de concentração, as partes não se
submetemvoluntariamenteaométododeresoluçãodeconitos.Oconcorrenteentranteque,por
exemplo, pretende obter decisão acerca de se a contratação de prestação de serviço de transporte
ferroviário ocorreu de forma discriminatória, no caso ALL/Rumo, tem como meio para tanto a
arbitragem, decorrente da imposição extraída de uma relação negociada que não o incluiu.
Não só, nos casos Cetip/Bovespa e AT&T/Warner, o Cade e as compromissárias chegaram
a acordo inclusive sobre a câmara arbitral cujo regulamento seria aplicável ao procedimento, de
forma que do terceiro, particular, que pretende buscar esclarecimento ou solução para o tratamento
discriminatório que o atingiu, foi retirada a possibilidade de decisão acerca de aspectos essenciais
do procedimento arbitral.
Por outro lado, a arbitragem como jurisdição destina-se a resolver conitos no lugar dos
litigantes, aplicando-os a solução prevista no sistema jurídico (WAMBIER; TALAMINI, 2016a), ao passo
emqueoCade,aodecidirpelocumprimentoounãodoacordo,buscaespecialmente“protegere
ampliar a concorrência e o atendimento aos princípios do serviço público” (ARAGÃO, 2004, p. 132).
Nessesentido,ésignicativaadistinçãoentreoacordoemcontroledeconcentração,noâmbito
doCade,eoprocedimentoarbitralpararesoluçãodeconitoentreosparticulares.Odesenvolvimento
de tratativas entre o Cade e os concorrentes ocorre no bojo de um processo administrativo, o qual
“nãotemporescopoúnicoenalatuarconcretamenteoordenamentojurídico,massimdesenvolver
outras atividades de consecução do interesse da coletividade” (WAMBIER; TALAMINI, 2016b).
No caso dos acordos em controle de concentração, o processo administrativo origina-se de
inciativas das empresas que buscam a aprovação da operação de concentração da qual participa
(FORGIONI, 2016, p. 157). Por meio dele, objetiva-se estabelecer condições para que o ato de
concentrãosejaaprovado,medianteautilizaçãode“cláusulasquevisemaeliminarosefeitos
62 Embora grande parte da doutrina mencionada nesse subponto verse sobre a atuação das agências reguladoras,
reconhece-se a distinção do Cade, na condição de autarquia, dessas instituições. Como primeiro ponto, menciona-se que o
Cade protege o direito de livre iniciativa e de livre concorrência de forma geral, a compreender todos os mercados econômicos,
aopassoemqueagênciareguladorapodeter,entresuasatribuições,atuteladodireitodaconcorrênciadeformaespecíca,
emalgunsmercados,cujascaracterísticasenvolvemumperlestruturalrefratárioàlivreconcorrênciaeque,porisso,exige
a construção de leis voltadas à regulação econômica setorial (conforme Dutra (2002)). Ademais, o Cade estrutura-se como
autarquia e as agências reguladoras como autarquias especiais, dotadas de maior autonomia em relação às não especiais.
Apesar disso, acredita-se na relevância das referências mencionadas ao caso, porque ambas são pessoas jurídicas de direito
público,integrantesdaadministraçãoindireta,oquelhesatribuiumasériededeveressemelhantes,ajusticaraaproximação
realizada.
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ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
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nocivosàordemeconômica”(FORGIONI,2016,p.442).Isso,comomdeatenderaointeressepúblico
(FORGIONI, 2016, p. 442) na proteção da ordem econômica e da concorrência entre os agentes de
mercado.
Deformadiversa,aarbitragem,porqualicar-secomojurisdição(CARMONA,1990,p.37),63
detémcomonalidadeprecípuaatuarconcretamenteoordenamentojurídico.
Ademais, não há – e nem poderia existir, dada a ausência de voluntariedade do terceiro na
escolha do procedimento arbitral – a obrigatoriedade de o prejudicado buscar o reconhecimento
daocorrênciadetratamentodiscriminatórionaarbitragem.Dessaforma,oterceiro“naturalmente,
poderá simplesmente deixar de acionar a Administração Pública e dirigir-se diretamente ao
Poder Judiciário, já que em dispositivo algum o processo arbitral administrativo é colocado como
obrigatório” (ARAGÃO, 2004, p. 130).
Vale destacar que também não há indicação na regulamentação formulada nos acordos em
controle de concentração da intenção de que a decisão arbitral – nos casos em que se coloca como
vinculanteparaaspartes–sejadenitiva.Anal,oCadenãosevincula,mesmonahipótesede
arbitragem de natureza jurisdicional, aos termos do pronunciamento arbitral.
Os ACC dos casos Cetip/Bovespa e AT&T/Warner mantém a competência do Cade para declarar
o inadimplemento total do acordo em controle de concentração (BRASIL, 2017b) e para rever os
termos do acordo (BRASIL, 2017c), em razão do descumprimento dos compromissos assumidos pelas
empresas em concentração. Ou seja, a despeito de qual seja pronunciamento do tribunal arbitral,
apalavranalsobreodescumprimentodoacordoapontodesuscitarsuarevisãoouareprovação
da operação é da autarquia. Não só, como as decisões da autoridade antitruste estão amplamente
sujeitas ao controle judicial (FORGIONI, 2016, p. 163), pode sempre haver posterior manifestação do
Poder Judiciário sobre eventuais violações aos termos do acordo.
Sendoassim,nãoháindicaçãodequese“queiraqueesta“arbitragem”administrativa,atípica,
tenhacaráterdedenitividadefrenteaoPoderJudiciário,emoutraspalavras,queequipareoseu
regimeaodaLeideArbitragem,semqueaspartessequertivessemrmadoumcompromissoarbitral
prévio” (ARAGÃO, 2004, p. 130).
AssignicativasdiferençasexpostasentreaabitragemregulamentadapelaLeinº.9.307/96e
sua homônima, prevista nos acordos em controle de concentração, culminam na conclusão de que
o método de reforço de monitoramento do Cade trata-se, em verdade, de exercício de atividade
administrativa exclusiva da autarquia.
Como consequência, não é adequada a previsão de arbitragem cuja decisão seja vinculante
entre as partes, irrecorrível e oriunda da aplicação do regulamento de determinada câmara arbitral
privada.
Veja-se que, com tudo isso, não se quer dizer que não seria possível a intituição de arbitragem
em razão do conteúdo da decisão a ser tomada pelo tribunal arbitral, no sentido de que o direito
antitruste, enquanto matéria de ordem pública, afastaria a possibilidade de susubção da controvérsia
à arbitragem (ARAGÃO, 2010, p. 81). Primeiro, porque as normas de ordem pública podem ser objeto
de julgamento pelo tribunal arbitral, que somente não está autorizado a violá-las ou contrariá-las
63 Wambier e Talamini (2016b) explicam que a arbitragem pode ser entendida como jurisdição se esse vocábulo for
utilizadoparadescreverafunçãodesolucionarconitosmedianteaintervençãodeumterceiroimparcial.Noentanto,caso
jurisdição seja conceituada como expressão da soberania estatal, a arbitragem escapa a esse conceito.
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
Concorrência, Brasília, v. 10, n. 2, p. 137-162, 2022.
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(ARAGÃO, 2010, p. 81). Segundo, porque o que se pretende questionar é a própria natureza jurídica
do poder de decisão dentro do monitoramento do acordo em controle de concentração. Sendo
atividade administrativa, e apresentando a jurisdição atribuições com ela incompatíveis, afasta-se a
possibilidade de instituição da arbitragem submetida aos ditames da Lei nº 9.307/96.
8. CONCLUSÕES
Como se pretendeu demonstrar, a decisão do litígio entre as empresas em concentração e os
concorrentes supostamente atingidos por práticas anticoncorrenciais, porque compreende a análise
do cumprimento ou não do acordo em controle de concentração, insere-se no escopo do poder
de polícia concorrencial do Cade, que deve exerce-lo no iter da atividade administrativa que lhe é
própria.
Na qualidade de autarquia, o Cade exerce atividades típicas do Estado, que lhe foram
atribuídas num processo de descentralização das funções estatais. Como consequência, o poder
decisório inserido no âmbito dos acordos em controle de concentração não pode ser transferido a
particulares, pois é insucetível de ser exercido sob o regime de direito privado.
No mais, falta ao procedimento arbitral estipulado pelo Cade em conjunto com as empresas
em concentrão a voluntariedade característica da arbitragem da Lei nº 9.307/96, tendo em vista
que o concorrente atingido por práticas discriminatórias não participa da escolha da arbitragem
comomecanismodereforçoaomonitoramento,bemcomocaalheioàsdecisõesarespeitodas
caracterísicas incorporadas ao procedimento arbitral.
Ao mesmo tempo, o exercício da atividade administrativa pela autarquia não visa apenas
a aplicação do direito ao caso concreto – como o faz a jurisdição –, para resolver a questão do
cumprimento ou nao dos termos do acordo pelos compromissários, cabendo também ao Cade
proteger a ordem econômica e garantir a concorrência entre os agentes de mercado.
Também, a adoção, pelo particular, da arbitragem como método de resolução não é
obrigatória, porque não voluntária, bem como o procedimento previsto nos acordos não possui
característicadedenitividade,jáquenãovinculaaautarquiaaostermosdesuadecisão.
Todas essas diferenças em relação à arbitragem como jurisdição contribuem – tanto quanto
a impossibilidade de transferência do poder decisório para particulares – para a conclusão de que
é incabível a arbitragem da Lei nº 9.307/96 como método de reforço ao monitoramento dos acordos
em controle de concentração.
Entretanto,dadaacomplexidadequeenvolveascalizaçãodaimplementaçãodosremédios
comportamentais, é possível que sejam transferidas a terceiros, particulares, atividades acessórias
à tomada de decisão quanto ao cumprimento dos termos do acordo, como a elaboração de parecer
ou estudo prévio objetivando embasar a decisão da autarquia acerca da prática de condutas
descriminatórias por parte das empresas em concentrão.
Justamente em razão disso, o procedimento estruturado nos casos ICL/Bromisa, ALL/Rumo
e Tam/Iberia/British Airways, no qual à manifestação do particular foi atribuído caráter consultivo,
preparatório da decisão do Cade, pode ser adotado como forma de reforço ao monitoramento da
autarquia. Por outro lado, a arbitragem de natureza jurisdicional, prevista nos acordos dos casos
Cetip/Bovespa e AT&T/Warner não é cabível no âmbito do exercício da função administrativa pelo
Cade.
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
Concorrência, Brasília, v. 10, n. 2, p. 137-162, 2022.
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COMO CITAR ESTE ARTIGO:
FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço ao
monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da Concorrência,
Brasília, v. 10, n. 2, p. 137-162, 2022.
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FUCKNER, Mariana. A arbitragem no controle de estruturas como mecanismo de reforço
ao monitoramento do Cade: cabimento e vinculação da autarquia. Revista de Defesa da
Concorrência, Brasília, v. 10, n. 2, p. 137-162, 2022.
https://doi.org/10.5286/rdc.v10i2.999