A autolavagem como crime diretamente relacionado ao cartel: interpretação do art. 87 da Lei 12.529/11
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Resumo
Objetivo: o presente artigo analisa a possibilidade de enquadramento da lavagem de dinheiro no rol de crimes estabelecido no art. 87 da Lei nº 12.529/11, para fins de aplicação dos benefícios penais concedidos na celebração de Acordos de Leniência com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Método: a pesquisa adota uma abordagem qualitativa, de vertente jurídico-dogmática. O raciocínio científico aplicado foi o dedutivo. Para a interpretação da expressão “crimes diretamente relacionados à prática de cartel”, disposta no referido artigo 87, foi utilizado o método dogmático de interpretação das leis penais. Como parâmetros interpretativos, são indicados três aspectos do delito de lavagem de dinheiro: (i) a autolavagem; (ii) o bem jurídico protegido e (iii) o seu momento consumativo.
Conclusões: a principal conclusão é a de que os fatos de um caso concreto, percebidos como lavagem de dinheiro, se atenderem aos critérios interpretativos propostos, podem ser considerados como crime diretamente relacionado à prática de cartel, para fins de obtenção dos benefícios penais elencados no art. 87 da Lei nº 12.529/11, notadamente se for constatada a autolavagem. Além disso, é possível observar a tutela da ordem econômica como um fator de aproximação dos ilícitos de cartel e lavagem de dinheiro. Por fim, o momento consumativo também se assemelha nas duas condutas, de modo que a permanência do cartel, acrescida da permanência da lavagem de dinheiro, demonstra a possibilidade de estarem os dois ilícitos, não apenas diretamente relacionados num momento específico, mas também num tempo contínuo, sustentado pela produção de provas comuns aos dois ilícitos.
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