Direito, economia e linguagem: hermenêutica, direito administrativo sancionador e o “impasse” em torno da aplicação do conceito de “vantagem auferida”

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Diogo Thomson de Andrade
Paulo Henrique de Oliveira

Resumo

Contexto: o presente artigo está inserido na interseção entre o direito constitucional e o direito administrativo sancionador, especificamente voltado para a aplicação de sanções pelo Cade em casos de condutas anticompetitivas. Ele se fundamenta na hermenêutica filosófica e jurídica de Hans-Georg Gadamer e na teoria dos sistemas de Niklas Luhmann para examinar como interpretações jurídicas podem afetar a objetividade na aplicação de penalidades administrativas.


Objetivo: analisar a interpretação constitucional das normas relacionadas ao poder punitivo do Estado, com ênfase nas sanções administrativas aplicadas pelo Cade e, particularmente, na aplicação do conceito de 'vantagem auferida'. O artigo visa identificar como diferentes interpretações dessas normas podem resultar em decisões punitivas heterodoxas e, além disso, propor soluções para o impasse na dosimetria e aplicação de penalidades pecuniárias a pessoas jurídicas. Para atingir esses objetivos, o artigo foca em aspectos específicos da hermenêutica, como a análise de conceitos jurídicos indeterminados e a interação entre as esferas do direito e da economia na aplicação das normas sancionadoras. A pesquisa também inclui uma análise crítica da objetividade e segurança jurídica na dosimetria das sanções, com foco na metodologia aplicada pelo Cade.


Método: para este fim, utiliza-se uma abordagem teórico-interpretativa, com base na hermenêutica filosófica de Gadamer e na teoria dos sistemas de Luhmann. Ele aplica essas teorias para investigar a prática sancionadora do Cade e suas implicações constitucionais.


Conclusões: propomos uma abordagem hermenêutica jurídica que vê o direito como um sistema autopoiético, onde a Constituição atua como elo estrutural. Isso oferece uma forma equilibrada de abordar questões no direito concorrencial, especialmente diante do "impasse" na jurisprudência do Cade sobre multas. A interpretação sugerida busca conciliar a função dissuasória das penalidades com o respeito aos princípios constitucionais, evitando tanto o formalismo rígido quanto a abertura excessiva. Embora melhorias legislativas possam objetivar o cálculo das multas, o artigo enfatiza que o sistema atual já permite avanços em uma jurisprudência mais coesa, transparente e respeitosa dos direitos fundamentais.

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Detalhes do artigo

Seção
Revista de Defesa da Concorrência
Biografia do Autor

Diogo Thomson de Andrade, Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) – Brasília/DF, Brasil

Possui graduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2003). Mestre em Filosofia do Direito pela PUC/SP (2009). Doutorando em Direito pelo Instituto Brasiliense de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa IDP. É Procurador Federal (membro da Advocacia-Geral da União), desde 2004. Ocupa o cargo de Conselheiro no Tribunal do Cade desde dezembro/2023. Foi Superintendente-Adjunto do Cade (2012-2023) e Superintendente-Geral Interino (julho/2021 a abril/2022 e julho a outubro/2017). Anteriormente, ocupou o cargo de Diretor do Departamento de Proteção e Defesa Econômica (DPDE) na extinta Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça (2011-2012) e de Procurador Federal, chefe do Setor de Estudos e Pareceres (consultivo) da Procuradoria Federal Especializada do Cade (2007-2010).

Paulo Henrique de Oliveira, Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) – Brasília/DF, Brasil

Economista pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Mestre em Política e Economia do Setor Público (Administração Pública e Governo) pela FGV-EAESP e Doutorando pela mesma instituição. Pesquisador colaborador do Centro de Direito e Democracia do CEBRAP (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento) e Chefe de Gabinete do Conselheiro Diogo Thomson de Andrade no Cade.

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